A crise severa na habitação que grassa por quase toda a Europa e de forma mais aguda em países como Portugal (o país destaca-se em vários indicadores num novo diagnóstico de Bruxelas), tem sido e está a ser alimentada por um fenómeno de expressiva "sobreavaliação" ou "sobreaquecimento" nos preços das casas.Este problema afasta quem quer comprar ou arrendar (via poder de compra cada vez mais reduzido), pela oferta reduzida e carestia no investimento em construção, mas também porque existe uma proporção "significativa" de casas disponíveis tem vindo a ser capturada (comprada) por fundos de pensões e de ativos financeiros que, com o seu grande poder de fogo financeiro, contribuem para secar ainda mais o mercado português pelo lado da procura, alerta a Comissão Europeia (CE) num estudo que acompanha o "Plano Europeu de Habitação a Preços Acessíveis", revelado esta terça-feira.Segundo o novo diagnóstico apresentado pela CE, no Parlamento Europeu, em Estrasburgo, "os fundos de pensões detêm participações significativas em imóveis residenciais na Suécia, Alemanha, Portugal e Países Baixos, principalmente em áreas metropolitanas e turísticas de elevada concentração".Esta propriedade "corporativa" até pode significar que há "gestão profissional de imóveis, mas pode enfraquecer a ligação entre os preços locais e os fundamentais" do mercado.Em contrapartida, "as seguradoras investem consideravelmente em imóveis residenciais em países como a Alemanha, França, Holanda e Bélgica", explica o documento de trabalho da Comissão Europeia.Num dos capítulos do estudo, a equipa de economistas da CE analisa mesmo as implicações que "financeirização, especulação, vistos dourados e programas de residência" estão a ter no empolamento do custo de acesso à habitação.De acordo com a CE, "parte do parque habitacional é detido por investidores institucionais, atraídos pela expectativa de retornos fiáveis". Têm rendibilidade elevada e quase garantida, observa."Os investidores institucionais, incluindo companhias de seguros, fundos de pensões, instituições de crédito, fundos do tipo private equity e empresas não financeiras, têm vindo a tornar-se cada vez mais ativos nos mercados imobiliários residenciais diretamente e através de fundos de investimento imobiliário cotados ou não"."Esta crescente participação, frequentemente designada por financeirização [da habitação], reflete o papel cada vez maior dos agentes do mercado financeiro no investimento imobiliário, procurando diversificação do portefólio e retornos potencialmente estáveis a longo prazo", sendo que de modo geral, estes investimentos “institucionais” no imobiliário residencial “triplicaram entre 2012 e 2020, com impactos na procura de habitação".Financeirização da habitação pode alimentar a crisePara Bruxelas, "a financeirização pode ter contribuído para o desvio dos preços e das rendas dos imóveis em relação aos fundamentos económicos. Impulsionados pela procura de rendimento num ambiente de baixas taxas de juro e beneficiando, ao mesmo tempo, de baixos custos de financiamento, os investidores institucionais aumentaram a sua presença nas principais cidades europeias na última década".Todas estas pressões "podem ter contribuído para o desvio da relação entre o preço dos imóveis e o rendimento em relação às tendências de longo prazo, enfraquecendo a ligação entre os mercados imobiliários de habitação locais e os fundamentos económicos e demográficos", consta a CE.Depois da reunião do colégio de comissários europeus, em Estrasburgo, a CE fez saber que Portugal tem o mercado de habitação mais "sobrevalorizado" ou "sobreaquecido" de toda a Europa, com os desvios nos preços praticados face aos fundamentos do mercado a superarem largamente os desajustamentos verificados noutros territórios (também sob alta pressão) como Suécia, Países Baixos, Áustria e Grécia, os casos de maior "stress" detetados pela Comissão.Este sobreaquecimento da habitação em Portugal é um fenómeno que se junta à fraca oferta em construção e explica bem o grave problema que o país (famílias, sobretudo as mais jovens e menos abonadas) enfrenta em termos de habitação acessível, considera Bruxelas."Os preços das casas permaneceram sobrevalorizados em vários países da União Europeia (UE) no segundo semestre de 2025", "estimamos que a sobrevalorização média seja mais substancial em Portugal, na ordem dos 25%, ultrapassando outros mercados imobiliários habitacionais sobreaquecidos, como Suécia, Áustria e Letónia".A Comissão Europeia avançou com o referido plano de urgência para a habitação a preços “acessíveis” e prometeu relaxar as regras dos auxílios estatais."Se não resolvermos isto, corremos o risco de deixar um vazio que as forças políticas extremistas vão tomar", avisou Dan Jørgensen, comissário para a habitação. Bruxelas diz que quer montar também uma bazuca anual de 150 mil milhões de euros em investimentos públicos e privados no sector para os próximos dez anos..Portugal tem o mercado de habitação mais "sobreaquecido" da Europa, pior que o sueco ou austríaco.Comissão Europeia avança com plano de urgência para a habitação e promete relaxar regras dos auxílios estatais