Ventos do Irão para uma Palma de Ouro para Farhadi

Sabe-se este sábado à noite o destino da Palma de Ouro. <em>A Hero</em>, de Asghar Farhadi, é um dos títulos na boleia do favoritismo. Cannes termina sem um título verdadeiramente consensual...
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Favoritos para a Palma de Ouro? Tantos e tão poucos... Adivinhar a Palma de Ouro é das apostas mais perigosas no mundo do cinema, sobretudo este ano com um cineasta como Spike Lee como jurado principal, Kléber Mendonça Filho, cinéfilo temperamental, e atrizes/cineastas da ala dura do "female gaze" como Maggie Gyllenhaal ou Mélanie Laurent. Nem vale tentar mas a imprensa francesa fez um somatório de Palmas pessoais de alguns críticos e o resultado aponta para A Hero, de Asghar Farhadi, uma meditação sobre a angústia da justiça no Irão dos nossos dias.

É bem verdade que há uma beleza muito sentida no filme iraniano, mas nas listas dos mais votados pela imprensa estão também Drive My Car, de Hamaguchi Ryusake e Les Olympiades, de Jacques Audiard. Não deixam de ser bons exemplos de favoritos. O primeiro é uma inovadora cruzada de contaminação teatral em cinema. O cineasta japonês refina o estilo e oferece-nos o seu melhor filme até à data, sempre sob o signo de Tchekov, enquanto que em Les Olympiades somos convidados para estar no interior do 13.º Bairro de Paris num quebra-cabeças amoroso que tem o sinal dos nossos tempos: das aplicações tipo Tinder à solidão da geração dos "millennials". Spike Lee talvez se lembre de como filmava Brooklyn nos tempos de Os Bons Amantes (1996)....

Por outro lado, há o filme que mais paixões e ódios causou: Titane, de Julia Ducournau, história sobre uma assassina em série que se funde com óleo e titânio através de uma bizarra atração de corpos. Um genial herdeiro de Crash, de David Croneneberg, que pode ser uma espécie de surpresa anunciada no palmarés, basta o júri ter coragem. Seria uma Palma de Ouro de choque!

Nas interpretações a colheita foi forte. Nas damas há quem esteja a torcer por Léa Seydoux na comédia farsa de Bruno Dumont, France, mas Valeria Bruni-Tedeschi, em La Fracture e Sophie Marceau em Tous s"est Passé Bien, de François Ozon, têm muitas hipóteses. Todavia, se Les Olympiades ficar de fora dos outros prémios, também pode acontecer uma distinção dupla para as suas atrizes: Noémie Merlant e Lucie Zhang. Quanto aos senhores, pode-se imaginar uma justa distinção para Adam Driver, anjo negro de Annette, mas é importante não deixar de fora André Dussollier como idoso em processo de eutanásia em Tous s"est Passé Bien e Simon Rex, ex-estrela porno a fazer de ex-estrela porno em Red Rocket, o simpático filme de Sean Baker.

Num festival onde as propostas de cinema quase que chocaram entre si, Cannes 2021 foi também uma safra com algumas desilusões, as mais flagrantes os casos de Bergman Island, de Mia Hansen-Love; The Story of My Wife, de Ildikó Enyedi; Flag Day, de Sean Penn e Nitram, de Justin Kurzel. Filmes que poderão ter tirado a vaga a algumas das pérolas que a secção Cannes Premiere mostrou, sendo que Tromperies, de Arnaud Desplechin e Cow, de Andrea Arnold eram dois títulos que poderiam ficar tão bem na corrida à Palma...

Aconteça o que acontecer, vamos todos confiar no senhor Spike Lee. Desta seleção a grande maioria dos filmes vai chegar aos cinemas portugueses.

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