Zelensky recebe mais ajuda dos EUA após comparar invasão ao 11 de Setembro
O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, comparou esta quarta-feira a invasão russa ao ataque de Pearl Harbor, que levou os EUA a entrar na II Guerra Mundial, e ao atentado terrorista do 11 de Setembro de 2001. Citando Martin Luther King numa intervenção diante do Congresso norte-americano, voltou a pedir que os aliados criem uma zona de exclusão aérea sobre a Ucrânia. Mas só conseguiu uma "ajuda sem precedentes" do presidente Joe Biden, no valor de mil milhões de dólares em armamento.
"Eu tenho um sonho, estas palavras são conhecidas para todos vocês. Hoje posso dizer que tenho uma necessidade. Preciso de proteger os céus", afirmou Zelensky, dirigindo-se aos congressistas e senadores norte-americanos por videoconferência, passando também imagens de mísseis russos a atingir as cidades ucranianas.
A mensagem tem sido a mesma em cada intervenção, adaptada a cada país - no Parlamento britânico citou Winston Churchill e Shakespeare, no canadiano pediu para os deputados imaginarem a famosa CN Tower de Toronto a ser bombardeada. Esta quarta-feira, foi a vez de mencionar Pearl Harbor ou o 11 de Setembro, quando "inocentes foram atingidos de ataques dos céus". "O nosso país está a viver isso todos os dias", afirmou, recebendo uma ovação da parte dos presentes.
Zelensky voltou assim a pedir a criação de uma zona de exclusão aérea na Ucrânia. Mas esse pedido, tantas vezes repetido, tem esbarrado na negativa da NATO, com o próprio Biden a dizer na semana passada que uma interferência direta dos EUA ou dos Aliados poderia desencadear a "terceira Guerra Mundial". Washington não envia militares para o terreno, nem caças para garantir que os aviões de combate russos não podem bombardear civis, mas vai enviar mais armamento para ajudar Kiev.
Biden anunciou um novo pacote de mil milhões de dólares de ajuda militar para a Ucrânia - que inclui 200 milhões já entregues no fim de semana passado. O valor inclui transferências diretas de material de guerra, entre o qual 800 sistemas antiaéreos Stinger, nove mil armas antitanque, sete mil armas ligeiras, 23 milhões de munições e cem drones, além de apoio para a compra de sistemas antiaéreos de longo alcance. Em causa estará o sistema de mísseis terra-ar S-300 de fabrico russo, que podem ser enviados à Ucrânia por vários países membros da NATO.
Uma ajuda "sem precedentes", segundo Biden, que alegou que o presidente russo, Vladimir Putin, já perdeu a guerra porque conseguiu mobilizar o Ocidente contra si. "Nunca será uma vitória para Putin não importa que avanços faça no campo de batalha", disse o presidente dos EUA. "Junto com os nossos aliados e parceiros, vamos manter o curso e fazer tudo que podemos para acabar com esta guerra trágica e desnecessária", referiu.
Biden apelidou ainda Putin de "criminoso de guerra", numas declarações já condenadas por Moscovo. "Consideramos inaceitável e imperdoável semelhante retórica por parte de um chefe de Estado, cujas bombas mataram centenas de milhares de pessoas em todo o mundo", declarou o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, citado pelas agências russas.
Mais cedo, Putin tinha admitido num encontro transmitido pela televisão que a situação "não está fácil" para os russos, devido às sanções internacionais, mas que o "blitzkrieg [guerra-relâmpago] económico" falhou. O presidente anunciou medidas para responder à situação, nomeadamente o aumento de "todos os pagamentos sociais no futuro próximo".
Apesar dos problemas, o presidente russo indicou que a "operação militar especial" na Ucrânia está a decorrer conforme o planeado. "A operação está a ser realizada com sucesso, em estrita conformidade com os planos preestabelecidos", disse Putin, reiterando que tinha ordenado esta ação porque tinham sido esgotadas "todas as operações diplomáticas". Explicou ainda ter "todas as razões para acreditar" que "componentes de armas biológicas" estavam a ser desenvolvidos na Ucrânia e que não poderia deixar que o país vizinho fosse usado para "ações agressivas contra a Rússia".
Ao 21.º dia do conflito, numa altura em que continuam as negociações entre ambos os lados, o Financial Times dizia que Rússia e Ucrânia já teriam um rascunho do plano para terminar a guerra. Este incluía um cessar-fogo e a retirada das tropas russas, alegando que Kiev aceitava declarar a sua neutralidade (Peskov mencionou os exemplos da Áustria ou Suécia como uma possibilidade) e limites às suas Forças Armadas, em troca de proteção de aliados como EUA, Reino Unido ou Turquia.
Mas o negociador ucraniano, Mikhail Podolyak, apressou-se a negar esse avanço no Twitter. "O FT publicou um rascunho que representa a posição pedida pelo lado russo. Nada mais. O lado ucraniano tem as suas próprias posições. A única coisa que confirmamos nesta altura é um cessar-fogo, a retirada das tropas russas e garantias de segurança de vários países", escreveu, enumerando aquilo que tem procurado garantir nas várias rondas de diálogo. Na véspera, tinha falado de um processo "muito difícil e viscoso", alegando haver "contradições fundamentais" entre as suas posições, mas "certamente espaço para o compromisso".
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No terreno, continuam os bombardeamentos. Pelo menos cinco pessoas, incluindo três crianças, morreram num ataque contra um edifício residencial em Chernihiv, segundo os serviços de emergência ucranianos. Na mesma cidade, dez pessoas terão morrido quando estavam numa fila para comprar pão.
Em Kiev, onde está ativo um recolher obrigatório, pelo menos dois edifícios foram atingidos e duas pessoas ficaram feridas. Em Mariupol, que continua cercada pelos russos, um teatro que servia como abrigo a civis terá sido bombardeado, segundo as autoridades ucranianas, que ontem ainda não tinham indicado o número de vítimas.
susana.f.salvador@dn.pt