Este ano vai haver menos festivais: Andanças e Barreiro Rocks cancelados

O festival de rock do Barreiro termina, após 19 anos. Já o Andanças cancelou esta edição mas promete voltar no próximo ano.
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Foi com "grande tristeza" que a associação Pé de Xumbo anunciou o cancelamento da edição de 2019 do festival Andanças, que se deveria realizar de 4 a 10 de agosto na barragem de Póvoa de Meadas, no concelho de Castelo de Vide, deixando porém logo uma certeza: o Andanças "não vai acabar".

O festival iria assim regressar ao local onde, em 2016, aconteceu o terrível incêndio no parque de estacionamento que destruiu mais de 400 viaturas. No entanto, chegados a junho, os organizadores perceberam que "é neste momento impossível garantir os pressupostos necessários à realização do que projetámos para esta edição, pelo que, sem alternativas de espaço, a única opção seria não realizar esta edição.

Quando em janeiro foi anunciado o regresso do Andanças à barragem, depois de duas edições, em formato mais reduzido, realizadas na vila de Castelo de Vide, o presidente da Câmara garantiu que iria haver um "reforço de segurança" na área da proteção civil, "seguindo todas as recomendações" que estão estipuladas neste tipo de eventos, referindo ainda que o festival iria ajudar a "relançar" o turismo na zona da albufeira de Póvoa e Meadas.

Nessa ocasião, a coordenadora artística e gestão de projetos da Pé de Xumbo, Marta Guerreiro, considerou que o regresso às margens da albufeira devolveria ao Andanças a sua "identidade": "O Andanças nunca foi um festival urbano e não é isso que nós queremos que seja", disse. No entanto, algo correu mal na preparação desta edição.

Ao DN, Marta Guerreiro explica: "O regresso a um evento de sete dias neste espaçoenvolvia a criação de infraestruturas que garantissem um festival com um nível de conforto e comodidade que com os recursos que tínhamos disponíveis eram impossíveis de atingir no tempo que nos restava. Deste modo, o cancelamento teve como primordial objetivo não defraudar as expectativas do nossos participantes, artistas, voluntários que são fundamentais à existência do Andanças que tem mais de 20 anos de existência e é livre de apoios comerciais de marcas."

O Andanças é um festival de música e dança populares que acontece desde 1996 e que procura ser, acima de tudo, um espaço de encontro entre pessoas e de reencontro com a alegria de dançar, seja as músicas tradicionais portuguesas sejam de outras partes do mundo. "Neste interregno iremos projetar um Andanças num formato adaptado aos desafios emergentes, pensado para proporcionar condições que respondam às presentes alterações climáticas e que, assente na sustentabilidade e preservação do meio envolvente, garanta uma experiência plena aos nossos participantes, artistas, voluntários e parceiros", lê-se no comunicado. "O Andanças continuará a ser um espaço onde todos dançam, onde se faz música, onde se pode aprender e ter novas experiências, onde há partilha e cruzamento de ideias para um mundo melhor."

"Vocês não merecem ver-nos a definhar"

"O rock and roll quer-se rápido e explosivo" e, não podendo ser assim, o melhor é não continuar. É com estas palavras de lamento que a associação cultural Hey Pachuco anuncia na sua página oficial de Facebook o fim, após 19 anos, do festival Barreiro Rocks: "Chegados a 2019 reconhecemos que não temos condições para fazer mais nem melhor sem arriscarmos aquilo que não temos: tudo o que o vil metal compra - tempo e meios. Vocês não merecem ver-nos a definhar, o rock and roll quer-se rápido e explosivo."

O festival nasceu da paixão pela música de três amigos, Carlos Ramos, Iolanda Vilarinho e João Cruz, que em 2000 realizaram um primeiro evento que começou por se chamar Pachuco Fest e depois, em 2002, passou a chamar-se Barreiro Rocks. A história foi muito bem contada pelo Frankmarques Blog por ocasião dos 15 anos do festival. Com a mudança de nome e já com o apoio da Câmara Municipal do Barreiro, o festival passou para o pavilhão do Luso FC, já pôde contar com um equipamento de som decente e começou a convidar bandas estrangeiras. A partir de 2005, criada a associação Hey Pachuco, o festival entrou numa fase de crescimento.

"De um valor calculado à distância de cerca de mil euros de custos para o primeiro Pachuco Fest, o Barreiro Rocks cresceu para um orçamento de 25 a 30 mil euros, dos quais cerca de 18 mil euros provinham nesta fase de bonança do protocolo assinado entre a CMB e a Hey Pachuco", lê-se no Frankmarques Blog. O Barreiro Rock internacionalizou-se, trazendo artistas de renome (por exemplo o norte-americano Andre Williams, em 2008) mas também muito público de fora, passando a realizar-se no Grupo Desportivo dos Ferroviários, onde permaneceu até à última edição. Por lá passaram nomes como Black Lips, Ty Segall, King Khan & The Shrines, Fast Eddie Nelson, The Parkinsons, The Legendary Tigerman e Lulu Blind.

Veio depois a crise e a machadada nos apoios ditou que o festival tivesse que fazer uma marcha atrás: o apoio público foi sendo reduzido até aos cinco mil euros, em 2012. "Desde então, o festival começou a definhar e começámos a ter que, ano após ano, arriscar pessoalmente tempo e dinheiro para o conseguir fazer", lamentou Carlos Ramos à agência Lusa. "O percurso foi sempre sinuoso no que toca aos apoios. Este era, reconhecidamente, um festival com bastante importância nacional e internacional, mas que nunca conseguiu transformar essa importância em apoio financeiro", disse.

Para este ano, o apoio da autarquia subiria para 15 mil euros, explicou, mas a organização do Barreiro Rocks passaria a ter mais responsabilidades e despesas, nomeadamente com segurança e licenças. "É impossível fazer-se este festival por menos de 25 mil euros", afirmou o músico, lamentando que o Barreiro não seja "a cidade mais apelativa para as marcas privadas investirem".

O festival acontecia geralmente no final de outubro. Na edição do ano passado o bilhete para os três dias de concerto custava 30 euros.

"Foram os melhores 19 anos da nossa existência", escrevem os organizadores no comunicado de despedida. "Fizemos centenas de amigos, trouxemos quase a totalidade dos artistas que gostávamos ao Barreiro e ajudámos a pavimentar o chão para que novos projetos crescessem com mais dignidade na nossa cidade. Pelo caminho fomos acreditando que com muito pouco se podia fazer um festival de renome internacional e talvez tenha sido esta postura que nos atraiçoou e nos empurrou em direção à situação atual."

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