Uma Mulher não Chora: Um filme para enfrentar os medos

Fatih Akin regressa com <em>Uma Mulher Não Chora</em> (estreia quinta). O luto violento de uma mulher e esposa que valeu ao cineasta o Globo de Ouro para melhor filme estrangeiro
Publicado a
Atualizado a

Tínhamo-lo perdido de vista desde Soul Kitchen, amável comédia gastronómica estreada em 2009. Depois, os filmes do turco-germânico Fatih Akin deixaram de ser tão internacionais e não mais cá chegaram. Agora, tudo muda com o thriller de vingança Uma Mulher não Chora, vencedor do prémio de melhor atriz para Diane Kruger no Festival de Cannes e melhor filme estrangeiro nos recentes Globos de Ouro. Uma história sobre a perda. Kruger é uma mulher que perde o marido de ascendência turca e o seu filho depois de um atentado executado por uma fação radical de neonazis. O que fica depois do luto? Como gerir o apelo da vingança? São estas as questões que o cineasta coloca num filme de carga-choque radical.

Numa praia de Cannes, a horas de se saber o palmarés do júri presidido por Pedro Almodóvar, conta ao DN que a história do filme é sobre a necessidade de irmos à procura de justiça quando o Estado não o consegue: "mas essa não é a mensagem. Nem tudo o que vemos no filme tem de ser mensagem... Sou uma pessoa pacifista e o filme é apenas um filme. Contudo, é um filme pessoal, um dos meus filmes mais pessoais. Na situação desta mulher que perde a família, sinceramente não sei o que faria. Tenho filhos e a única coisa que posso fazer é ensinar-lhes o que é errado e o que é certo." Na base do projeto, esteve o caso do grupo terrorista alemão NSU que, em nome do nazismo, matou dez pessoas (um polícia e nove emigrantes) na Alemanha de 2000 a 2007. Akin quis fazer uma reflexão sobre os perigos do aparecimento de grupos neonazis.

"Por ser de origem turca é claro que eu poderia ser um alvo para os terroristas do movimento NSU... Isso deixou-me muito zangado! Se garanto que o filme me é muito pessoal passa também pelo facto de eu ser pai. Sou um tipo com pesadelos e com os seus medos... Este filme foi uma oportunidade para enfrentar os meus medos. O nível emocional que esta mãe passa tem muito que ver comigo. Seja como for, não dou muito espaço aos neonazis e nem quero ser político nessa questão do terrorismo", explica. As más-línguas não se cansam de acusar Uma Mulher não Chora de ser muito pró-justiça pelas próprias mãos, coisa que o cineasta refuta veementemente.

Nesta temporada dos prémios, a máquina promocional do filme nos EUA conseguiu o charme junto aos votantes dos Globos de Ouro mas não foi suficientemente forte para levar Diane Kruger à lista das cinco nomeadas para os Óscares. Apenas se houver um golpe de teatro é que pode colocar a alemã nas nomeações do próximo dia 23, mas que justo golpe de teatro seria... E Fatih Akin sempre foi um grande diretor de atores. Perguntamos-lhe se tem perceção do seu código de estilo. Fica algo encavacado: "digamos apenas que não acordo com aquela obrigação de filmar à Fatih Akin. Este é um filme de um cineasta, mas também já fiz filmes de realizador. Gosto igualmente quando me dão um argumento e eu só o tenho de filmar para contar uma história. Se apenas fizesse os filmes de cineasta ficava à espera dez anos... Tenho de ganhar a vidinha e alimentar os meus filhos! Dito isto, aprendo muito nesses filmes que faço por encomenda..." Talvez tenha razão, o anterior Tschick era um horror e este Uma Mulher não Chora um regresso aos seus melhores dias...

"Quero que este filme se posicione como uma escolha para o espectador. Se alguém vir este filme e ficar fã da opção de vingança olho por olho, não vou estar contra", confessa o realizador. Para terminar, perguntamos se um dia vai ser capaz de ir para a Turquia e fazer uma ficção inteiramente em turco? "Tenho projetos nesse sentido." Rezemos para que não seja cinema de encomenda...

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt