É a primeira vez que milita num partido? Porque aderiu ao Aliança?.Fui militante do PSD durante dez anos, até 2013. Portanto, a minha saída do PSD não coincide com a criação deste partido. Foi há cinco anos, agora senti necessidade de voltar a dar a cara e a considerar que era um bom momento para isso. Tendo em conta o projeto [do Aliança] que foi apresentado, a Declaração de Princípios que foi logo lançada, senti necessidade de nesta fase voltar à política que digo que é a primeira vez ativa, porque fui apenas militante de base. Era militante de Vila Nova de Gaia..E qual foi a razão da sua saída do PSD?.A principal razão foi a máquina. Os partidos do poder têm uma máquina muito pesada, com as portas muito fechadas a novas pessoas. E por isso nunca senti dentro do partido, tendo estado lá dez anos - dos 18 aos 28,29 -, disponibilidade para ouvir, para participar nos processos de decisão. Não era uma estrutura totalmente democrática a nível da escolha das pessoas, na forma de fazer política. E coincide com um período também de algum desencantamento com o país e com o peso que foi a aplicação do memorando da troika..A política também entra no seu percurso profissional....Sou professor universitário, dou aulas na UBI desde 2016 - Universidade da Beira Interior -, na área da ciência política, que é a minha área de formação, doutoramento na Universidade de Lisboa. E portanto há um estímulo..Já conhecia Santana Lopes quando decidiu agora militar no Aliança?.Sim. No momento em que houve disponibilidade para conhecer o projeto foi imediatamente agendada uma reunião com o presidente do partido. Isso também foi - em relação ao passado e ao período vivido no PSD - uma comparação completamente impressionante. Porque havia aqui uma porta aberta para ser ouvido..A máquina deste partido vai ser diferente?.Sinto que é completamente democrática. Ou seja, que nós falamos, ouvimos, podemos intervir, podemos apresentar os nossos pontos de vista de uma forma completamente livre. E há essa abertura de receber os militantes que estão a inscrever-se, de fazer esse contacto direto, de responder a todos a nível do envio de e-mailse de mensagens..Mas admite que, conforme a máquina for crescendo, se tornará mais complicado ter essa proximidade....Acreditamos que vamos crescer, inclusivamente nesta fase já aumentou mais do que as expectativas. Já temos muitos milhares de simpatizantes, de militantes Mas neste momento tem sido possível dar essa resposta e envolver as pessoas nos processos de decisão. Seja nas estruturas nacionais seja nas estruturas regionais e nas regiões autónomas, onde temos já comissões instaladoras a funcionar..Mas o Aliança não foi criado à imagem e semelhança do doutor Pedro Santana Lopes?.As pessoas vão sempre olhar para o Aliança como o partido de Santana Lopes. Mas o que tem transparecido da ação do próprio partido é o esforço, o trabalho que tem sido realizado para trazer para a praça pública, em termos de visibilidade, outras pessoas. É um partido de ideias, de causas, um projeto em que outras pessoas paulatinamente estão a ser apresentadas, como o cabeça-de-lista às europeias, o Dr. Paulo Sande..Se tivesse que estabelecer uma grande diferença entre o Aliança e os outros partidos do centro-direita, PSD e CDS, nomeadamente, o que distingue o Aliança?.O nosso programa de partido não é um programa eleitoral. O programa do governo será apresentado depois para as eleições legislativas, este visa pensar o país e esse é o grande objetivo. Não por ciclos eleitorais, mas pensar o país a 30 ou 40 anos, para lá de uma geração. E vamos elencar um conjunto de causas essenciais. Obviamente que na matriz do projeto estão os três valores ou os três princípios-chave: liberalismo, personalismo e solidariedade..Mas os outros partidos de centro-direita também têm este discurso....Os princípios são ligeiramente diferentes a nível do que são as prioridades de ação. Um pilar essencial da nossa ação é prometer apenas aquilo que podemos cumprir. Medidas concretas e com base em estudos prévios, pensadas pelo gabinete de estudos liderado pela doutora Rosário Águas. É fazer política... é verdade que podem considerar isto um chavão, mas é isso mesmo que o país precisa, de fazer política de verdade..Os cartazes do partido, a moção do líder faz muito apelo a um "Portugal às direitas"... O objetivo é apelar ao eleitorado de direita?.A mensagem é muito forte e muito objetiva. Um país às direitas significa um país de contas certas. Um país de valores..Mas admite que tem essa leitura também?.Tem, naturalmente. Mas quando nos posicionamos como um partido de centro-direita estamos a indicar como nos posicionamos no espectro político. Embora isso não exclua, de maneira nenhuma, o eleitorado que se posiciona ao centro ou o eleitorado que se posiciona à esquerda mas que é um eleitorado de causas. O partido assume claramente que é uma alternativa a este governo de frente de esquerda..Os eleitores identificam-se mais com causas e menos com o binómio esquerda/direita?.Essa