Espiões cubanos com charme francês
Será este o Assayas de filmes como Demonlover- Agente Infiltrada (2002) ou Boarding Gate- Porta de Embarque (2007)? Ou antes o Assayas de Carlos (2010)? Talvez uma síntese de ambas as "personalidades" de um realizador que é pródigo em experimentar géneros. E a palavra "experimentar" sempre fez sentido na obra do francês.
Olivier Assayas, que ainda há pouco nos oferecia o curioso Vidas Duplas, o chamado "típico" filme francês de personagens e com "romanesco parisiense", quando faz um filme de espionagem como este está precisamente a dar a volta às componentes da receita: não acelera quando é preciso, não fica com as personagens quando começamos a gostar delas e nunca é expansivo na criação de "suspense". É tudo irrisão pura com predicados de série B, mesmo quando se mistura um "savoir faire" de câmara do qual se retira um prazer cinéfilo estranhíssimo. De facto, a "estranheza" é eventualmente um trunfo numa obra que chegará à Netflix em muitos países, sendo Portugal uma das exceções.
Partindo do livro do político e jornalista brasileiro Fernando Morais, Os Últimos Soldados da Guerra Fria (2011), Wasp Network conta a história dos agentes secretos infiltrados por Cuba em organizações de extrema-direita dos Estados Unidos para contrariar atos de terrorismo americanos contra Castro em plenos anos 1990. Supostamente, tudo verídico a tal ponto que o filme perde "tempo" a exibir a sua factualidade.
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A ação desdobra-se em cinco espiões cubanos a operar em Miami, centrando-se em Gerardo Hernandez (Gael García Bernal) , o líder desse grupo de espiões cubanos , ao qual se junta o piloto René González (Edgar Ramírez). Fingindo desertar e abandonar a mulher Olga (Penélope Cruz) e a filha, René torna-se um dos agentes mais importantes. Além destes nomes, o elenco tem ainda Wagner Moura e Ana de Armas, precisamente o par romântico de Sergio, o "biopic" sobre Sérgio Vieira de Melo disponível na Netflix.
Com uma escala de produção de fôlego considerável à qual o Governo Cubano disponibilizou acesso a áreas de segurança nacional numa ação sem precedentes, este thriller de espionagem vale também por mandar às urtigas fórmulas de Hollywood, em especial na forma como as histórias se cruzam e se complicam entre si. Se a regra diz que há que unificar os múltiplos sub-plots, Assayas investe antes numa aposta de tornar cada caso estanque. Aliás, aliando a isso um peso épico, Wasp Network acaba por não se parecer com nada. A única coisa que se lhe pode apontar é uma certa desmesura da mensagem de denúncia da hipocrisia americana. Aí o filme fica panfletário e ambicioso demais (onde numa série televisiva tudo poderia ficar mais "respirado").
Provavelmente por isso, saiu do Festival de Veneza com reações extremamente polarizadas. Certo e garantido é que Olivier Assayas nunca faz cinema medíocre...
*** Bom