Realizado pela dupla Philipp Fussenegger/Jens Meurer, As Lições de Peaches é um documentário com data de 2024 que tem como ponto de partida a digressão que a canadiana Peaches (nome artístico de Merrill Nisker, nascida em Toronto em 1966) organizou para celebrar os 20 anos do seu álbum The Teaches of Peaches (2000).Numa primeira aproximação, digamos, para simplificar, que se trata de um exercício documental convencional, dominado pelas imagens da digressão, alternando com momentos dos ensaios, depoimentos de outros artistas e uma entrevista com a própria Peaches, servindo de elemento aglutinador de passado e presente. Sem esquecer, já agora, que não faltam algumas sugestivas imagens de arquivo, incluindo as que testemunham o trabalho de Merrill, ainda relativamente jovem, como educadora numa escola infantil.Resta saber se podemos classificar como “convencional” o retrato de alguém que, do radicalismo da postura intelectual até à exuberância das performances de palco, está longe de poder ser definida como uma figura redutível aos padrões correntes do universo musical. Acrescentemos, por isso, que a arte singular de Peaches se move no território plural do chamado “eletroclash”, convocando influências suficientemente variadas para ir desde as eletrónicas da década de 1980 até aos valores da música de dança de espírito alternativo, passando pelo punk, pós-punk & etc.A virtude maior do trabalho de Fussenegger/Meurer será, justamente, a capacidade de não ocultar o que quer que seja do misto de fúria criativa e espírito militante que define o universo criativo de Peaches. Aliás, ironicamente, não podemos deixar de acrescentar que a noção de “não ocultação” se adequa a tal universo, já que Peaches se define por uma inequívoca frontalidade, da festiva utilização das mais diversas formas de calão até à nudez em palco.Daí a importância de vários depoimentos que vão pontuando As Lições de Peaches, incluindo aquele que é prestado por outra intérprete canadiana, Feist, aliás colaboradora do álbum cujo aniversário se celebra. Especialmente significativas são as palavras de Shirley Manson (vocalista dos Garbage) que, com humor e didatismo, situa a trajetória de Peaches como um exercício eminentemente pessoal ligado a toda uma discussão libertadora (por vezes libertária) da sexualidade e das identidades sexuais. Dito de outro modo: se a música possui sempre uma dimensão visceralmente política, eis um documentário que nos ajuda a compreender como isso pode acontecer. .Avatar: o fim da utopia? .'No Romper da Luz'. Histórias de amor, palavras e luz