É uma ópera em inglês, apresentada pela primeira vez em 1958, no Metropolitan Opera, em Nova Iorque, onde foi um sucesso. Samuel Barber, o compositor, ganhou um Prémio Pulitzer de Música com esta obra, cujo libreto foi escrito pelo seu companheiro, Gian Carlo Menotti. Na Europa estreou no Festival de Salzburgo nesse mesmo ano, mas a receção não foi a mesma, tendo sido considerada conservadora e sentimental, numa altura em que o vanguardismo florescia. Vanessa não é uma ópera muito encenada, e em Portugal será mesmo uma estreia. Esta produção da companhia independente Ópera do Castelo sobe ao palco amanhã, no Teatro São Luiz, em Lisboa. “Desde a sua estreia, esta ópera esteve sempre mergulhada numa aura de preconceito que tem a ver com o facto do Samuel Barber não ser um compositor vanguardista. E estamos na segunda metade do século XX em que imperam os compositores vanguardistas”, explica ao DN Catarina Molder, a soprano que faz de Vanessa nesta produção. A encenação é da alemã Daniela Kerck, e o maestro Diogo Costa dirige a Orquestra Filarmónica Portuguesa e o coro Operafest. . Catarina Molder já tinha feito uma ópera de um ato de Samuel Barber, A Hand of Bridge (de 1959), que não tem mais de dez minutos, em 2001, no Lux. E depois descobriu, enquanto deambulava por uma loja de livros e discos, que o compositor, muito conhecido pelo seu Adágio de Cordas, tinha uma ópera com três atos. “Afinal ele tem óperas de grande formato... E fui ouvir o CD para casa e fiquei logo apaixonada, porque a música é de cair para o lado de linda, é música de filme, parece que estamos num filme do Hitchcock.”Catarina Molder olha para Samuel Barber como o Puccini americano, “porque ele tem um grande sentido melódico, como os italianos tinham. E, de facto, ele é um grande melodista e esta ópera está cheia de melodias absolutamente lindas. Tem também qualquer coisa de mistura da grande tradição da ópera com as grandes bandas sonoras de filmes, e com as grandes canções também. Com todo esse universo do showbiz, da Broadway e do cinema americano”.Nesta história, Vanessa é abandonada pelo amante Anatol. Ela vive isolada com a mãe, a Baronesa (mezzo-soprano Alexandra Calado), e a sobrinha, Erica (soprano Beatriz Volante), à espera que ele regresse, envolvendo-as no seu drama. Até que passados 20 anos um homem que se faz passar por Anatol (tenor Ermin Ašćerić) aparece e vem desequilibrar as relações entre as três mulheres. Em palco estarão mais duas personagens, o Doutor (barítono Luís Rodrigues) e o Major Domo (barítono Tiago Amado Gomes). . “É uma história muito bem construída a partir de sonhos estilhaçados, com um objeto meio fantasmagórico, meio romântico, que simboliza todas as expectativas, todos os sonhos que as pessoas têm dentro de si, que às vezes passam uma vida à espera deles. Pode ser um amor perdido, uma ambição profissional outra coisa qualquer”. Com uma cenografia que remete para uma atmosfera de filme noir dos anos 1950, trata-se de uma ópera para todos, garante Catarina Molder. “Não é daquelas óperas que, pela linguagem musical, poderá não ser acessível a toda a gente. Esta ópera é mesmo para o grande público”, diz a soprano, apesar de Vanessa ela se ter revelado mais complexa para os executantes do que parecia ser. .“É uma ópera difícil, parece mais fácil do que na realidade é, e fomo-nos confrontando com isso ao longo dos ensaios, aquilo é música de filme. É vibrante, é pulsante. A orquestra parece uma carruagem de cavalos a correr em todas as direções. É uma loucura. É uma ópera muito exigente. Ali todos os músicos são solistas. Anda tudo a deitar fumo. Nos ensaios quase que se sentia o fumo a sair”, admite entre risos.Vanessa é um desafio para uma companhia de ópera independente, “mas não é uma ópera impossível”, sublinha Catarina Molder, que considera que esta escolha vem contrariar a “falta de variedade no mundo da ópera em geral, a nível internacional, em que se faz sempre o mesmo repertório, se anda sempre a fazer as mesmas coisas”. Vanessa estará em cena no Teatro São Luiz nos dias 31 de outubro, 1 e 2 de novembro, e será legendada em inglês e português..Um mundo onde os livros são para queimar. Há obras que devem acabar em cinzas?