Antigo bibliotecário, romancista, argumentista e realizador de cinema, o norueguês Dag Johan Haugerud (n. 1964) pode ser definido, no mínimo, como um criador multifacetado e ambicioso — o que, bem entendido, só lhe fica bem. Este ano, em fevereiro, conseguiu mesmo a proeza de, pela primeira vez, conquistar para a Noruega o Urso de Ouro do Festival de Berlim. Foi com o filme Dreams, título que encerrou uma “Trilogia de Oslo” iniciada com Sex e continuada com Love — agora, com chancela da distribuidora Films4You, Sex chega esta quinta-feira, 20, às salas portuguesas, seguindo-se Dreams (27 nov.) e Love (4 dez.).Os três filmes funcionam de modo autónomo, podendo ser vistos por qualquer ordem. Em qualquer caso, não será exagero dizer que Haugerud está preocupado com coisas muito sérias, mesmo não se coibindo de brincar com a seriedade das histórias que tem para contar e a universalidade dos respetivos temas — aliás, neste aspeto, os títulos em puro inglês são eloquentes.O ponto de partida de Sex tem qualquer coisa das primeiras comédias de Woody Allen em versão norueguesa. Deparamos, assim, com dois amigos que trabalham como limpa-chaminés, ambos a viver em uniões heterossexuais. Numa das suas conversas particulares e, podemos dizê-lo, mais íntimas, um deles (Jan Gunnar Røise) diz ao companheiro de trabalho (Thorbjøn Harr) que teve um encontro sexual com outro homem — um impulso, diz ele, que não o “transforma” num homossexual... Perante o choque do amigo, explica-lhe mesmo que, com a mesma candura, já deu conta à sua mulher do que aconteceu.Digamos que, a partir daqui, o filme adquire qualquer coisa de Eric Rohmer (e será forçoso citar A Minha Noite em Casa de Maud, de 1969), com as evidências, inquietações e enigmas da sexualidade a serem vividos através de uma inesperada, por vezes fascinante, profusão de palavras. Este é mesmo um filme de que está ausente tudo aquilo que associamos às representações mais “óbvias” da sexualidade (corpos seminus e suspiros ofegantes nas versões pueris das telenovelas): o que mais conta é o pingue-pongue dos diálogos, por vezes transportando muitas angústias, outras atraindo um desconcertante humor.Enfim, Haugerud não terá a contundente comicidade de Woody Allen nem a perversa subtileza de Eric Rohmer. Seja como for, importa dizer que este não é um cinema “copista” do que quer que seja, resultando de uma genuína procura realista para expor as contradições que assombram os humanos e, em particular, o trabalho imenso que é escolher as palavras com que tentam enfrentar a fragilidade do seu mundo. .O espaço e o tempo do rap crioulo.Realismo em tom espanhol