O orçamento do sector da Defesa Nacional pode ser muito maior do que se diz. De acordo com a análise do Conselho das Finanças Públicas (CFP) à proposta de Orçamento do Estado para 2026 (OE 2026), à primeira vista "a despesa com defesa deverá aumentar apenas 546 milhões de euros em 2026, passando de 3.332 milhões de euros (1,1% do PIB - Produto Interno Bruto) em 2025 para 3.878 milhões de euros (1,2% do PIB)".Seria pouco ou curto para, por exemplo, cumprir as novas metas de gastos no acordo assinado com a NATO.No entanto, o CFP diz no estudo divulgado esta quinta-feira que o novo OE 2026 tem uma reserva de 1,2 mil milhões de euros numa conta de "ativos financeiros" que pode vir a ser transformada em despesa efetiva, em mais salários, compras de bens e serviços, investimentos, etc.Se assim for, e se toda a verba for vertida em mais despesa, o pequeno excedente orçamental que o Ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, projeta para o ano que vem (0,1% do PIB) pode ser totalmente eclipsado, passando a um défice de 0,3%.Aritmeticamente, essa alteração poderia fazer subir o rácio da despesa com defesa de 1,2% para 1,6%.Os gastos orçamentados, explica o Conselho presidido por Nazaré Costa Cabral, não chegam para que Portugal cumpra o acordo que assinou na última cimeira da NATO, em Haia (junho de 2025).Segundo o CFP, a despesa pública prevista na proposta de OE 2026 para o sector da defesa "aparenta estar aquém do compromisso assumido por Portugal no âmbito da cooperação europeia em matéria de segurança e defesa".O CFP explica ainda que "o conceito de despesas em defesa aceite pela NATO" e "não se cinge à área da Defesa", ele abrange também "despesas de outros programas orçamentais, tais como despesas com polícias e forças de segurança interna, escolas militares, hospitais militares e pensões militares"."Embora a apresentação do plano de investimento detalhado para a defesa pelo Governo esteja prevista para o final de novembro, seria expectável que a despesa nesta área assumisse uma expressão mais significativa na proposta de OE 2026, em linha com os compromissos internacionais assumidos", indica a entidade que avalia as políticas públicas.No entanto, o CFP nota que "o orçamento da Entidade do Tesouro e Finanças para 2026 inclui, no Capítulo 60 relativo a despesas excecionais, uma dotação de 1.200 milhões de euros na rubrica Outros ativos financeiros – Sociedades e quase sociedades não financeiras públicas (despesa não efetiva) destinada a financiar investimentos militares".Acontece que, "nos termos do n.º 9 do artigo 8.º da Proposta de Lei do OE 2026, o ministro das Finanças fica autorizado a proceder a alterações orçamentais de despesa efetiva e não efetiva do referido Capítulo 60 e a proceder a transferências neste âmbito entre os diferentes programas orçamentais, pelo que a utilização integral dessa verba no próximo ano em despesa efetiva implicará um impacto negativo adicional de 0,4% do PIB no saldo orçamental".Pacto de Estabilidade prevê exceçãoÀ luz das novas regras orçamentais europeia e do Pacto de Estabilidade, ficou decidido, a nível europeu, que a despesa com o reforço dos gastos militares que os países "precisam" de fazer – para se prepararem para esta nova era marcada por guerras e conflitos (designadamente a ameaça da Rússia à Europa e à NATO) – não conta para a avaliação dos governos.O CFP refere que, na despesa líquida portuguesa, um dos novos e principais critérios do Pacto (além do rácio da dívida), "apesar de a taxa de crescimento projetada em 2025 (6,4%) e 2026 (5,7%) estar acima do compromisso do Governo, dada a flexibilidade prevista na cláusula de derrogação nacional relativa ao aumento da despesa com investimento na defesa, os desvios acumulados na conta de controlo para 2025 (0,4% do PIB) e 2026 (0,5% do PIB) são próximos, mas inferiores, ao limiar máximo de 0,6% do PIB" imposto pela Comissão Europeia.Passar de 0,8% em 2023 para 5% em 2035Na Cimeira de Haia, de 25 de junho de 2025, ficou assente que cada um dos 32 países membros da NATO irá "alocar à defesa 5% do PIB até 2035, dos quais 3,5% do PIB em gastos estritamente militares (equipamento e treino) e 1,5% do PIB em investimentos de dupla utilização, civis e militares (cibersegurança, prontidão e resiliência estratégica)".Portugal é um dos mais atrasados nesta matéria, diz o CFP."A despesa das Administrações Públicas com defesa correspondeu a 0,9% do PIB, em média, no período 2015-2023, menos 0,4 p.p. do PIB face à média da União Europeia"."Em 2023, Portugal alocou apenas 0,8% do PIB à área da defesa, o quinto valor mais baixo no âmbito da UE", de acordo com dados do Eurostat.Entretanto, o Governo português comprometeu-se em "antecipar para o ano de 2025 o objetivo da NATO de que a despesa em defesa atinja 2% do PIB, anteriormente previsto para 2029", refere o CFP."De acordo com declarações do primeiro-ministro no final da referida Cimeira, nos próximos quatro anos Portugal investirá acima dos 2% do PIB com uma evolução gradual ascendente, para que em 2029 esteja em posição de cumprir o objetivo final de 5% nos seis anos seguintes. O Governo português comprometeu-se a atingir pelo menos 3% do PIB até 2029."CFP tem muitas dúvidas sobre o novo OEDe resto, o CFP refere que a proposta de Orçamento como um todo levanta muitas dúvidas."A previsão orçamental subjacente à proposta de Orçamento do Estado (POE/2026) aponta para um excedente de 0,1% do PIB, o qual resulta da deterioração do défice da administração central parcialmente compensado pelo reforço do excedente dos Fundos da Segurança Social (FSS)".O CFP recorda que a proposta das Finanças "prevê uma nova deterioração do défice da Administração Central (AC) para 2,2% do PIB, o mais alto desde 2017, não considerando o período pandémico"."Esta deterioração é apenas parcialmente compensada pelo reforço do excedente previsto para o subsector da Segurança Social (FSS)", ou seja, "a crescente dependência do desempenho orçamental de excedentes expressivos no subsector da Segurança Social torna-o mais exposto às contingências do ciclo económico".Assim, continua o Conselho, "a previsão de um saldo orçamental positivo em 2026 está em parte sustentada em receita temporária, que pode não se repetir nos anos seguintes, ao contrário da despesa que se mantém permanente"."No ano em que o impacto dos empréstimos ao abrigo do PRR será significativo (0,6% do PIB), o montante mais elevado desde o início do plano, acresce o efeito das novas medidas de política, orientadas sobretudo para a redução da receita e aumento da despesa, que deverão representar 0,1% do PIB. Para compensar estes impactos, a proposta de OE 2026 prevê um adicional de dividendos a receber e o encaixe financeiro a obter com a alienação de imóveis do parque público. Não considerando o efeito positivo resultante destas operações, o saldo orçamental seria negativo em 0,3% PIB", alerta a nova análise..Margem para novas medidas neste OE “é quase zero”, é preciso gastar PRR e Defesa pode exigir muito mais