é a minha visão do funcionamento do sistema político. E verifica-se que o eleitorado fiel a determinados partidos é cada vez menor. Nós temos hoje um eleitorado cada vez mais volátil, ou seja, um eleitorado que vota de acordo com as condições socioeconómicas, de acordo com a conjuntura nacional ou internacional ou de acordo com determinadas causas. É essa também uma nova forma de fazer política..Santana Lopes diz que quer conquistar os abstencionistas, um eleitorado complexo....Sim, há um trabalho de fundo. Atualmente, Portugal tem uma abstenção crónica, que resulta dos 40 a 60%, dependendo do ato eleitoral. Ou seja, são pessoas que estão verdadeiramente insatisfeitas, embora alguns estudos científicos identifiquem que a abstenção é uma concordância com o statu quo, com a situação. Os abstencionistas não votam porque....Acham que não vale a pena?.Estão relativamente satisfeitos com o sistema e não é necessário mudar nada e o seu voto não alteraria nada na sua satisfação em relação à democracia. Há autores que consideram inclusivamente que o nível de abstenção de 20%, 25%, 30% é um nível saudável de abstenção. No caso português, acredito que há um eleitorado que está muito insatisfeito com o sistema, que não se identifica com os partidos políticos do sistema, do arco da governabilidade, e que só será chamado a intervir se sentir esse desafio da intervenção cívica e se sentir que o sistema verdadeiramente os representa. O que Aliança vai propor é esta reforma eleitoral, reforma do sistema político eleitoral, que tem sido sistematicamente adiada, porque de facto não há um grau de representação por parte do eleitor em relação aos deputados no Parlamento. A proposta é uma proposta de transformação total, de introdução dos círculos uninominais, com um círculo nacional de compensação única, para os eleitores saberem quem é o deputado que os representa. E, portanto, isso é uma mudança significativa, com a redução do número de deputados, é aquilo que está previsto na proposta do Aliança, inclusivamente na Declaração de Princípios. Criar esse elo de ligação eu acredito que aumenta o grau de representatividade e aumenta o interesse do cidadão em participar na vida política..Santana Lopes coloca a hipótese de uma frente de direita contra a frente esquerda. E ele diz que os resultados das europeias são essenciais para convencer, de certa maneira, os outros partidos eventualmente a fazerem uma aliança pré-eleitoral. Acredita mesmo que isso é possível?.Nesta fase, e as declarações do presidente foram bastante claras, o partido irá apresentar-se às três eleições deste ano com listas próprias e, portanto, de forma autónoma. Foi equacionada durante algum tempo a possibilidade de, de acordo com os resultados das eleições europeias, uma coligação pré-eleitoral, mas dado o momento político e a conjuntura política nacional verifica-se que não é a possibilidade mais viável. E é importante também o partido conhecer o seu peso eleitoral e verificar a recetividade dos portugueses em relação às suas propostas. Portanto, o grande objetivo é criar essa frente de centro-direita, de forças que não se identificam com este governo de frente esquerda, com os 116 deputados para formar essa maioria..O Aliança podia eventualmente aliar-se ao PS para evitar que houvesse uma frente esquerda?.O Aliança está sempre pela positiva. E a positiva neste caso é o caminho que está definido pela Comissão Instaladora Nacional, que é uma coligação que faça frente a este governo..Este governo do PS é apoiado parlamentarmente pelo PCP e pelo Bloco... Se o PS não tiver maioria absoluta e precisar de um novo aliado, o Aliança estará disponível?.O Aliança estará disponível para fazer esta frente de oposição ao PS, e creio que responde à pergunta. E é esse o nosso caminho. Pela positiva, pelas ideias e com os partidos que mais se identificam dentro do nosso espectro político e partidário..O Chega, que é um partido que ainda está embrionário porque não foi aprovado pelo Tribunal Constitucional, caberá neste arco dos partidos que podem ajudar a fazer a frente de direita?.Dadas as declarações, naturalmente que não. Nós somos partidos democráticos, partidos que respeitam princípios, valores da democracia, dos direitos humanos e, portanto, não há aqui qualquer posição de proximidade em relação às declarações que foram proferidas pelo André Ventura. E, portanto, não há aqui qualquer possibilidade de incluir o Chega na frente..Qual o motivo de uma explosão de partido neste espaço político?.