Hoje em dia, cada vez mais entusiastas de Go gostam de jogar em cafés. Aqui, um americano jogava Go num café, em Xangai, em janeiro de 2024.
Hoje em dia, cada vez mais entusiastas de Go gostam de jogar em cafés. Aqui, um americano jogava Go num café, em Xangai, em janeiro de 2024.D.R. / Macao Daily News

O Go: um jogo a preto e branco

É uma arte antiga, originária da China e um jogo intelectual. Na perceção dos antigos chineses, as pedras pretas e brancas do Go simbolizam as transformações do Yin e Yang no Universo, e daí o ditado popular chinês: “A vida é como um jogo de Go”.
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O Go é uma arte antiga, originária da China e um jogo intelectual. Na perceção dos antigos chineses, as pedras pretas e brancas do Go simbolizam as transformações do Yin e Yang no Universo, e daí o ditado filosófico muito popular na China: “A vida é como um jogo de Go”.

Em maio de 2017, um jogo Go realizado em Wuzhen, na China, captou a atenção do mundo. No jogo, o programa de Inteligência Artificial AlphaGo da Google enfrentou Ke Jie, um dos melhores jogadores do mundo, e venceu-o por 3:0. Isto demonstrou os enormes avanços na área da Inteligência Artificial e também despertou um grande interesse das pessoas pelo Go, um jogo tradicional de estratégia chinesa.

O Go, também conhecido por Qi, que teve origem na China há mais de 4000 anos, é uma das quatro artes tradicionais chinesas, a par de qin (instrumento de cordas), shu (caligrafia) e hua (pintura).

As regras do Go parecem intrincadas à primeira vista, mas são simples de entender. Dois jogadores alternam-se em rodadas, cujo objetivo é utilizar as pedras pretas ou brancas para cercarem o oponente: as pedras devem ser removidas do tabuleiro caso uma pedra (ou um grupo delas) for cercada por peças adversárias. Quando o jogo termina, o vencedor é determinado contando cada território cercado pelos jogadores, com as peças capturadas.

O tabuleiro quadrado do Go representa a Terra, enquanto as pedras redondas simbolizam o céu. Isto é uma reflexão da antiga cosmologia chinesa: o céu é redondo e a Terra é quadrada. FOTO: D.R. / Macao Daily News

“Na montanha, dois monges jogam Go. No tabuleiro, a sombra das folhas agitam-se suavemente. Não se veem os monges nos bambus, só se ouve o som de pedras, por vezes.” Estes versos, do famoso poeta da Dinastia Tang, Bai Juyi, são retirados do poema À Beira da Lagoa que descreve o ambiente sereno durante um jogo Go num bosque de bambus, o estado ideal para os literatos chineses, refletindo a conduta e a cultura únicas do Go.

O jogo é conhecido também como a “comunicação pelas mãos”, que significa que os movimentos das pedras no tabuleiro são a única forma de os jogadores comunicarem. Por outro lado, “observar o jogo em silêncio” é outra conduta básica, exigindo que os espetadores se mantenham sossegados, para não distraírem os jogadores.

Há ainda um princípio importante, que é “nunca se arrepender depois de mover a pedra”. Trata-se de um respeito mútuo entre os jogadores. 

O poema intitulado El Go, do escritor argentino Jorge Luis Borges, descreve-o como “um jogo astrológico”. “É mais antigo do que a escrita mais antiga, e o tabuleiro é um mapa do Universo. As suas variações em preto e branco esgotam o tempo.”

Curiosamente, o escritor argentino nunca esteve na China, nem sabia jogar Go, mas o poema revela-o como um jogo de filosofia, repleto de símbolos do pensamento taoista. Por exemplo, o padrão do tabuleiro evoluiu a partir do antigo diagrama civilizacional Hetu, que simboliza o estado de caos antes da formação do Universo; as pedras redondas pretas e brancas representam a transformação mútua de Yin e Yang; as 19 linhas que cruzam o tabuleiro formam 361 interseções, simbolizando os 361 dias do calendário lunar; os nove pontos circulares são designados por “estrelas”, e o ponto central é o “Tianyuan”, representando o centro do Universo e a origem de todas as coisas na perspetiva taoista.

Além disso, na perceção dos chineses antigos, o Go é uma integração dos elementos do céu, da Terra e os seres humanos, e as variações no jogo podem ser vistas como as mudanças do mundo.

O Go é muito popular em países do Leste Asiático, como o Japão e a Coreia do Sul. Durante as dinastias Sui e Tang (581-907), o jogo foi introduzido na Península Coreana e depois no Japão. Durante este período, 19 grupos de estudantes japoneses foram enviados para a China e a aprendizagem do Go era parte importante das suas formações académicas.

A Inteligência Artificial já é um assistente importante para os jogadores de Go treinarem. Em junho de 2023, uma empresa de IA de Xangai lançou a primeira versão doméstica de um robô Go. FOTO: D.R. / Macao Daily News

Em 1582, o padre Matteo Ricci chegou a Macau. Foi ele quem documentou as regras e o método do Go e as transmitiu à Europa. Daí, as pessoas do Continente Europeu já conhecerem o Go no século XVII.

Na era moderna, o Go tornou-se uma atividade competitiva mundial. As competições profissionais mundiais começaram em 1988 e o Go foi oficialmente incluído nos Jogos Asiáticos em 2010 e 2023.

Se o Go for visto apenas como uma competição, é difícil para os seres humanos vencerem a IA no futuro. Mas não se esqueçam de que o Go é uma arte, um meio de cultivar a mente e o corpo, e uma interação emocional entre as pessoas. Ao jogar Go, as pessoas podem divertir-se, enriquecer a experiência de vida, até conhecer a cultura chinesa e a sua visão sobre o universo e a vida.

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