Iminente pediu para ficarem em casa. Mas ninguém ligou
Depois da silly season, mas antes de recomeçarem em força escolas e universidades, há o Festival Iminente, arte contemporânea e música reunidos num só lugar. Começa esta sexta-feira e os TRKZ são os primeiros a subir ao palco, às 16.20.
Pelo segundo ano consecutivo, o Jardim Municipal de Oeiras, junto à linha do comboio, recebe o festival. Entre árvores e bancos de pedra, sombra quanto baste e um lago sem água, instalam-se as obras dos artistas portugueses convidados por Vhils. O artista, Alexandre Farto na vida civil, fundador da galeria Underdogs, é um dos mentores do festival.
É outro dos organizadores, e fundador, do Iminente, que recebe o DN. Adilson Lima, recebe o DN para explicar com vai ser a edição deste ano. É quarta-feira e o recinto ganha forma, mas ainda está longe de estar concluído. Preparam-se para receber 3 mil visitantes por dia, e, garante o interlocutor, não mais. "O primeiro dia esgotou no dia em que pusemos os bilhetes à venda em quatro horas", sorri.
O preço, 5 euros, defende, explica o sucesso. Apesar de, nas redes sociais, pedirem aos possíveis interessados para ficarem em casa, sábado e domingo também já estão completos. "Não há ninguém que não possa vir e ter bons momentos", começa.
"O objetivo é democratizar o acesso à arte", sustenta Adilson Silva, ao DN. "Para que a pessoa não diga que queria ter ido ver os Rolling Stones, mas o bilhete são 40 euros, ou se vou ao Sudoeste e depois tenho de abdicar de outras coisas. Aqui, não. Está aqui em Oeiras, ao lado do comboio, os concertos acabam às 02.00".
Adilson Lima explica o timing: "Após a silly season, dos festivais com brindes e álcool, que também temos, mas não nessa dimensão, ocupámos aqui um espacinho em que não estamos a concorrer com nenhum grande festival", explica. A data foi escolhida em parceria com a Câmara Municipal de Oeiras, principal patrocinador do evento.
Mas o que é o Iminente? Adilson Lima garante que este é um festival "transversal", "dos 8 aos 80". Admite que o público-alvo podiam ser os universitários, mas "toda a gente gosta de arte". "Temos aqui um conjunto de artistas que vêm com a sua linha de seguidores, vêm ali à Underdogs comprar prints [impressões] de 300 euros. Vêm ver o tipo de música que está a ser apresentado".
Os Orelha Negra, que lançaram o novo disco esta sexta-feira, às 00.00, são os cabeças de cartaz desta noite, mas há também Carminho, Slow J, You Can't Win Charlie Brown, Capitão Fausto, Regula, Noiserv, Capicua, entre outros. Os concertos (cujo alinhamento pode ser consultado através desta página) começam ao início da tarde (amanhã, às 15.40; domingo, às 15.00) e a noite termina sempre com DJ. Hoje, a partir das 01.00, com Marfoz e Nervoso, amanhã com Xinobi e Moullinex, no domingo com DJ Ride e o próprio Vhils.
Ter apenas 3 mil pessoas por dia é opção, explica Adilson Lima. "Algumas peças artísticas precisam de ser assimiladas e uma pessoa que está a tentar ver onde está a peça a desviar-se, não é muito interessante. Com 3 mil pessoas garantimos que toda a gente pode ver as peças à vontade e ver a música". Não é para mudar, garante. O espaço é "tão cool" e "o berço do Iminente" é Oeiras. "Temos aqui uma estufa, um lago, sempre que cá vimos este jardim está em crescimento. As árvores em constante mutação... Este jardim acaba por ter diálogos connosco e interromper este diálogo não era nada interessante, fixe", completa Adilson Lima, co-fundador do festival. "São três pessoas, eu, o Guilherme [Salvador] e Vhils".
Avança-se pelo jardim, passando o lago, sem água, até uma conjunto de árvores, onde, no chão, começa a surgir uma escultura redonda. Maria Imaginário é a artista que está a trabalhar na sua peça. "São duas mamas e um pipi". Na quarta-feira, enquanto trabalhava, o título da peça ainda não era claro. Talvez, "As Mariazinhas". Ri-se.
É uma dessas peças, humorísticas e com um toque de provocação, que não consegue passar despercebida. "Vai ser uma festa do pipi", brinca, explicando a razão de ser dos balões de papel e grinaldas que se espalham no chão. "Vai ser tipo a festa da aldeia... com o pipi. É uma celebração", diz a artista, acreditando que conseguirá fazê-lo "com graça". Meia hora depois, o pipi com olhos e boca -- característicos do trabalho da artista - está ser pregado à parede. É a segunda participação de Maria Imaginário, 31 anos, no Iminente, a primeira vez com tecidos. "Está a ser uma experiência!", aceita.
O festival realizou-se no Jardim Municipal de Oeiras pela primeira vez há um ano e passou por Londres já este ano (28 e 29 de julho), em versão concentrada, sempre com a arte pública em mente. "Como é que um país como Londres não tinha um festival de arte urbana?", pergunta-se Adilson. O Iminente foi o primeiro. E vai repetir-se.
Mais à frente, junto a umas chapas de metal cinzentas, com a música a tocar bem alto, o artista do grafitti vai trocando de latas de tinta compondo um retrato que é de um amigo. É Dé, o artista que assina como Youthone há quase 30 anos. O retrato prepara-se para receber luzes a meio. Pesquisas com leds que tenho feito", explica. Ao lado, há de ficar o trabalho de Mosaik, outro artista com quase três décadas de trabalho. Inicialmente faziam parte da mesma Crew, a PRM. Do outro lado, o direito vai ficar Obey. "Mas o Obey.pt", diz Dé, esclarecendo que não é Shepard Fairy, o artista que pintou recentemente em Lisboa com Vhils e cujo trabalho ainda está em exposição na Underdogs. "Este é mais antigo", ri-se Dé.
Alguns dos artistas que aqui estão têm colaborado amiúde com a Underdogs, como o Estúdio Pedrita, Bordalo II ou o coletivo Berru, que depois de ter trabalhado na pop up da galeria no Porto, onde estão sediados, foram convidados para estar em Oeiras. Cinco elementos dos cerca de 10 que compõem o grupo vieram montar a instalação de luz que se pode ver na estufa do jardim, uma selva entrecortada por luzes que se acendem à passagem das pessoas. Vêm de Belas Artes como Mariana ou de Som e Imagem como Rui Nó, que fundou o grupo com um amigo, Bernardo, quando eram estudantes na Universidade Católica do Porto O filme é outra das áreas em que o Berru tem trabalhado nos seus quase dois anos de vida. Mas há outras formações. Sérgio Coutinho, por exemplo, veio de um curso de engenharia. "Juntos fazemos tudo o que gostamos de fazer", diz Rui. "Sai melhor do que só com uma pessoa", diz, sobre o trabalho que desenvolvem.
Do cartaz do Iminente fazem parte, Miguel Januário (Mais Menos), Batida, Draw + Contra, Fábio Colaço, The Caver, Fahr, Teresa Esgaio, Kruella D' Enfer, Jorge Charrua e Felipe Pantone.