O cinema é mesmo uma comunidade
Jodie Foster marcou presença na cerimónia de abertura do festival para receber uma Palma de Ouro honorária - feliz por ter na plateia a sua mulher, Alexandra Hedison, lembrou o certame da Côte d"Azur, em 1976, quando acompanhou Robert De Niro e Martin Scorsese na apresentação de Taxi Driver. E deixou a frase que pode resumir as emoções da noite: "Sinto-me tão orgulhosa de pertencer a esta comunidade."
Sem hipocrisias mediáticas: "Sabe bem sair, hem? Aqui estamos, finalmente. Sentiram a falta disto? Um bocadinho de glamour?" Na noite de terça-feira, o glamour não dependeu apenas da vibração do guarda-roupa - embora seja obrigatório citar o amarelo canário do vestido de Helen Mirren e o rosa choque do fato completo do presidente do júri, Spike Lee. Como habitualmente transmitida em direto pelo Canal+, a cerimónia refletiu um espírito comunitário enraizado na conjugação das línguas e dos filmes, do particularismo das histórias e da sua potencial ressonância universal.
O certame foi particularmente feliz no modo como reuniu quatro personalidades para a tradicional proclamação oficial: "Declaro aberto o 74º Festival de Cannes...". Assim, Jodie Foster e Spike Lee estavam acompanhados pelo espanhol Pedro Almodóvar (que fez o elogio da atriz) e o sul coreano Bong Joon Ho (assumindo o papel simbólico de "elo de ligação" com a edição de 2019 em que o seu Parasitas arrebatou a Palma de Ouro).
A riqueza simbólica destes detalhes ficou reforçada pela escolha de Annette, do francês Leos Carax, como filme oficial de abertura: um objecto que, do par de protagonistas - a francesa Marion Cotillard e o americano Adam Driver - até ao cruzamento de linguagens que propõe, nasce do desejo de um cinema realmente universal. Para que se percebesse os alegres dramas que tudo isto pode envolver, antes de ocupar o seu lugar ao lado dos outros jurados, Spike Lee lembrou, pedagogicamente: "Antes de me sentar, tenho que dizer uma coisa: quem me dera falar francês como Jodie Foster!"