Deco. A vida de empresário, o "espetacular" João Félix e o "sem preço" Ronaldo
Nascido em São Bernardo do Campo (SP), Anderson Luís de Souza, mais conhecido por Deco, espalhou magia pelos relvados durante quase duas décadas. Jogou no FC Porto, Barcelona, Chelsea e Fluminense, entre outros. Agora negoceia jogadores, que tal como ele procuram vencer.
"Acho que levei uns dois anos para perceber o que queria fazer no pós-carreira, porque além do talento tem de se ter capacidade. Quando eu parei de jogar uma das coisas que eu tinha claro é que não tinha muita vontade de treinar, ser treinador. Tenho uma vida familiar complexa, com muitos filhos e queria algo que me deixasse tempo livre e não me levasse o dia todo. Sempre gostei da parte da gestão da carreira do jogador e sempre vi isso como uma possibilidade. Podia ter seguido a gestão de clubes, mas fui ficando a ajudar o Jorge Mendes (empresário)...", contou ao DN, à margem do Soccerex, evento que reúne o futebol mundial em Oeiras até esta sexta-feira e onde ele foi orador em dois painéis.
Hoje divide-se entre Portugal, Espanha e Brasil, sabe "exatamente o que quer fazer" e é "feliz" a negociar jogadores. Os negócios têm um segredo, na opinião dele, "o respeito entre as partes". Tem como missão defender os interesses do seu jogador, mas sem "nunca perder a noção" de que também há o interesse dos clubes: "Nunca forçarei um clube a negociar um jogador", atirou, confessando que "é um trabalho difícil e desgastante". O mercado fechou na Europa a 2 de setembro, "foi o fim de três meses sem ir a casa praticamente".
Tem Jorge Mendes - um dos maiores empresário do mundo que representa Cristiano Ronaldo, João Félix e José Mourinho entre outros - como referência. "O Jorge mais do que uma referência é um amigo. Conheci-o seis meses depois de vir para Portugal, em 1997, emprestado pelo Benfica ao Alverca. Ensinou-me muito e é uma referência para mim no sentido em que se dedica muito aos jogadores. Se calhar é o maior agente do mundo, mas nem por isso deixa de se dedicar", elogiou Deco, que ainda hoje tem uma parceria com Mendes, que incluiu jogadores como Fabinho (Liverpool) e Miranda (Inter). Mas cada um segue o seu caminho: "Eu tenho a minha forma de pensar. O Jorge é um amigo, mas cada um tem o seu caminho e jeito de trabalhar e por isso fundei a D20 Sports."
Nesta semana, Deco negociou Raphinha do Sporting para o Rennes por 21 milhões de euros. "A transferência não surpreende pela qualidade do jogador, mas é natural que, noutras circunstâncias, o Sporting não o vendesse já, mas às vezes há situações que os clubes não podem controlar e têm de tomar decisões. Infelizmente o Sporting não está numa fase fácil para manter um jogador como o Raphinha", explicou o agente, que também é representante de Tiquinho Soares do FC Porto.
Para escolher jogadores é preciso mais do que ter olho. O principal fator de escolha "é a capacidade técnica", o chamado talento, mas o "fator humano" pesa muito. Depois é o mercado a ditar o interesse e valor. E no caso de João Félix o valor foi de 126 milhões de euros, a mais cara transferência deste verão: "É o mercado, as transferências ficaram malucas, hoje paga-se muito por aquilo que ainda não se viu ou se realizou, mas que pode vir a realizar-se. Os clubes tentam antecipar o sucesso para que depois o jogador não fique ainda mais caro, é um jogo do que vale e do que pode vir a valer."
Foi isso que aconteceu com o português do At. Madrid, segundo o empresário. "Os 126 milhões de euros pelo João Félix não me surpreenderam porque sei como está o mercado. Apesar da idade já é um jogador espetacular, acima da média, despertou o interesse de grandes clubes europeus e é normal o Atlético ter querido antecipar-se", defendeu, lembrando que "126 milhões por um jogador de Portugal chama a atenção do mercado" e pode haver mais jovens e clubes a beneficiar com isso no futuro.
No verão de 2004 o FC Porto vendeu o passe de Deco ao Barcelona por 15 milhões de euros (mais o passe de Ricardo Quaresma). No mercado de hoje isso é uma pechincha. "Não sei quanto valeria hoje, mas seria um jogador bastante procurado e valeria bem mais do que custei na altura (risos)", atirou o empresário que até gostava de descobrir o novo Deco: "Não sei se há." Até hoje o jogador que lhe encheu as medidas na sua posição foi Luka Modric, do Real Madrid, que em 2018 foi eleito o melhor jogador do mundo: "Foi o que mais se pareceu comigo na forma como assume o jogo."
Como empresário, se tivesse de colocar um preço a Cristiano Ronaldo ou Messi "teria dificuldades". "O Cristiano com menos uns anos não teria preço. A Juventus não contratou apenas um jogador, contratou um dos maiores jogadores da história, um jogador que vive o futebol de uma forma diferente dos outros, com uma dedicação e um profissionalismo sem igual. Está sem surpresa nomeado para melhor do mundo outra vez. Não é fácil alguém fazer o que ele e o Messi fizeram nos últimos anos", afirmou o ex-jogador do FC Porto, apontando Eden Hazard, Neymar e Mbappé como os craques que se podem intrometer numa luta que tem sido a dois.
E qual é o jogador mais valioso da atualidade? "Para mim os três nomeados ao prémio da FIFA são de facto os mais valiosos, o Cristiano, o Messi e o Virgil van Dijk, mas num futuro próximo diria o Mbappé", respondeu Deco.
O antigo internacional português falou ainda da seleção e considera que Portugal tem "uma fantástica geração" que vai retomar o caminho das vitórias na qualificação para o Euro 2020 já na Sérvia, neste sábado. "Portugal vai voltar ao seu normal, depois dos dois empates iniciais. Esta seleção tem o melhor jogador do mundo e uma geração fantástica. São já duas gerações de grande qualidade, mas está com muita qualidade e variedade de jogadores", disse o antigo médio.
Na opinião de Deco, depois da saída de nomes como Figo, Rui Costa e até dele próprio, Portugal soube preparar o futuro: "Temos uma geração de futuro e tudo para fazer um grande caminho."
Sobre as opções do selecionador Fernando Santos, que tem de conciliar na mesma equipa nomes como Cristiano Ronaldo, João Félix, Bernardo Silva e Bruno Fernandes, Deco sublinha que "qualquer treinador gostaria de ter esses problemas".