A Lua já não é o que era
Resumir um produto cinematográfico como Leva-me para a Lua (a partir de esta quinta-feira nas salas) é um exercício com o seu quê de absurdo. Que dizer de um filme cuja principal premissa - a fabricação de imagens falsas do desembarque dos astronautas da Apollo 11 na Lua - é revelada quando já assistimos a cerca de metade da sua duração? Pois bem, que é um insensato desastre narrativo: como criar emoção e suspense, ou apenas curiosidade, quando tal premissa permanece oculta durante metade do tempo em que assistimos à sua projeção?
Aliás, a mesma informação, supostamente inesperada, já tinha sido amplamente “noticiada” pelo próprio estúdio do filme. Onde? No respetivo trailer. Estamos, de facto, perante um exemplo revelador da degenerescência de gestão de alguns domínios da produção de Hollywood (de onde continuam a surgir filmes fascinantes, não é isso que está em causa): o esforço para recuperar um certo gosto clássico do espetáculo surge enraizado num evidente desconhecimento do misto de rigor e mistério da sua herança.
O título original, Fly Me to the Moon, evoca a canção composta por Bart Howard em 1954, um genuíno “standard” do cancioneiro popular “made in USA”. Uma das suas versões mais famosas, por Frank Sinatra, com a orquestra de Count Basie e arranjos de Quincy Jones, surgiu em 1964 (no álbum It Might as Well Be Swing), acabando, justamente, por acompanhar as missões lunares até ao desembarque no satélite da Terra a 20 de julho de 1969. O filme cita a canção, mas não faz qualquer esforço para situar (já agora, esclarecer) o seu valor simbólico no imaginário popular. É uma insuficiência que reflete a indefinição de todo o projeto.
Através da personagem de Scarlett Johansson, uma especialista em marketing, começamos por identificar uma comédia ligeira com alguma ironia política: a sua missão é “limpar” a imagem pública da NASA numa altura em que o prestígio da agência espacial americana está em queda. Quando surge Channing Tatum, no papel do coordenador da missão Apollo 11, a vertente romântica avança com a subtileza de um foguetão a despenhar-se… O filme segue à deriva até surgir um conselheiro do Presidente Nixon, encarregado de proteger a retaguarda, ou seja, organizar as filmagens de uma falsa alunagem: por alguma razão, Woody Harrelson interpreta a personagem num registo de autoparodia que não chega para redimir tudo o resto.
Em boa verdade, quer de um ponto de vista cómico, quer na hipótese de um dramatismo mais cru, há um sugestivo potencial na ideia de criação de imagens falsas para dar conta da chegada dos humanos à Lua (até porque na época proliferaram especulações nesse sentido). Seria preciso, no mínimo, alguma subtileza que a realização de Greg Berlanti nunca demonstra: predomina uma “aceleração” inconsequente, incapaz de gerar um mínimo de consistência narrativa. Ponto a reter: quando o filme nos mostra algumas das lendárias imagens televisivas de Walter Cronkite a comentar a aterragem do módulo lunar, sentimos, pelo menos, que alguém acredita naquilo que está a fazer.