É o funcionamento normal de qualquer democracia. Ou seja, Portugal tinha inclusivamente uma situação ímpar, na comparação com os congéneres da União Europeia. Ou seja, tinha um centro-direita muito fixo, à volta de dois partidos e, inclusivamente, se formos à matriz, na década de 1970, do PSD ou do PS, quase nunca se identificaram como partidos da direita por questões obviamente históricas. E há aqui um processo de não identificação com os partidos neste momento. É normal e até salutar que a democracia possa permitir que grupos de cidadãos decidiam participar de forma ativa na política e apresentar um conjunto de soluções alternativas e caminhos diferentes. Eu acredito que o grande objetivo é sempre somar e não dividir..Que resultados espera o Aliança nas europeias? É o primeiro embate eleitoral....A escolha do doutor Paulo Sande foi uma escolha que demonstra também o eixo de atuação do Aliança. Escolher um independente sem experiência política mas com um grande nível de conhecimento sobre as questões europeias. Portanto, é um dos maiores especialistas em assuntos europeus em Portugal. O nosso candidato já o referiu em entrevistas anteriores que almejava a eleição de três eurodeputados como o grande objetivo. E o que é certo é que estas eleições são permeáveis a resultados diferentes daquilo que é a norma em eleições legislativas. O voto é muito mais livre, muito mais flexível..Paulo Sande sempre foi um rosto muito aliado à atual construção europeia, quando o Aliança é crítica. Não é contraditório?.A grande crítica que foi feita ou foi expressa na comunicação social era uma hipotética divisão entre um federalismo do doutor Paulo Sande e o euroceticismo ou uma atitude mais exigente do Aliança na Europa. O doutor Paulo Sande já veio esclarecer claramente que nunca foi, não é, e todos os seus artigos científicos o comprovam. E, portanto, há aqui um consenso. É necessária maior exigência da Europa, porque a Aliança tem uma matriz europeísta. Nós acreditamos na Europa, acreditamos nos valores e no património comum da União Europeia. Acreditamos é que a União Europeia tem de ser mais democrática. Que não pode ser dirigida por nenhum diretório, não pode ser um comboio a várias velocidades..Está a elaborar o programa do Aliança. Quais as grandes apostas?.O programa do Aliança será efetuado essencialmente em dez eixos principais. A questão do crescimento e da competitividade - ainda estamos a 70% da média europeia, a nível da competitividade, e bem longe dum nível que permite, precisamente, defender um Estado social tal como ele existe. É necessário crescer mais do que os 3%, mais do que a média europeia. Um segundo ponto é desonerar as famílias e as empresas a nível dos impostos. E o Estado cobra demais para aquilo que acaba por atribuir aos cidadãos. Esse é um dos pilares de atuação, nomeadamente a descida de IRC para as empresas, que é fundamental para contribuir para a inovação, para a criatividade. Temos o eixo do Serviço Nacional de Saúde. Temos a necessidade de redefinir, de repensar o SNS sem qualquer problema a nível daquilo que é o debate estéril do privado ou do público. Convém referir que mais de metade dos hospitais em Portugal atualmente já são privados. Aquilo que interessa aos portugueses é essencialmente mais e melhor saúde. Temos visto algumas parcerias público-privadas no setor da saúde com grandes índices de satisfação por parte dos utentes e que são os pilares do serviço, aqueles que acedem ao serviço. Outro eixo muito importante tem que ver com a questão do combate à corrupção e que estará na linha ou na liderança da agenda política. É um dos fatores para o não crescimento e para a falta de confiança dos cidadãos relativamente ao Estado, ao governo ou aos atores políticos. E aqui tem de haver um combate sem tréguas à corrupção. Depois o Aliança avançará em termos de dimensões programáticas com um trinómio, que é a cultura, o mar e a inovação. Nós temos de olhar o mar não só como a alma da nossa identidade, mas como uma oportunidade de desenvolvimento, de crescimento. E o Estado deve fomentar essa aposta, juntamente com os aspetos culturais, com a matriz cultural do nosso país e com a aposta nas empresas, em clusters, na nação criativa. Tal como há um conjunto de medidas, por exemplo, no setor da educação que nós defendemos, que é um serviço de educação gratuito, universal. O Estado deve apoiar realmente as pessoas que necessitam e há aqui uma questão de solidariedade entre os diferentes grupos socioeconómicos. Entre os diversos grupos que compõem a sociedade, que é muito importante fomentar. O congresso realiza-se em Évora porque o Aliança surge com o foco na coesão social e na coesão territorial..A maior parte dos rostos que vão constituir os órgãos nacionais do partido serão pessoas verdadeiramente desconhecidas da opinião pública?.É um partido que traz muita gente nova para a cena política, pessoas da sociedade civil. Pessoas que nunca tiveram qualquer experiência política ativa e que consideram ser este o momento de dar a cara e de defender um projeto para Portugal..Se tiverem sucesso eleitoral, qual é o voo para as legislativas?.O presidente já o referiu claramente, dos dois dígitos. E, portanto, será esse o caminho..Não é demasiado ambicioso?.Tenho uma perspetiva muito livre daquilo que é a democracia. O voto é livre e não é de ninguém. E portanto nós neste momento devemos é apresentar as nossas propostas e fazer que os portugueses nos possam confiar o seu voto. A partir daí tudo é possível. O voto não tem amarras.