The Gift. Eles convidaram-nos para a sala de estar deles
A Aula Magna foi esta quinta-feira à noite uma imensa sala de estar para a qual os Gift convidaram amigos e conhecidos, uns que há 20 anos já ali tinham estado a festejar, de tal forma que invadiram o palco, outros que nem nascidos eram - e que também acabaram a invadir o palco no final da noite de uma imensa festa.
Como amigos que sabem receber, contaram-nos histórias, riram-se e brincaram, elogiaram os Cure e desdenharam do que Madonna anda a fazer, agora que ela até é nossa vizinha, ofereceram-nos duas horas de alegria e melancolia, alguma esperança, sem grandes danças (disseram eles). Mas, no fim, como acontece sempre entre amigos, houve dança e palmas e barulho, e uma nova invasão de palco, 20 anos depois, agora com Big Fish, do álbum Altar.
Para começo de conversa, no "conforto da sala de estar" que foi esta noite a sala da Universidade de Lisboa, os Gift trouxeram-nos o seu Verão, o último álbum, pretexto para a atual digressão, que revisita também Primavera (2012). E é um verão diferente que este disco nos traz, disseram-nos em diálogo Nuno Gonçalves e Sónia Tavares, e é assim: mais calmo e relaxado, a pedir a dolência própria daqueles longos três meses de verão que eram as férias grandes da adolescência de muitos que ali estavam.
Nada se fazia com pressa, nada era urgente, havia tempo para respirar - e a primeira parte do concerto vive muito dessa eletrónica relaxada, como tinha antecipado ao DN Nuno Gonçalves, mesmo quando foram buscar You Will Be Queen ao álbum de 2017, Altar, que contou com Brian Eno na composição e produção.
À solenidade de Blue, o instrumental que abre Verão e com que arrancou o concerto, juntou-se a voz de Sónia, e que voz!, para nos trazer Hammock ou Serpentina, antes de chegar a Verão, a canção-título que, ao vivo, se mostra bastante eficaz, provando assim a escolha acertada para single de apresentação do disco.
De Primavera esta noite hipnótica apresentou-nos Open Window, Primavera, La Terraza ou Meaning of Life, um ciclo interrompido para uma surpresa no alinhamento, como garantiu Nuno Gonçalves, com Fácil de Entender (2006), e para uma segunda viagem a Verão, a metade para lá do meio do disco, mais vibrante, como descreveu Nuno, "mas não muito", como brincou Sónia.
Impossível não ser muito vibrante: Cabin, Lowland ou Vulcão pediram corpos a remexerem-se nas cadeiras largas da Aula Magna. E se os Gift tinham pedido desculpa por fazerem uma festa mais recatada, quando chegaram a Love Without Violins (com Brian Eno a cantar no ecrã) e a Big Fish já ninguém se lembrava dessas desculpas. Os amigos são para as ocasiões e para a festa. E no palco, para além de Nuno e Sónia, de John Gonçalves e Miguel Ribeiro, estiveram ainda Mário Barreiros, Paulo Praça e Israel Pereira.
No encore, houve Big Fish a fechar em delírio, como houve Live To Tell, porque afinal também gostam de Madonna e é uma canção que se cantava naqueles verões longos com tempo para tudo. E houve antes Music, de AM-FM (2004), com Sónia a explicar-nos porque nos receberam tão bem na sua sala de estar: "I'm doing it for music, I'm doing it for love, I'm doing it for everyone around me."