O mínimo que se pode dizer de um filme como Hálito Azul, produzido e realizado por Rodrigo Areias, é que se trata de uma proposta de risco. Por um lado, na sua base está o texto de Os Pescadores, clássico de Raul Brandão publicado há quase um século (1923); por outro lado, o filme organiza-se a partir de um trabalho de reportagem sobre a pequena comunidade piscatória de Ribeira Quente, na ilha de São Miguel, nos Açores..Que acontece, então? Pois bem, um jogo de variações sobre uma existência sempre ligada ao mar, suas histórias e mitologias. Viajamos no interior da comunidade retratada como quem descobre as singularidades de um mundo em que o fascínio das memórias não oculta, dir-se-ia que até intensifica, o reconhecimento da vulnerabilidade económica da própria comunidade..Estamos, afinal, perante uma experiência que podemos situar nesse vasto território transversal que, hoje em dia, integra zonas das mais diversas cinematografias: assim, a abordagem documental não dispensa as derivações ficcionais, de acordo com uma dialética que, em última instância, convoca o espectador para um processo singular de descoberta..Nesta perspetiva, pode dizer-se que a escrita de Raul Brandão funciona menos como uma informação histórica e mais como motor narrativo de uma visão que, num misto de observação e ansiedade, quer registar os sinais de uma vida profissional posta em causa pela industrialização da atividade piscatória..Num curioso depoimento para a Mostra de Cinema de São Paulo (um dos certames em que Hálito Azul já foi apresentado), Rodrigo Areias define o seu filme como um "documentário poético" - eis uma sugestiva expressão para classificar este cinema apaixonado pela realidade e seduzido pela lenda..* * * Bom