Metal sinfónico ou rock progressivo? Estas são classificações que podem servir para apresentar banda norte-americana Dream Theater, mas o mais certo é adjetivar com perseverança, resistência e consistência a música que, desde meados dos anos 1980 - ainda com o nome de Majesty - o grupo começou a criar, juntando-se ao chamado movimento progressivo. Vencedores de Grammy pela “Melhor performance de Metal” em 2022, os Dream Theather estão em digressão pela Europa a apresentar um novo espetáculo - que assinala os 40 anos da banda - , algumas músicas do álbum que vão lançar em fevereiro, Parasomnia, e ainda a celebrar o regresso, treze anos depois, de um dos fundadores da banda: o premiado baterista Mike Portnoy. Em conversa como DN, via Zoom, o teclista Jordan Rudess explicou a excitação pela nova digressão, o regresso aclamado pelos fãs de Portnoy e ainda o papel da Inteligência Artificial na música contemporânea. .Como está a correr a nova digressão?Tem sido incrivelmente excitante. E estamos a celebrar o facto de termos de regresso à banda o [Mike] Portnoy. Estamos também a apresentar uma das maiores produções que já montámos, entre o áudio, as luzes e lasers..E como está a ser o regresso de um dos membros fundadores dos Dream Theater, o baterista Mike Portnoy?Tem sido muito bom. Foi tudo muito tranquilo desde o momento em que ele entrou pela porta e começou a ensaiar connosco ou mesmo antes quando começamos a ter ideias para este novo álbum [Parasomnia]. Divertimo-nos imenso a prepará-lo. Há muita alegria, muitas emoções, muitos sentimentos bons entre todos nós. O Mike Portnoy é alguém que tem muitas especialidades, para além de tocar bateria, claro. .Como foi o processo criativo deste novo trabalho, diferente dos anteriores?Bem, uma coisa que permanece no trabalho dos Dream Theater ao longo dos anos, pelo menos desde a minha entrada na banda [em 1999], é que o John Petrucci [guitarrista] e eu escrevemos muitas das letras. Mas agora com o Portnoy de regresso vai acrescentar mais coisas, ele tem muita habilidade para fazer arranjos e para produzir. Obviamente, quando ele saiu nós continuamos bem, ganhamos um Grammy (2022) e fizemos bons álbuns, mas agora com o seu regresso estamos a revisitar essa energia colaborativa. O Portnoy é como um realizador de cinema, pensa muito em como as coisas se juntam e tem uma série de ideias interessantes sobre como um álbum deve ser num todo. Foi uma ótima adição voltar a essa metodologia de trabalho. E acho que os fãs vão sentir isso imediatamente quando ouvirem o novo disco.um. .A banda norte-americana Dream Theater. Da esquerda para a direita: John Ro Myung (baixista); Jordan Rudess (teclado); James La Brie (vocalista); Mike Portnoy (baterista) e John Petrucci (guitarrista)..O que é interessante porque a digitalização da música fez com que cada vez mais se ouvissem as músicas avulso, e não como um todo, já poucos têm o hábito de ouvir um álbum por inteiro.É uma das coisas com que temos de lidar atualmente. Há mais pessoas a ouvir um single no Spotify ou na Apple Music, ou outra plataforma, e menos a escutar um álbum inteiro. Mas, dito isso, ainda valorizamos a ideia de que podemos criar um álbum que é coeso e tem uma história. Para as pessoas que têm o desejo e a paciência de ouvir tudo, há muito valor nisso. .Já é conhecida uma música, Night Terror, do novo álbum que será lançado em fevereiro. O que querem transmitir com este novo trabalho?Já lançámos os títulos das canções, divulgámos o nome do álbum e vão sair alguns singles muito em breve. Mas não posso dar mais informações. Do meu ponto de vista, posso dizer que este álbum captura o som central dos Dream Theater. Não diria que houve necessariamente um esforço para reproduzir algo em particular