Famílias  enfrentam subida dos preços de bens essenciais acima dos aumentos salariais previstos.
Famílias enfrentam subida dos preços de bens essenciais acima dos aumentos salariais previstos.Vítor Rios / Global Imagens

Aumentos salariais em 2024 abaixo da subida do custo de vida

Trabalhadores pouco ou nada vão sentir na carteira as atualizações salariais previstas para este ano, de 4% em média. E no horizonte há incertezas quanto ao comportamento da inflação.
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Os trabalhadores do setor privado deverão contar este ano com um aumento salarial médio da ordem dos 4%, um incremento que ficará aquém da subida real do custo de vida e abaixo do referencial de 5% acordado entre o Governo e os parceiros sociais na Concertação Social. Logo no arranque de 2024, as famílias terão de enfrentar a subida de preço de um conjunto de bens essenciais acima da atualização salarial prevista pelos consultores do mercado laboral.

As rendas das casas sobem 6,9%, os tarifários das telecomunicações acompanham a inflação média anual registada em 2023, ou seja, aumentam 4,3%, as distribuidoras de eletricidade, água e gás preparam-se também para rever em alta os tarifários e o preço dos alimentos irá manter-se elevado. As taxas Euribor, relevantes para quem tem empréstimos bancários, só agora estão abaixo dos 4%. Em suma, o reforço dos rendimentos do trabalho dificilmente contemplará todos estas subidas no custo de vida.

“O impacto dos aumentos salariais não se sentirá no orçamento das famílias”, diz claramente Carlos Santos, diretor da Randstad. Os aumentos médios no setor privado ficarão apenas pelos 3,9%, influenciados “pela previsão inflacionista e de uma possível recessão”, estima este especialista. Nas atualizações salariais, os empregadores estão a ter em conta “fatores como a taxa de desemprego, estimando-se que se mantenha em níveis baixos”, e a “previsão de fracos resultados operacionais nas organizações”. Entre as aspirações dos trabalhadores e as obrigações dos gestores de assegurar a rentabilidade dos negócios, as empresas estão a optar por apertar o cinto.

Os empregadores estão confrontados “com a incerteza do contexto económico, que pode mesmo ser considerado adverso”, justifica Rui Teixeira, diretor-geral do ManpowerGroup Portugal. Os donos e gestores de empresas terão de balizar os aumentos salariais “com a subida nos custos das matérias-primas e das fontes de financiamento, que impactam a sua rentabilidade, limitando a sua margem de atuação ao nível das remunerações praticadas”, aponta.

O ano é desafiante e repleto de incertezas, quer para os patrões quer para os trabalhadores. Há a ter em conta as eleições nos Estados Unidos e a continuidade ou mesmo escalada dos conflitos na Ucrânia e no Médio Oriente, que poderão ter impacto nas cadeias de abastecimento e no custo da energia. São variáveis que poderão contrariar a atual tendência decrescente da inflação. Por isso, Rui Teixeira considera que será “difícil, mesmo nos grupos de maior dimensão, que os aumentos nos rendimentos consigam ser estendidos a todos de forma proporcional ao aumento do custo real de vida”.

“Os colaboradores sentirão um ligeiro aumento, mas não ajustado com a inflação e aumento do custo de vida”, por isso, “será seguro dizer que apesar de haver aumentos, estes não vão ser refletidos em melhores condições e, como tal, não vão ser sentidos”, vaticina também Bernardo Samuel, diretor de recrutamento na Adecco.

Este especialista prevê que a maior parte das empresas atualize o valor do subsídio de alimentação para o valor máximo não tributável de 9,60 euros e os vencimentos base registem uma subida média de 3 a 5%, devido ao aumento de 8% no salário mínimo nacional. Para o consultor, estas revisões terão por base o aumento da inflação, alguma instabilidade política nacional e internacional, e o contexto de guerras.

Ainda assim, há setores de atividade que se deverão distinguir no valor da atualização salarial em 2024 e que são também aqueles que mais carecem de talentos. Indústria de ponta, mobilidade elétrica, energias renováveis e eficiência energética, serviços financeiros inteligência artificial, data e machine learning são alguns exemplos. Já as empresas que necessitam de um maior controlo orçamental estão a apostar em benefícios como horários flexíveis, trabalho remoto, assistência médica, planos de pensão, formação e desenvolvimento profissional, subsídios para transporte, entre outros.

As previsões reveladas no último relatório Salary Budget Planning da consultora WTW vão no mesmo sentido. Os orçamentos para aumentos salariais médios globais em Portugal deverão aumentar 4% em 2024, taxa inferior em 0,2 pontos percentuais (pp) à observada em período homólogo anterior e 0,1 pp abaixo do que foi efetivamente praticado (4,1%), em 2023. Ou seja, no ano passado, a atualização salarial no privado já foi abaixo da subida do custo de vida.

sonia.s.pereira@dinheirovivo.pt

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