O mundo chora a morte de um dos maiores nomes do futebol português atual e da seleção nacional. Diogo José, um jogador que, das tantas vezes que vestiu a camisola com o nome Diogo J., viu a abreviatura virar apelido no futebol, passando a ser conhecido como Diogo J.(ota). Nascido em Massarelos, freguesia do distrito do Porto, a 4 de dezembro de 1996, morreu na madrugada de 3 de julho, vítima de um brutal acidente de viação, em Zamora, Espanha, que também vitimou o irmão André Silva, jogador do Penafiel. Tinha 28 anos. Havia acabado de se casar com “o amor da sua vida” e “fã número 1”, Rute Cardoso, com quem tinha três filhos (Dinis, Duarte e Mafalda). Tinha sonhos... que foram interrompidos por trágico acidente a caminho de Inglaterra para dar início a mais uma época no Liverpool, um dos clubes que chora a sua morte e lhe presta homenagens (ver fotos). O velório é esta sexta-feira à tarde e o funeral é no sábado, às 10h00, na Igreja Matriz de São Cosme, em Gondomar, a sua terra, a terra onde começou a jogar futebol.O pai, Joaquim Silva, e os tios haviam pisado os relvados pelo Sousense e Diogo Jota imitava-os no quintal da avó, que lamentou muitos vasos partidos e plantas destruídas com o pontapé-canhão do neto, que lhe haveria de dar muitas alegrias a jogar futebol, como contou o próprio ao The Athletic. “Quando tinha 6 anos, o meu pai inscreveu-me na natação. Eu perguntei-lhe, a chorar, se podia, em vez disso, jogar futebol, porque era ao mesmo tempo. Preferia muito mais jogar à bola do que estar na piscina.”O pai fez-lhe a vontade, afinal o rapaz só queria jogar à bola. Começou na escola de futebol Gondofute e tinha 8 anos quando chegou ao Gondomar Sport Club, que em 2020 homenageou o jogador que nunca esqueceu as origens, criando a Academia Diogo Jota, que desde então esgota as inscrições ano após ano. Esse é o legado que deixa. Num jogo dos juniores frente ao Candal, começou no banco, porque tinha jogado na véspera pelos juvenis e feito três golos... entrou no segundo tempo, mas ainda a tempo de fazer um novo hat-trick. O guarda-redes era o mesmo nos dois jogos e nem queria acreditar que em 24 horas tinha sofrido seis golos do indomável Diogo Jota.Nesta altura, já era seguido de perto por Benfica, FC Porto e até Sp. Braga, onde chegou a realizar alguns treinos à experiência, mas quis o destino que o caminho dele se cruzasse com o de Gilberto Andrade, antigo coordenador do Paços de Ferreira. “Soube logo que estava na presença de um diamante em bruto. Era um cavalo selvagem, um talento inato”, recordou ao DN, o homem que convenceu a direção do Paços de Ferreira a avançar para a sua contratação..Fotogaleria. Adeptos do Liverpool prestam homenagens a Diogo Jota em Anfield. “Felizmente” o Gondomar foi jogar a Paços de Ferreira, Diogo Jota voltou a fazer a diferença e Gilberto Andrade voltou a insistir na sua contratação: “Durante o jogo, o presidente do Paços de Ferreira conversou com o presidente do Gondomar e o negócio ficou logo alinhavado.”Foi na capital do móvel que o talento de Diogo Jota começou a ser lapidado, em 2013. Quando chegou, jogava como médio interior, mas, com o decorrer do tempo, Vasco Seabra, achou que ele podia render mais como ponta-de-lança e começou a utilizá-lo no ataque: “Ficou um bocado reticente, mas era muito humilde e focado, aceitou o desafio. No primeiro jogo fez logo dois golos. A partir daí nunca mais se importou de jogar na frente.” O sucesso foi evidente: 17 golos nos 14 encontros que se seguiram (tinha feito apenas cinco nos anteriores 22).Talento precoce para o goloA ascensão meteórica estava apenas a começar. Ainda não tinha atingido a maioridade quando Paulo Fonseca o lançou pela primeira vez na equipa principal do Paços de Ferreira (2014-2016). Uma estreia de sonho. Contribuiu com um golo para o triunfo (4-0) sobre o Atlético de Reguengos, na Taça de Portugal, a confirmar essa predisposição natural para quebrar recordes de precocidade.Na época a seguir fixou-se nos seniores, voltando a despertar a cobiça do Benfica. Mas foi o Atl. Madrid que acabou por o contratar e logo o emprestar ao FC Porto (2016/17), então treinado por Nuno Espírito Santo. Tinha 19 anos quando chegou ao Dragão. Estreou-se a titular pelos dragões com um hat-trick e deslumbrou de imediato os adeptos portistas, mas não ficou mais do que uma época.Nuno Espírito Santos convenceu-o a ir com ele para o Wolverhampton (2017-2020), para o segundo escalão inglês. Jota foi, mais uma vez emprestado pelos colchoneros, ajudando os Wolves a subir à Premier League enquanto mostrava o seu talento nos relvados ingleses ao selecionador nacional. .A estreia pela seleção deu-se em novembro de 2019, frente à Lituânia (6-0) e o primeiro golo surgiu em setembro 2020, diante da Croácia (4-1), num jogo em que fez de Cristiano Ronaldo, o seu ídolo de infância. Tinha 49 internacionalizações. Os últimos 14 minutos da carreira foram na Allianz Arena, em Munique, onde a seleção conquistou a Liga das Nações 2025, no dia 8 de junho..Em 2020, Diogo J. mudou-se para um dos grandes da Premier League, o Liverpool. Dono de “uma capacidade mental anormal”, era supercompetitivo e não bloqueava nos momentos decisivos. Pelos reds venceu uma Taça da Inglaterra (2022) e duas Taças da Liga inglesa (2022 e 2024), além de ter jogado, e perdido, a final da Liga dos Campeões em 2022.Tinha finalmente sido campeão inglês pelo Liverpool. Nos festejos, os adeptos mostraram o quanto adoravam a garra e o talento do português, que vestia a camisola 20 com um cântico. “Oh, ele veste o número 20; Ele vai levar-nos à vitória; E quando ele estiver a descer pela ponta esquerda; Vai cortar por dentro e marcar para o Liverpool; É um rapaz de Portugal; Melhor que o Figo, sabiam?, Ah, o nome dele é Diogo.”Viciado na PlayStation e campeão mundial eSportsO futebol era a sua grande paixão, mesmo que fosse jogado num computador. Diogo Jota tinha uma grande paixão pelos videojogos FIFA e Football Manager, chegando a liderar o ranking mundial em FIFA 21 e fundado uma equipa de e-Sports, a Luna Galaxy, que é hoje campeã mundial.Lutar pela PlayStation com o irmão era quase um passatempo. Numa das raras entrevista que deu, confessou: “Desde que o meu pai me deu a primeira PlayStation, sempre joguei futebol, foi como uma paixão (...). No mundo dos e-Sports, eu sinto que posso ter as três coisas ao mesmo tempo: a minha paixão pelo futebol, a competição de jogar contra outras pessoas e a gestão [tinha acabado a licenciatura em Gestão].”Quem se cruzou com ele diz que “não se deixava deslumbrar” e se mantinha fiel ao “miúdo espetacular” e humilde que repetia vezes sem fim o seu lema de vida. “Não é importante de onde vimos, mas sim para onde vamos.”isaura.almeida@dn.pt