O Go: um jogo a preto e branco
O Go é uma arte antiga, originária da China e um jogo intelectual. Na perceção dos antigos chineses, as pedras pretas e brancas do Go simbolizam as transformações do Yin e Yang no Universo, e daí o ditado filosófico muito popular na China: “A vida é como um jogo de Go”.
Em maio de 2017, um jogo Go realizado em Wuzhen, na China, captou a atenção do mundo. No jogo, o programa de Inteligência Artificial AlphaGo da Google enfrentou Ke Jie, um dos melhores jogadores do mundo, e venceu-o por 3:0. Isto demonstrou os enormes avanços na área da Inteligência Artificial e também despertou um grande interesse das pessoas pelo Go, um jogo tradicional de estratégia chinesa.
O Go, também conhecido por Qi, que teve origem na China há mais de 4000 anos, é uma das quatro artes tradicionais chinesas, a par de qin (instrumento de cordas), shu (caligrafia) e hua (pintura).
As regras do Go parecem intrincadas à primeira vista, mas são simples de entender. Dois jogadores alternam-se em rodadas, cujo objetivo é utilizar as pedras pretas ou brancas para cercarem o oponente: as pedras devem ser removidas do tabuleiro caso uma pedra (ou um grupo delas) for cercada por peças adversárias. Quando o jogo termina, o vencedor é determinado contando cada território cercado pelos jogadores, com as peças capturadas.
“Na montanha, dois monges jogam Go. No tabuleiro, a sombra das folhas agitam-se suavemente. Não se veem os monges nos bambus, só se ouve o som de pedras, por vezes.” Estes versos, do famoso poeta da Dinastia Tang, Bai Juyi, são retirados do poema À Beira da Lagoa que descreve o ambiente sereno durante um jogo Go num bosque de bambus, o estado ideal para os literatos chineses, refletindo a conduta e a cultura únicas do Go.
O jogo é conhecido também como a “comunicação pelas mãos”, que significa que os movimentos das pedras no tabuleiro são a única forma de os jogadores comunicarem. Por outro lado, “observar o jogo em silêncio” é outra conduta básica, exigindo que os espetadores se mantenham sossegados, para não distraírem os jogadores.
Há ainda um princípio importante, que é “nunca se arrepender depois de mover a pedra”. Trata-se de um respeito mútuo entre os jogadores.
O poema intitulado El Go, do escritor argentino Jorge Luis Borges, descreve-o como “um jogo astrológico”. “É mais antigo do que a escrita mais antiga, e o tabuleiro é um mapa do Universo. As suas variações em preto e branco esgotam o tempo.”
Curiosamente, o escritor argentino nunca esteve na China, nem sabia jogar Go, mas o poema revela-o como um jogo de filosofia, repleto de símbolos do pensamento taoista. Por exemplo, o padrão do tabuleiro evoluiu a partir do antigo diagrama civilizacional Hetu, que simboliza o estado de caos antes da formação do Universo; as pedras redondas pretas e brancas representam a transformação mútua de Yin e Yang; as 19 linhas que cruzam o tabuleiro formam 361 interseções, simbolizando os 361 dias do calendário lunar; os nove pontos circulares são designados por “estrelas”, e o ponto central é o “Tianyuan”, representando o centro do Universo e a origem de todas as coisas na perspetiva taoista.
Além disso, na perceção dos chineses antigos, o Go é uma integração dos elementos do céu, da Terra e os seres humanos, e as variações no jogo podem ser vistas como as mudanças do mundo.
O Go é muito popular em países do Leste Asiático, como o Japão e a Coreia do Sul. Durante as dinastias Sui e Tang (581-907), o jogo foi introduzido na Península Coreana e depois no Japão. Durante este período, 19 grupos de estudantes japoneses foram enviados para a China e a aprendizagem do Go era parte importante das suas formações académicas.
Em 1582, o padre Matteo Ricci chegou a Macau. Foi ele quem documentou as regras e o método do Go e as transmitiu à Europa. Daí, as pessoas do Continente Europeu já conhecerem o Go no século XVII.
Na era moderna, o Go tornou-se uma atividade competitiva mundial. As competições profissionais mundiais começaram em 1988 e o Go foi oficialmente incluído nos Jogos Asiáticos em 2010 e 2023.
Se o Go for visto apenas como uma competição, é difícil para os seres humanos vencerem a IA no futuro. Mas não se esqueçam de que o Go é uma arte, um meio de cultivar a mente e o corpo, e uma interação emocional entre as pessoas. Ao jogar Go, as pessoas podem divertir-se, enriquecer a experiência de vida, até conhecer a cultura chinesa e a sua visão sobre o universo e a vida.