Que mudança introduz a lei publicada no final do ano passado na profissão de conservador-restaurador?O decreto-lei nº 90, que saiu em novembro do ano passado, vem alterar o decreto-Lei 140 de 2009. A grande alteração é definir o que é o conservador-restaurador. Durante décadas o Estado tinha uma Lei de Bases de Património em que genericamente diz que quem estaria habilitado para fazer as intervenções de conservação e restauro seriam profissionais reconhecidos legalmente para o efeito, mas nunca os reconheceu legalmente para o efeito. Essa alteração do decreto-lei define o que é o título de conservador-restaurador, quais são as competências e qual é a formação necessária para intervir em património classificado e em vias de classificação. Vem clarificar algo que o Estado não tinha feito até agora, e que, pelo facto de não o ter feito, permite que haja bacharéis, que haja pessoas que têm formações ao nível do técnico-profissional do 12º ano, a intervirem em património. Quem sofre é o património. A evolução desses profissionais é feita à custa do património. Houve essa clarificação e agora há que fazer com que ela se estenda a todas as áreas do património em que é necessária. Há boa formação nesta área em Portugal?Nós temos um sistema duplo. As universidades formam conservadores-restauradores generalistas, apostam em simplificar o ensino, dar um ensino excessivamente generalista. E depois a nossa prática, até mesmo em termos de Estado, exige uma diferenciação por especialidades. É necessário a pessoa ser conhecedora ou de têxteis, de metais, etc., e nós temos dois sistemas em confronto. Em que as universidades ainda não se adaptaram ao sistema que o mercado exige, que é ter profissionais capazes de intervir em determinadas áreas, que tenham uma formação forte nessas áreas.Os cursos deviam prever essa especialização logo no primeiro ano? Nós temos pelo menos três universidades acreditadas em cursos na área científica de conservação e restauro. E as universidades ainda não conseguiram encontrar o seu papel dentro do país, porque nem todas precisam de fazer a mesma coisa. Se calhar era útil que as universidades, entre elas, soubessem organizar-se e oferecer formações diferenciadas, trazendo mais conhecimento e maior capacidade de formação em determinadas áreas. Com a extinção da Direção-Geral do Património Cultural e a criação em 2024 da Património Cultural e da Museus e Monumentos de Portugal - a que pertence o Laboratório -, houve perda de autonomia? Não perdeu autonomia, mas em relação ao restante património edificado, que é alvo da ação da Património Cultural IP, exige-se alguma clarificação (não da minha parte). Porque nós temos de ter um papel normativo e transversal em relação a toda a área da conservação e restauro, mas o facto de nós estarmos só integrados numa entidade coloca algumas questões sobre como é que vai ser esse funcionamento. Até agora, em poucos meses, não existiu interligação, mas é algo que tem de ser clarificado no futuro, o papel do Laboratório junto da Património Cultural em termos normativos. Senão vamos ter duas entidades que podem olhar para o património de maneira diferente. Agora que está à frente do Laboratório, quais são as suas prioridades?Neste momento, posso dizer qual é que é a minha visão sobre as competências do Laboratório José de Figueiredo, que têm a ver com a ação junto dos museus e das universidades. Já falámos do ensino. Junto das universidades ter um papel mais interventivo na transmissão de quais são as necessidades para o país em termos da formação dos seus alunos. Portanto, tentar que as universidades percebam que têm de apostar mais numa formação mais especializada, ou mais exigente em termos de conteúdos teóricos e práticos para determinadas áreas de intervenção da conservação e restauro. Por outro lado, junto dos museus, e de acordo com o novo decreto-lei, apoiá-los e ajudá-los na parte de todos os tratamentos de conservação e restauro.Há muitos museus que já têm conservadores-restauradores, portanto, estarão autónomos para avaliarem e avançarem com os tratamentos de conservação e restauro. Há outros museus que não têm e a minha preocupação é chegar mais a esses museus.Quantos ainda não têm?Não sei dizer, ainda não consegui perceber bem como é que é o panorama. O outro objetivo é chegar aos museus que estão mais longe. Quero estender o meu apoio aos museus que estão mais longe, quer da capital, quer em termos das suas funcionalidades de conservação e restauro.Está a falar do universo dos 37 museus, monumentos e palácios da Museus e Monumentos de Portugal?Sim. Há alguns que não têm conservadores-restauradores e, portanto, vão precisar de um maior apoio. Mas deviam ter?Eu, pessoalmente, acho que todos deveriam ter conservadores-restauradores. Podemos também pensar na conservação preventiva, alguém que seja capaz de olhar para as coleções ou da reserva e ver o que é que está a acontecer em termos de degradação, de efeito das condições ambientais...A espada de D. Dinis e outros desafios do laboratório de conservação e restauro do Estado