Um programa de televisão sobre o colonialismo, mas no palco. Este é o conceito da peça Reparations Baby!, com texto e encenação de Marco Mendonça, e que agora está em cena no Teatro Variedades, em Lisboa, até dia 27 de julho, depois de ter passado por Sintra, Barcelos e Ílhavo.A peça surgiu de um convite de Pedro Penim (diretor artístico do Teatro Nacional D. Maria II) a Marco Mendonça. “Depois do convite tive duas semanas para decidir o que é que eu queria efetivamente fazer e, muito rapidamente, cheguei à conclusão de que gostaria de trabalhar sobre o tema das reparações. Depois disso surgiu a ideia de transformar este tema num formato de um game show”, explica o encenador, juntando a componente de entretenimento à informativa. “Senti que isso podia ser uma boa forma de brincar com este tema, que é bastante sério, mas ainda assim trazê-lo para um ambiente mais bem disposto, mais leve”. . Reparations Baby! retrata a estreia de um novo concurso de televisão em Portugal, onde três concorrentes negros adivinham as perguntas para certas respostas com a temática do colonialismo. Os concorrentes passam por diversas etapas com a promessa de o vencedor com mais pontos receber um prémio monetário.A ideia inicial era ser um estúdio de televisão completo, mas acabou por ser apenas um programa e os bastidores. “Foi uma forma de perceber os meandros, os constrangimentos e os conflitos que existem por trás de produções televisivas que têm como principal objetivo esta questão da representatividade. Eu quis trazer também para o espetáculo esta possibilidade de espreitar-mos para os bastidores de um programa como este”. Como um programa de trivia, a informação sobre reparações coloniais precisou de uma pesquisa que foi feita em pouco tempo. “Servi-me muito de materiais que eu já tinha recolhido no passado para eventuais projetos futuros e falei com pessoas. Foi um processo também de muita descoberta, muita frustração e reflexão também. Parecia que quanto mais eu tentava procurar respostas sobre esta questão das reparações, apareciam mais perguntas: qual é a melhor maneira de o fazer, que países é que já o fizeram e de que forma é que o fizeram. Até porque ainda há muita indefinição sobre este tema, principalmente em Portugal”. .Durante as duas horas do espetáculo, o encenador espera que espetadores se divirtam e que não sintam que estão a ver uma aula de História. “Se calhar, no fim da lista, posso ter como expectativa também que as pessoas eventualmente saiam do teatro a pensarem em algo em que nunca pensaram antes”.Sobre o panorama atual da sociedade, Marco Mendonça concorda que cada vez mais é importante esta discussão. “Parece que já dá para sentir o país a fugir de uma ideia de justiça e de igualdade democrática”, refere o encenador, acrescentando que é “aproximarmo-nos dos temas que visam um pensamento mais responsável sobre os crimes do passado. São cicatrizes, são consequências do colonialismo que ainda estão a ser vividas e isso vê-se na desigualdade que existe em Portugal, tanto a nível político como a nível social, como a nível de educação, como a nível profissional. A lista é interminável”. . Marco Mendonça menciona ainda que a ideia é que essa lista fique cada vez mais pequena. “Deixemos de ter de separar as comunidades em Portugal, as fatias da sociedade em listas de comunidades perigosas e ‘comunidades de bem’. O teatro não muda vidas, mas se calhar se as pessoas certas vierem ver uma discussão mais acesa, ela poderá ser tida fora daqui e gerar alguma mudança”. O elenco conta com Ana Tang, Bernardo de Lacerda, Danilo da Matta, June João, Márcia Mendonça, Stela, Vera Cruz. .Olga Roriz: "Libertei-me do pudor. Eu dispo-me neste espetáculo. Integralmente"