Álvaro Santos Pereira é o novo governador do Banco de Portugal.
Álvaro Santos Pereira é o novo governador do Banco de Portugal.Foto: Álvaro Isidoro

Alívio no IRS leva Banco de Portugal a rever em alta crescimento deste ano, mas efeito é "temporário"

Novo boletim económico do BdP diz que, este ano e próximo, impulso esperado das benesses fiscais no consumo é grande, mas terá "natureza temporária". Efeito irá esbater-se em 2026.
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As medidas de alívio fiscal do atual governo, que reduziram o IRS (as decididas no ano passado no Orçamento do Estado, mais o reforço votado em julho e com efeitos grandes nos salários e nas pensões em agosto e setembro) estão levar a aumentos substanciais do valor despendido pelas famílias em consumo privado, de tal forma, que o Banco de Portugal (BdP) acaba de rever em alta o crescimento previsto para este ano, de 1,6% (projeção do boletim económico de junho) para 1,9% em termos reais.

Para o próximo ano, o BdP manteve a projeção de junho e reafirma um crescimento da economia de 2,2%. Aqui o Conselho das Finanças Públicas (CFP), autor das previsão mais recente (em setembro), diz 1,8%.

Em todo o caso, o BdP refere que, este ano e no próximo, o impulso esperado destas benesses nos impostos vai ter uma "natureza temporária", ou seja, já não haverá este impulso tão marcado a nível do crescimento do consumo e da economia. Vai "alisar".

Seja como for, esse efeito do rendimento disponível que leva as pessoas a consumir mais foi o principal fator de impulso aos rendimentos de trabalhadores e pensionistas, mas houve também outro efeito positivo sobre o PIB, que é o decorrente de revisões nas séries das contas nacionais feitas pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) no consumo e investimento, explica o banco central no novo boletim económico divulgado esta terça-feira.

A seguir à previsão das Finanças (datada de abril, Relatório Anual de Progresso enviado à Comissão Europeia), na qual o ministro Joaquim Miranda Sarmento inscreveu um crescimento previsto de 2,4% para 2025, o BdP é agora uma das entidades, das que fazem previsões, mais otimistas, alinhando com o valor (1,9%) avançado em setembro pelo Conselho das Finanças Públicas (CFP) e, em junho, pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE), onde Álvaro Santos Pereira, o novo governador do BdP (tomou posse esta segunda-feira, 6 de outubro), era economista-chefe.

Como referido, a economia ganhou uma força muito significativa entre o final de 2024 e o início deste ano por via da redução do IRS, que beneficiou milhões de famílias.

A segunda vaga no alívio do imposto, fruto de uma proposta do Chega no Parlamento, aprovada em julho com o apoio do PSD-CDS, chegou agora em agosto e setembro aos bolsos das famílias, mas o BdP avisa que é uma medida temporária e que em 2026 o efeito desaparece.

Em todo o caso, o governo e o Parlamento ainda vão debater o novo Orçamento do Estado para 2026 (proposta será entregue esta sexta-feira), podendo sempre haver surpresas (boas para os contribuintes) no domínio do IRS.

Neste novo boletim, que excecionalmente não foi apresentado pelo governador por este não ter sido envolvido na elaboração que dura meses e não ter tido tempo para o validar, "a revisão da projeção do crescimento da atividade em 2025 reflete um contributo da procura interna 0,7 pontos percentuais (p.p.) mais forte do que o antecipado".

O sucesso temporário no consumo privado

"Do lado do consumo privado, a revisão em alta reflete o melhor desempenho do rendimento disponível, traduzindo um crescimento dos rendimentos do trabalho superior ao esperado e o efeito das novas medidas orçamentais", explica o Banco. "Refira-se que o impacto no consumo privado das medidas orçamentais introduzidas em 2024 induziu uma volatilidade no crescimento do PIB superior ao habitual no final de 2024 e início de 2025", projetando-se ainda "um perfil análogo na segunda metade de 2025 e no primeiro trimestre de 2026 em consequência das novas medidas anunciadas este ano, em parte de natureza temporária". A partir da primavera que vem, o efeito destas medidas do IRS dissipa-se na íntegra.

Em junho, o banco central previa que o consumo crescesse 2,2% este ano e 2% no próximo. Com o impulso fiscal referido, afinal irá crescer 3,3%, um dos ritmos mais elevados dos últimos anos. No entanto, em 2026, volta a normalizar: o BdP prevê agora um abrandamento para 2%, o mesmo que previa em junho.

Para mais, diz o BdP, "as famílias terão agora uma melhor perceção do seu impacto no perfil trimestral do rendimento disponível, o que se traduz num maior alisamento do consumo". Têm mais noção de que o alívio sentido no IRS não vai ser repetido da mesma forma, podendo nem repetir-se, pelo que começam a agir com mais prudência: gastam mais, mas menos do que no período precedente, é esta a ideia.

Investimento e exportações

No investimento, também houve revisões em alta substanciais. Em vez de crescer 2,1% (previsão de junho), deve avançar afinal 3%. "Na formação bruta de capital fixo (FBCF), a revisão em alta está associada às componentes pública e residencial. O mercado de habitação não parece estar a ser negativamente afetado pelo atual enquadramento de incerteza". Além disto, há o efeito da execução dos fundos europeus do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), pacote que tem de ser usado até ao início do ano que vem.

Contrastando com este panorama – em que as medidas do IRS sentidas final do ano passado e este ano foram mais fortes conduzido a um consumo privado mais dinâmico do que se previa, mais o impulso do investimento – o andamento das exportações está a fraquejar sobretudo por causa do ambiente de maior hostilidade dos EUA, do agravamento das tarifas impostas à maior parte dos países do resto do mundo e a inúmeros setores. Os preços das exportações portuguesas com destino aos Estados Unidos ficaram mais caros; as quantidades também se ressentem.

"A evidência sugere que a imposição destes direitos [tarifas], a par de outras alterações ocorridas desde a eleição da nova administração norte-americana, se refletiu numa redução das exportações portuguesas para os EUA" e "a evolução da procura externa dirigida a Portugal, com um peso dominante da União Europeia (UE), também reflete a moderação das trocas internacionais no curto prazo", explica o Banco.

Em junho, previa-se que as exportações portuguesas aumentassem 1,7% este ano e 2,6% no próximo; agora, não vão além de 1,1% e 2,2%, respetivamente, indica o BdP.

Fonte: Banco de Portugal

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