Artem Nych sagrou-se vencedor da Volta a Portugal, defendendo o título que angariara em 2024. O russo, proveniente de Kemerovo, é aos 30 anos o principal vulto da modalidade em Portugal, onde está há três anos. Sem poder erguer a bandeira russa no pódio em Lisboa, valoriza a oportunidade que o nosso país e a Anicolor/Tien21 lhe deram para continuar a correr, independentemente das sanções aos atletas após a invasão da Ucrânia.Ganha pela segunda vez a Volta a Portugal. Qual destas vitórias tem mais sabor?Acho que a primeira. Foi mais inesperada, não pensava poder ganhar. Nesta, para mim, foi decisiva a subida a Montejunto. A partir daí, senti que poderia vencer. Acreditei mais, tinha uma boa vantagem para os rivais. Já tínhamos passado a etapa da Torre, que é, para mim, a mais difícil, é uma montanha muito longa, passei muito calor, mas corremos sempre bem.Vence a geral individual, mas não conquistou etapas. Faltou ganhar uma tirada?A Volta a Portugal é muito difícil. Quando estamos a tentar ganhar a corrida não controlamos tudo. Temos de ser regulares. Correu tudo bem, mesmo. Vencemos a geral, que era o mais importante. Na última etapa, ganhou o meu amigo Rafael Reis no contrarrelógio e fiquei muito contente por ele.Quando viu o percurso, com tanta montanha, achou que seria capaz de ganhar a Volta outra vez? Todos os anos temos muita montanha: No ano passado tivemos a chegada à Torre [onde perdeu 2m56s]. A chegada ao Observatório foi mais difícil do que este ano a subida a Montejunto. Quando vi o percurso percebi que era um percurso muito duro. Seria tão exigente como habitual e que tinha de ser muito forte todos os dias para vencer.Este ano, venceu o GP O JOGO, o Douro Internacional e a Volta a Portugal. Sente-se o corredor mais forte em Portugal?Não me sinto o melhor corredor em Portugal, sou a mesma pessoa que era antes. Tento treinar bem, analisar as corridas. Fisicamente sou forte, mas precisas de ter cabeça fria, precisas de não estar nervoso. E isso sei que consigo. Não tenho uma receita. Preciso de ter uma grande equipa, sei disso. Será o grande segredo destas vitórias. É mais fácil ganhar quando tens uma grande equipa.O seu colega, Alexis Guérin, foi segundo na Volta e tinha sido vencedor do Troféu de Torres Vedras e do GP das Beiras e Serra da Estrela. Esteve a menos de 30 segundos da camisola amarela a certo ponto. Temeu que pudesse ser ele a vencer a Volta?Nunca pensei muito nisso. Tínhamos uma estratégia, sentia-me bem e o importante era ganhar a equipa. Temos corredores fortes, corredores que correm há muitos anos juntos, mas também outros com experiência internacional, como o Harrison Wood, o Guérin ou o Rubén Fernández. Essa superioridade é fundamental.Tem contrato até 2026, já pensa em ganhar a terceira Volta a Portugal?Agora, penso em descansar [risos]. Talvez faça a Volta à Grã-Bretanha. Quanto à Volta, não sei o que vai ser amanhã, mas continuarei em Portugal, é verdade. Devo continuar a correr mais quatro ou cinco anos, não sei se todos em Portugal. O que quero dizer é que se puder ganhar, tudo bem, tentarei, se não puder, estou à vontade para trabalhar. Estou tranquilo na equipa, estou contente por estar aqui, seja qual for o papel que tenha. Não posso ganhar sempre tudo.A Volta a Portugal perdeu visibilidade internacional. Como surgiu a hipótese de vir para uma equipa portuguesa?Na Rússia, os ciclistas sabem sempre quem venceu a Volta a Portugal. Já tinha estado cá a correr e gostei, vi o público. Temos muito público na estrada. Não via todas as etapas quando estava na Gazprom-RusVelo, mas acompanhava a corrida. É uma corrida conhecida.Portugal acaba por surgir na sua vida numa altura em que os atletas russos eram alvos de sanções.Nunca pensei vir para Portugal, mas fiquei muito contente por vir. Falei por telefone com o Rúben Pereira [diretor Desportivo], não falámos muito, mas não foi preciso. Foi uma decisão fácil. A Rússia não pode ter equipas e isso prejudica, claro.Subiu duas vezes ao pódio sem a bandeira russa. Isso magoa?Gostava de poder subir com a minha bandeira, mas isso agora não é possível. Prefiro não pensar muito nisso. Mas é importante podermos correr, antes não sabíamos quando podíamos correr, se poderíamos competir. Não é a mesma coisa ganhar sem poder ter a bandeira, mas as coisas passam muito rápido.Portugal colocou-se ao lado da Ucrânia em termos de política internacional. Alguma vez sentiu represálias no nosso país?Prefiro não falar muito sobre este assunto. O que garanto é que me senti sempre bem tratado em Portugal. Não tenho nada contra alguém, tenho amigos em toda a Europa. Já falo um pouco a vossa língua, aprendi a falar com os ciclistas e quero melhorar isso também. Sinto-me bem em Portugal. .Artem Nych, o russo que fugiu da guerra com uma mochila às costas e ganhou a Volta a Portugal.Russo Artem Nych vence 86.ª edição da Volta a Portugal pela segunda vez consecutiva