Cristiano Ronaldo é a mais recente joia do desporto da Arábia Saudita, país que em 2016 - ano em que Portugal se sagrou Campeão Europeu - colocou em marcha um plano de reestruturação da economia para se tornar menos dependente das receitas do petróleo. A esse projeto chamou Visão 2030..Desde então, os sauditas deram sinais gigantescos de querer abrir-se ao mundo à boleia do desporto e do futebol em particular, com o objetivo de derrubar o Qatar e o Dubai como centro de negócios e eventos desportivos à escala mundial. E sempre com dinheiro ilimitado na mão, que parece comprar tudo e quase todos para divertimento de um país com 35,3 milhões de habitantes..Longe vão os tempos em que Riade organizou um Mundial Sub-20 que ficou na história do futebol português pela conquista do primeiro troféu da chamada Geração de Ouro em 1989. Os tempos modernos traduzem-se num brutal investimento na Fórmula 1, no golfe ou no Rali Dakar, que decorre até dia 15, antes de um verdadeiro "assalto" ao futebol com ajuda de Cristiano Ronaldo e Lionel Messi..Antes do Mundial 2022, anunciaram Messi como embaixador do turismo da Arábia Saudita e viram o argentino sagrar-se Campeão Mundial no Qatar, antes de anunciarem a contratação de CR7 pelo Al-Nassr e logo com o maior contrato da história do futebol: 500 milhões de euros até junho de 2025. Numa autêntica jogada de mestre, a troco de muitos milhões, as duas mais influente figuras do futebol foram cativadas para a causa saudita..No verão de 2022, a polémica compra do Newcastle, da Premier League, por 353,5 milhões de euros mostrou que nem a maior liga de futebol do mundo e um dos países mais escrutinados (Inglaterra) conseguia dizer "Não" aos milhões sauditas. Por muito que as organizações de Direitos Humanos tenham protestado, o empresário britânico Mike Ashley vendeu o clube que agora está na luta pelo título..Antes de entrarem na Premier League, os sauditas seduziram italianos e espanhóis. Desde 2018, e com exceção de 2020 por causa da pandemia, que a Supertaça de Itália se joga em Riade. Foi lá que Cristiano Ronaldo levantou o troféu em janeiro de 2021 ao serviço da Juventus. No próximo dia 18, o Campeão AC Milan e o Inter, que venceu a Taça de Itália, lutam pelo troféu na capital saudita..Já a Supertaça de Espanha sofreu alterações no formato para ser mais vendável e rentável. Em vez de um jogo, passou a ter quatro equipas, que jogam em solo saudita a troco de 50 milhões de euros. De 11 a 15 de janeiro, Real Madrid, Barcelona, Betis e Valência lá estarão, em Riade, a lutar pelo troféu..No dia 5 de dezembro do ano passado - dia em que foi noticiado o acordo de CR7 com o Al Nassr - a Arábia Saudita soube que ganhou a organização da Taça das Nações Asiáticas 2027, depois de a Índia retirar a candidatura. Foi ainda escolhida para organizar os Jogos Asiáticos de 2029, em Trojena, onde vai nascer a cidade Neom, um projeto megalómano que vai surgir no meio do deserto como bandeira do tal projeto Visão 2030..Mas a ambição saudita não fica por aqui. Como disse o presidente do Al-Nassr na apresentação de CR7, o acordo assinado com o capitão da seleção não é só para jogar futebol e prometeu novidades para os próximos dias. Um dos objetivos é usar a sua mais recente joia para lançar a candidatura ao Mundial 2030 ou 2034 e a uns Jogos Olímpicos na próxima década..Extra-futebol, a aposta na Fórmula 1 foi pensada com antecedência. A petrolífera estatal patrocina a prova rainha do automobilismo de velocidade desde 2019 e conseguiu entrar no calendário em 2021. Os sauditas pagam 55 milhões de euros por ano para ter um Grande Prémio em Jeddah, pelo menos até 2024, ano em que terá honras de abertura do Campeonato do Mundo..A aposta em campos de golfe foi igualmente brutal e uma ameaça séria aos circuitos atuais (DP World Tour e PGA Tour), pelos valores envolvidos: 226 milhões de euros em prémios. Em junho o fundo estatal anunciou a criação do LIV Golf Invitational Series, que seduziu vários reputados jogadores, indiferentes às ameaças de sanções. Tiger Woods disse "Não" a 700 milhões de euros para participar, segundo Greg Norman, o antigo golfista e atual CEO da LIV Golf..Tudo isto com a bênção financeira do príncipe Mohamed bin Salman e do fundo soberano de 600 mil milhões de dólares (566 mil milhões de euros) daquela que é a economia do G20 que mais cresceu em 2022..E agora com Ronaldo como cabeça de cartaz. O português já disse querer mudar mentalidades e o futebol já provou ser capaz de exercer um papel diplomático à escala mundial. Mas que poder terá CR7 para mudar algo num país que continua a ser uma autocracia, onde ainda há pena de morte e onde as mulheres têm poucos direitos?.isaura.almeida@dn.pt