mas há uma espécie de memória do som, por isso quando as pessoas ouvirem vão, talvez, sentir: “Sim, eu lembro-me disso”.A indústria da música mudou muito, como vê essas mudanças?Os últimos 10 anos mudaram radicalmente a indústria da música. Vejo coisas muito tristes. É mais difícil para um músico ter sucesso e ganhar dinheiro. Obviamente, ninguém está a ganhar dinheiro com a venda de álbuns ou CD’s, e nem sequer há muita gente a ganhar dinheiro com a venda de vinil, embora, honestamente, para um grupo como os Dream Theater, exista algum benefício financeiro nisso porque muitos dos nossos fãs valorizam uma embalagem mais old school. Mas, mesmo assim, não é um negócio como antigamente. Por isso, o retorno financeiro está hoje nos concertos ao vivo, no merchandising, nos encontros VIP e outras coisas que podemos fazer. O mundo está a mudar tão rapidamente com o desenvolvimento tecnológico... Até me considero uma pessoa tecnológica e tento tornar a tecnologia numa coisa positiva, mas, ao mesmo tempo, à medida que se desenvolve, algumas pessoas são deixadas para trás..Como vê o papel da Inteligência Artificial (IA) na criação musical?Estou a trabalhar no desenvolvimento de tecnologia ligada à música. Por um lado é incrível o que se pode fazer. Mas muitos olham para a tecnologia e veem uma ameaça aos seus empregos, muita gente está assustada com o que que está a acontecer e não percebem no que a tecnologia os pode ajudar. Sou embaixador de uma empresa chamada Moises, que cria software capaz de detetar acordes ou separar faixas, acelerar ou abrandar uma música. Digamos que alguém que esteja a aprender a tocar um solo de guitarra do John Petrucci pode, com esta app, ouvir apenas o solo de guitarra e abrandar o seu ritmo e ver os acordes. A aplicação divide automaticamente, com recurso à IA, a canção em secções. Há muita gente a usá-la e não fazem ideia que é tudo IA. Isto apesar de muitos músicos acharem que a IA é terrível e vai arruinar o mundo. Tudo o que ouvem é que os seus direitos estão a ser interferidos por empresas que estão a carregar música em computadores, quando há tanta coisa a acontecer. Mas é uma altura difícil. Muito honestamente é um pouco difícil ser defensor da IA por causa da desinformação e do medo que existe. Se consultarmos o Instagram vemos muita gente a dizer que IA vai destruir o mundo. Ao mesmo tempo, há outras pessoas que utilizam a tecnologia para fazer coisas criativas, positivas, interessantes e educativas e de entretenimento. Pelo menos é isso que penso. Recomendo aos jovens músicos que mantenham os olhos abertos, não tenham medo da tecnologia. Descubram como podem estar envolvidos, como podem usar as ferramentas tecnológicas e como podem continuar a ser criativos e a fazer coisas giras com a vossa música..Tem formação em música clássica. Continua a influenciar a forma como toca e compõe? Sou um pianista formado na Juilliard [The Julliard School em Nova Iorque]. Queria ser pianista profissional até que por volta dos aos 17, 18 anos comecei a descobrir os sintetizadores e pessoas como Keith Emerson, o Rick Wakeman e o Patrick Mraz que tocavam esses instrumentos que me interessavam muito, e isso desviou-me do meu caminho. Mas tive uma formação sólida, quer técnica como musical e que é a base de tudo o que faço. Portanto, não há como apagar isso..Ainda sobre os fãs de Dream Theather, quem assiste aos vossos concertos, há novos públicos a ir aos concertos?Há uma verdadeira mistura de pessoas de todas as idades. É espetacular. E na Europa temos muitos jovens nos nossos concertos. Temos um público mais ligado ao metal mas também temos muita gente que está a aprender a tocar guitarra, bateria ou teclados e vai aos nossos concertos. Portanto, é uma mistura muito cool.