Almodóvar é de ouro, finalmente!
Almodóvar é de ouro, finalmente!Alberto PIZZOLI / AFP

Veneza 81. O “milagre” de Almodóvar teve ouro

Palmarés certo que deu o Leão de Ouro a Pedro Almodóvar nesse sublime 'The Room Next Door'. Mas houve também o Leão de Prata justíssimo para 'The Brutalist', de Brady Corbet. Nos atores, Vincent Lindon e Nicole Kidman venceram bem, mesmo quando ficam de fora nomes como Daniel Craig, Fernanda Torres ou Angelina Jolie...
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Uma cerimónia aborrecida, com prémios a mais e discursos também previsíveis. Isabelle Huppert, com um vestido do futuro, saudou a qualidade dos filmes a concurso - “o cinema está de boa saúde!!”. Num júri composto sobretudo de realizadores, o ouro foi mesmo para um dos melhores da competição, The Room Next Door, de Pedro Almodóvar, cineasta espanhol que se estreia nas longas em inglês depois de experiências na curtas. Por incrível que pareça, trata-se da primeira vez que vence um grande festival. Prémio feliz para um filme do lado da morte, a história de uma jornalista a cometer eutanásia ao lado de uma amiga que a ajuda nos últimos dias. Uma sinfonia de cor, dor e cumplicidade feminina, só possível devido à simbiose transcendental de duas atrizes que compreenderam os tempos de Almodóvar.

The Room Next Door, que chega aos ecrãs portugueses no começo de dezembro, é realmente um dos filmes maiores de Almodóvar, recebido este sábado no tapete vermelho como uma autêntica estrela pop: “Pedro! Pedro! Pedro!” gritavam os fãs. Explica-se o fenómeno deste cineasta? A única pista é o seu cinema continuar em evolução franca, mesmo sem revoluções mas desta vez a querer experimentar uma simetria perfeita com a pintura de Hopper. No seu discurso em espanhol explicava que aconteceram milagres em certos planos e não esqueceu a vénia às milagrosas Tilda Swinton e Julianne Moore. E diz, frisando, que é um filme com espírito espanhol.

Maura Delpero e Corbet, prata da boa...

Num ano com uma mão cheia de filmes que tinham de ir ao palmarés, o júri teve escolhas sábias e ajuizadas. Destaca-se o gesto ousado de premiar a beleza de Vermiglio, de Maura Delpero, olhar para a Itália do final da guerra mundial através de uma família de Vermiglio, uma pequena aldeia das montanhas do norte. Uma câmara a filmar com tempo e ternura uma Itália rural que já parecia esquecida. Um Leão de Prata- Grande Prémio que parece um manguito para o outro cinema italiano à Netflix que aqui se viu.

Depois, claro, o outro favorito, The Brutalist, de Brady Corbet, igualmente premiado: venceu o Leão de Realização. O cineasta americano apareceu no palco do palácio visivelmente emocionado. O filme está já garantido em Portugal e, com esta distinção, é outro dos que sai reforçado do Lido com pujança para a corrida aos prémios da temporada americana…

Na cerimónia dos Leões, a maior surpresa ainda terá sido o Prémio do Júri a April, de Dea Kulumbegashvili, cineasta da Geórgia que fez um filme algo aquém do anterior, O Começo (2020). Daqueles casos que o tema do filme (o aborto na Geórgia rural) parece sobrepor-se à forma e conteúdo.

Os perdedores...

E não deixa de ser corajoso o júri ter tido coragem de não ir na moda de beatificado o chinês Wang Bing, autor de Youth - Homecoming, mais do mesmo daquilo que tínhamos visto em Cannes (é garantido que é penoso não estar lá aquele efeito de novidade), rejeitado o novo Joker, de Todd Philipps e não ter ido nas modas de Luca Guadagnino, neste caso com o nada consensual Queer.

Os atores

Melhor Atriz - Copa Volpi: Nicole Kidman

Não foi com surpresa que o prémio de interpretação foi parar a Nicole Kidman, no altamente erótico Babygirl, de Haline Reijn, a maior surpresa do festival. A atriz tem qualquer coisa de disrupção no seu transe sexual, algo que fazia lembrar a presidente do júri, Isabelle Huppert, em O Piano, de Haneke. Kidman não esteve na cerimónia devido à morte da mãe mas com esta distinção talvez consiga entrar na corrida dos prémios americanos. Ainda assim, custa ver Angelina Jolie em Maria ou Fernanda Torres em Ainda Estou Aqui ignoradas…

Melhor Ator - Copa Volpi: Vincent Lindon

Foi com beijos aos jurados que Vincent Lindon, inacreditável em Jouer Avec Le Feu, de Delphine e Muriel Coulin, agradeceu o prémio de melhor ator. Prémio importante para um ator que já venceu melhor ator em Cannes e que tem a França aos seus pés. Era um homem feliz, mesmo incomodado pelos tiques no seu rosto. O show deste pai de um filho da extrema-direita será visto em breve em Portugal - a Outsider Filmes ficou com os direitos deste drama bem recomendável.

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