O mundo falhou este mês, pela segunda vez, um acordo para combater a poluição por plásticos. As delegações de 176 países presentes na conferência das Nações Unidas, em Genebra, não conseguiram um consenso sobre como atuar na fonte do problema, que é reduzir a própria produção de plástico e, em particular, dos produtos de uso único. Com o falhanço do Tratado Global sobre os Plásticos também se perdeu um consenso sobre a eliminação gradual de 4 mil substâncias químicas nocivas, proposta pela Comissão Europeia. Em Portugal, a reciclagem está muito longe dos objetivos.Isto acontece ao mesmo tempo que o consumo de plásticos continua a aumentar, prevendo-se mesmo que os resíduos mal geridos aumentem 47% e que as fugas de plástico para o ambiente aumentem 50% até 2040, ou seja, já nos próximos 15 anos. Qual é o problema? São vários e afetam tanto os oceanos como a atmosfera, com isso contribuindo para o aquecimento global e para degradação da saúde humana. Porquê? Cerca de 85% do lixo marinho proveniente de fontes terrestres é plástico, o que representa um risco para a vida marinha e para a saúde humana através da cadeia alimentar. Por outro lado, para além da poluição ambiental, o próprio processo de fabrico do plástico contribui de forma decisiva para as alterações climáticas. As estatísticas dizem-nos que na União Europeia, por exemplo, as emissões anuais relacionadas com a produção de plástico totalizam cerca de 13,4 milhões de toneladas de CO2.Nos últimos anos, registou-se, só no espaço comunitário, um aumento de 9% na libertação não intencional de microplásticos no ambiente, segundo dados da Plastics Europe. Se tentarmos projetar os impactos ambientais a nível global, o cenário é desolador, pois são produzidos todos os anos qualquer coisa como 460 milhões de toneladas de plástico.A reciclagem de plásticos é um caso de insucesso, uma espécie de parente pobre das políticas ambientais a nível global, na UE e também em Portugal. Cerca de 81% dos produtos de plástico acabam como resíduos em menos de um ano, e destes apenas 9% são reciclados, 20% são incinerados, mais de 20% são abandonados na natureza e quase metade acaba em aterros sanitários, que são focos de poluição ambiental.Portugal atrasado na reciclagemEm Portugal, os números da reciclagem teimam em continuar abaixo das metas fixadas. Sobre o ano de 2024, a Sociedade Ponto Verde revelou que apesar de ter aumentado 4 %, face ao período homólogo, está ainda longe dos objetivos. Foram encaminhadas para reciclagem um total de 476 605 toneladas de embalagens (não só plásticos), com a taxa de retoma a situar-se nos 58,8%. Este ano, “o país terá de garantir a recolha seletiva de 65% das embalagens colocadas no mercado, para atingir as novas metas”, pelo que a Sociedade Ponto Verde apela a que se acelere nesta frente. No último ano, recolheram-se 158 146 toneladas de papel/cartão e 85 548 toneladas de plástico. O vidro aumentou 1 %, isto é, 213 870 toneladas depositadas no vidrão. O Sistema Integrado de Gestão de Resíduos de Embalagens (SIGRE) será reforçado com um investimento do Governo e passa a dispor de 235 milhões de euros para gerir os resíduos de embalagem neste ano.O DN tentou obter junto do Ministério do Ambiente e da Energia um ponto de situação atualizado sobre a produção, consumo e reciclagem de plásticos a nível nacional, mas não obteve resposta em tempo útil.A 30 de julho deste ano, uns dias antes da conferência das Nações Unidas, a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) publicou no seu site as medidas em curso para uma melhor gestão dos plásticos. E referiu que, “no caso das embalagens de bebidas em plástico não reutilizáveis, está a ser desenvolvido em Portugal um sistema de depósito e retorno dessas embalagens, bem como de embalagens de bebidas de vidro e de metal não reutilizáveis”. Também indica medidas aprovadas no âmbito da Administração Pública para “promover a utilização mais sustentável de recursos e a adoção de soluções circulares e a redução do consumo de produtos de plástico”. Foram definidas “boas práticas para o uso sustentável do plástico, nomeadamente a proibição de procedimentos de contratação pública que impliquem a aquisição ou a utilização de produtos de plástico de utilização única ou descartável”.A APA indica que Portugal transpôs em 2022 a diretiva da UE 2019/904 definindo os regimes de responsabilidade alargada do produtor de determinados produtos de plástico de utilização única e em 2021 já havia transposto outra sobre a redução do impacto de determinados produtos de plástico no ambiente, e que altera as regras relativas aos produtos de plástico nos pontos de venda de pão, frutas e legumes. Também proíbe o uso de louça de plástico de utilização única nas atividades do setor de restauração e/ou bebidas e no comércio a retalho, entre outras medidas.São contributos para reduzuir o consumo, mas o problema é que na UE cerca de três quartos do plástico são utilizados principalmente para fins não relacionados com embalagens, incluindo a construção, o mobiliário, os têxteis e a eletrónica de consumo. Na UE, o consumo médio anual de plástico é de cerca de 150 kg por pessoa, mais do dobro da média mundial de 60 kg.A utilização de plástico na Europa deverá atingir 101,2 milhões de toneladas até 2040, de acordo com a Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económicos (OCDE).Uma das razões pelas quais o acordo falhou deveu-se à forte oposição por parte de um grupo de nações produtoras de petróleo, incluindo a Rússia, a Arábia Saudita e o Irão. Estes preferem que as discussões não se centrem na redução da produção de plástico, mas sim na melhoria da gestão dos resíduos e no aumento dos esforços de reciclagem. Em causa estavam ainda para o acordo, o estabelecimento de diretrizes universais para a conceção de produtos de plástico e a garantia de financiamento para estas iniciativas.O exemplo das ilhas croatasA UE vai continuar a insitir num acordo mais forte e vinculativo. Enquanto isso algumas cidades europeias dão o exemplo e avançam para limitar o uso do plástico. Paris, Barcelona, Berlim, Roterdão e Aarhus, participam no Projeto ReuSe Vanguard coordenado pela Zero Waste Europe que visa normalizar a reutilização na venda de alimentos e bebidas para fora. Em Aarhus (Dinamarca), o projeto parceiro "Rotake Reusable" instalou 30 "Máquinas de Venda Inversa" na cidade. Os clientes depositam os copos reutilizáveis nas máquinas em troca da caução de 5 coroas dinamarquesas (0,43 €). O resultado: mais de 500 mil copos recolhidos em menos de oito meses, com uma taxa de retorno de 85 %.Na Croácia, as suas ilhas procuradas pelas suas águas azul-turquesa, estão a ficar ameaçadas pelo efeito do turismo de massas e pela poluição por plásticos e tomaram medidas. A ilha de Zlarin, no arquipélago da Dalmácia, os residentes, os comerciantes e as associações locais criaram em 2018 uma carta coletiva para a eliminação do plástico de uso único. Os restaurantes e lojas substituíram o plástico por embalagens de papel, madeira ou reutilizáveis. Também a ilha de Krk, conhecida como a "Ilha Dourada" desde a antiguidade, tornou-se a primeira ilha da Croácia a receber o prestigiado selo Zero Resíduos da rede Zero Waste Europe (ZWE). É também a segunda ilha do mundo a obter a certificação, após a ilha de Tilos, na Grécia.Os sete municípios de Krk obtiveram resultados encorajadores, segundo os auditores do selo: 58 % de recolha seletiva de resíduos, menos 22 % de resíduos domésticos per capita do que a média nacional. Dubrovnik também faz parte deste programa, juntamente com outras cidades europeias como Nice e Veneza.