Há perto de cem produtoras de betão, responsáveis por 230 centros de produção espalhados pelo país.
Há perto de cem produtoras de betão, responsáveis por 230 centros de produção espalhados pelo país.

Casas em Portugal correm risco sísmico por falta de fiscalização

Associação do setor alerta para falhas no controlo da resistência do betão nas construções de moradias e prédios habitacionais. Qualidade e segurança estão em causa.
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A resistência do betão utilizado na construção de habitação em Portugal não está a ser fiscalizada como obriga a lei. “É praticamente inexistente”, denuncia Jorge Reis, diretor-geral da  Associação Portuguesa das Empresas de Betão Pronto (APEB). “Portugal não é um bom exemplo no que diz respeito à fiscalização das obras no setor da construção, sobretudo nas obras privadas”, diz. Esta falta de controlo expõe os portugueses a possíveis calamidades de magnitude semelhante ao que sucedeu há um ano na Turquia e na Síria. As regiões da Área Metropolitana de Lisboa, Algarve e Açores são as que têm maior risco sísmico, mas há outras zonas do país que também estão expostas aos abalos terrestres.

Para evitar tragédias, a qualidade do betão incorporado na edificação de casas deveria ser controlada pelas autarquias e os produtores deste material pela Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE). Isso mesmo ficou determinado no Decreto-Lei 90/2021. Como esclarece Jorge Reis, “esta fiscalização, que deveria incidir sobre a verificação da certificação dos produtores de betão e sobre a verificação da resistência do betão para avaliar se a mesma está de acordo com o especificado pelo projetista, praticamente não é efetuada por ninguém, em completo descumprimento” da lei. Na sua leitura, esse incumprimento dever-se-á a “desconhecimento, incapacidade ou falta de meios”.

A ASAE tem pautado a sua ação na verificação documental da certificação dos produtores de betão, mas dada a exigência do diploma ainda não está a controlar a qualidade do produto, adiantou fonte deste organismo. Para assegurar que o fabrico deste material cumpre com a devida composição, a ASAE está a trabalhar em conjunto com o Laboratório Nacional de Engenharia Civil e o IAPMEI, reconhecendo a necessidade de conhecimentos especializados a nível técnico para “aplicar a lei na sua plenitude”. O DN/Dinheiro Vivo também contactou o Ministério da Coesão Territorial, que tem a tutela das autarquias, para obter esclarecimentos sobre a atuação das câmaras nesta matéria, mas até ao fecho desta edição não obteve resposta.

Segundo o decreto-lei, as câmaras municipais têm que verificar se o construtor realizou os ensaios em laboratórios acreditados à robustez do betão aplicado na obra, conforme estipulado pelo projetista. São esses testes que permitem conhecer a resistência do edifício a um eventual terramoto. Como sublinha Jorge Reis, “a não verificação da resistência do betão aplicado nas construções privadas pode estar a comprometer a capacidade dessas construções resistirem a um sismo que venha a ocorrer, pois sabemos que tal sucederá, só não sabemos quando e com que intensidade”.

Dez anos a crescer

Jorge Reis reconhece que há produtores de betão “idóneos, que estão certificados e cumprem com os procedimentos”. No entanto, a falta de controlo põe “na mão dos produtores de betão e das construtoras o cumprimento ou não da lei”, abrindo as portas à concorrência desleal. Até porque a qualidade do betão, que tem na sua composição cimento, areias, britas adjuvantes e água, tem um preço. O responsável considera a fiscalização essencial para evitar distorções no mercado e dar segurança ao consumidor final. Como sublinha, “não existem construções sustentáveis se não forem executadas com qualidade; e não existem construções de qualidade se não se controlarem e verificarem os seus componentes”. Regra geral, o betão é o elemento base das estruturas em Portugal.

O volume de vendas de betão pronto em Portugal atingiu, em 2022, 6,6 milhões de metros cúbicos, sendo que a APEB estima que no ano passado esse valor tenha aumentado cerca de 5%, para 7 milhões de metros cúbicos, para utilização em obras públicas e privadas. Segundo Jorge Reis, este indicador “tem crescido de forma sustentada desde 2013”. No ano passado, a faturação do setor terá ascendido a 650 milhões de euros.

No país, existem perto de cem produtoras de betão, responsáveis por 230 centros de produção espalhados pelo território nacional, que dão emprego a 2500 pessoas. Jorge Reis garante que o setor está preparado para responder à carteira de obras públicas lançadas e por lançar, como a ferrovia do Alentejo, as obras no porto de Sines, dos metropolitanos de Lisboa e do Porto, dos hospitais de Évora e do Funchal, e também para o aumento da procura para o setor da habitação. “O setor está sólido e bem preparado para responder às necessidades de betão pronto de todas estas obras, até porque já foram consumidos, anualmente, em Portugal, mais de dez milhões de metros cúbicos”, entre 2002 e 2008.

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