O briefing que a autora e jornalista Maria João Martins recebeu da Pato Lógico e Imprensa Nacional foi dar a conhecer a escritora e poeta Natália Correia a um público muito específico - adolescentes. “Sem ter uma linguagem demasiado escolar, e sem ter um tom paternalista ou demasiado pedagógico. Com uma certa irreverência”, diz Maria João Martins ao DN. A principal dificuldade na escrita deste livro foi mesmo essa, escrever para um público jovem. “Foi o meu maior desafio e que me fez levar algum tempo a decidir se aceitava ou não. É que esta é a minha estreia no infantojuvenil. E como é que se explica a Natália a adolescentes?”.O livro Natália Correia - Entre o Riso e a Paixão, ilustrado por Catarina Alves, enquadra-se na coleção Grandes Vidas Portuguesas e a autora aceitou o repto porque, como diz, “eu gosto muito da Natália Correia, que eu ainda conheci”. Maria João Martins, que também é colaboradora do DN, tinha pouco mais de 20 anos e trabalhava no Jornal de Letras, na Avenida da Liberdade. Natália Correia e o último marido - ela casou-se quatro vezes -, Dórdio Guimarães, moravam em frente à gráfica do jornal, na Rodrigo Sampaio, em Lisboa. E era frequente, conta a autora, Natália Correia aparecer na gráfica, “porque os artigos dela não saíam como ela queria, e ela era muitíssimo exigente, ou mesmo porque, em determinada altura, os livros dela eram publicados pelo O Jornal, editora que pertencia à empresa do Jornal de Letras”. .“A felicidade para as pessoas com quem ela ia reclamar é que ela já tinha algumas dificuldades de locomoção e a gráfica ficava numa cave, com uma escada bastante empinada, portanto, ela só ficava no hall, a reclamar de uma forma bastante teatral, que a caracteriza”.Mas Maria João Martins teve um contacto mais próximo com Natália Correia, na casa dela, cerca de um ano antes de ela morrer, no dia 16 de março de 1993, quando foi falar com ela a propósito daquela que terá sido uma das suas últimas batalhas públicas, segundo a jornalista: era contra a aplicação de IVA aos livros. “Há uma colega nossa que tinha de ir a casa da Natália entrevistá-la, e diz-me, João, não te importas de ir comigo que eu tenho medo. A Natália era, de facto intimidatória. Era uma mulher brilhante, mas no primeiro contacto era às vezes um bocadinho hostil. E como a minha colega teve medo de ir sozinha, eu fui, e fiquei deslumbrada”, diz Maria João Martins. Este contacto, a que a autora faz uma breve referência no livro, até correu bem. “Era de uma raiva homérica, mas também era depois de uma grande gentileza, quando gostava das pessoas”. No livro Natália Correia - Entre o Riso e a Paixão, que será presentado esta sexta-feira, dia 17, Maria João Martins descreve alguns dos momentos mais marcantes da vida de Natália Correia, desde a infância em São Miguel, nos Açores, à vinda para Lisboa, à censura e polémica em torno dos seus livros, até à intervenção política, como deputada à Assembleia da República. A escolha dos momentos mais relevantes da vida da escritora e poetisa para um livro de apenas 70 páginas não foi um processo fácil. “Essa foi a dificuldade, escolher momentos de uma vida que é toda ela, desde a adolescência até ao final, muito rica, quer em termos literários, quer em termos de cidadania. Não sei se ainda temos muita consciência da importância que a Natália teve para as mulheres portuguesas e como ela foi avançando à nossa frente”. .“Essa foi a dificuldade, escolher momentos de uma vida que é toda ela, desde a adolescência até ao final, muito rica, quer em termos literários, quer em termos de cidadania".Um dos episódios retratados passou-se em 1982, quando Natália Correia era deputada do PSD à Assembleia da República. “Pensei muito em como é que introduzia o episódio da discussão da despenalização do aborto e das célebres quadras dedicadas ao deputado João Morgado [do CDS]. Mas acabei por pôr, porque acho que é fundamental para percebermos a Natália, esse desassombro, e que não tem nada a ver com o que hoje se passa na Assembleia da República. Ela fez esses versos naquele momento, mas tudo isso está relacionado com a sua profunda cultura poética e conhecimento da tradição satírica da poesia portuguesa, que levou, por exemplo, a trabalhar na Antologia de Poesia Erótica e Satírica”. Um livro de 1965 proibido pela censura e que a levaria a tribunal. “Ela era uma mulher profundamente livre, em termos mentais e em termos políticos, é isso que eu amo tanto na Natália”, diz Maria João Martins, que assim contribui, juntamente a ilustradora Catarina Alves, para despertar a curiosidade dos jovens pela vida e obra desta mulher que deixou a sua marca na vida cultural portuguesa. .NATÁLIA CORREIA - ENTRE O RISO E A PAIXÃOMaria João Martins e Catarina AlvesPato Lógico/Imprensa Nacional70 páginas.'Astérix na Lusitânia'. Conheça a capa e novos personagens do 41º álbum das aventuras do gaulês.O Nobel que diz tudo num parágrafo.Cinco filmes para (re)descobrir Diane Keaton