Vêm aí revelações sobre os Serviços Secretos. Ex-diretor lança livro
Encerrar um ciclo. Foi este o desafio que lhe lançaram e que Jorge Silva Carvalho, ex-diretor dos Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED), aceitou. O objetivo é fechar um ciclo com a "minha explicação pessoal sobre as coisas que aconteceram, independentemente de ter que provar. Não sinto necessidade de provar nada, mas quero justificar perante as pessoas que me conhecem e que me consideram um profissional sério, algumas situações, para que percebam o porquê do que aconteceu", disse ao DN.
O livro, que estará nas bancas no final do mês, surge quase dois anos depois de Jorge Silva Carvalho ter sido condenado em tribunal a uma pena de quatro anos e seis meses de prisão com pena suspensa por violação do segredo de Estado, abuso de poder e ainda devassa da vida privada, por ter acedido à faturação detalhada do telefone do jornalista Nuno Simas. Em março deste ano, o Tribunal da Relação confirmou esta sentença.
"Ao Serviço de Portugal" é o título da obra que Jorge Silva Carvalho diz ter sido "o livro possível ao abrigo das minhas limitações, já que estou sujeito a segredo do Estado, tal como estava em julgamento." É o fim de um ciclo, mas "muita coisa nova acaba por ser contada." Um livro em que "se levantam alguns véus sobre os serviços, mas ainda com coisas que não posso dizer claramente", explicou ao DN.
Durante cinco meses o livro, que resulta da transcrição de longas conversas com algumas pessoas, em particular com o jornalista Luís Naves e com o editor Francisco José Viegas, foi sendo trabalhado, construído e revisto. "Pode não ser muito politicamente correto, mas é uma bela descrição" de factos, momentos, situações que marcaram a vida de Silva Carvalho antes, durante e depois de ter integrado o SIED.
"É uma visita à sua história pessoal, ao caso Ongoing, e à atividade dos serviços de informações desde os anos de 1980 até 2012, quando saiu", explica o diretor editorial da Contraponto, Francisco José Viegas. É um livro que Silva Carvalho, como fez questão de dizer ao DN, dedica aos que mais sofreram com o processo em que se viu envolvido durante quase sete anos: "os meus filhos e os meus pais".
Mas é sem dúvida um livro em que o ex-diretor do SIED quebra o silêncio e tenta explicar algumas questões que podem interessar ao público em geral: "Como se organizam os serviços de informação? Quais são os limites e o alcance do trabalho dos 'espiões portugueses'? É possível manter um serviço de inteligência sem atravessar as fronteiras da legalidade?"
A esta última pergunta a resposta de Silva Carvalho ao DN é categórica: "Não, com o nosso quadro legal. Neste momento, e face à interpretação daquilo que é feito da lei, a grande maioria das atividades dos serviços seriam consideradas ilegais. Portanto, o serviço para continuar a existir como tal ficaria reduzido a um mero gabinete de estudos e com muitos poucos meios para atuar no terreno."
Silva Carvalho, hoje empresário, diz não se sentir injustiçado, até porque, quando "assumimos funções públicas, assumimos os ónus e os encargos dessas funções, e as coisas podem correr menos bem", argumentando que "nos serviços estava a defender o Estado português". "Não era um trabalho fácil, não era um trabalho que ao final do dia pudesse ser um bom rapaz. No meu trabalho esperava-se que fizesse coisas difíceis, basicamente", acrescenta.
Quase dois anos depois da sentença, Jorge Silva Carvalho, que ficou conhecido no Caso Ongoing como o super-espião, admite: "Não me arrependo do que fiz, apenas gostaria que as pessoas percebessem que aquilo que efetivamente fiz até pode ter sido errado ou considerado como um crime mas não foi para meu ganho pessoal, para me envaidecer ou para ganhar dinheiro. Foi antes de mais porque era a melhor forma de defender o país, mesmo que tenha sido um erro. E é isso que é explicado no livro."