Trump regressa aos palcos, mas os holofotes repartem-se com os seus casos

Ex-presidente iniciou uma nova fase com os olhos postos nas eleições intercalares de 2022 e nas presidenciais de 2024. A agenda coincide com uma possível acusação de fraude e uma comissão do Congresso sobre o ataque ao Capitólio.
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Donald Trump voltou a dirigir-se a uma América que o idolatra no sábado, num povoado rural do Ohio, Wellington. Milhares de pessoas enfrentaram horas no trânsito e ao calor para ouvirem o primeiro comício do ex-presidente fora de portas desde que saiu da Casa Branca.

Enquanto regressa aos palcos e a outras ações, como a que está programada hoje no Texas, de visita à fronteira, para se afirmar como o líder da oposição e provável candidato às eleições de 2024, na outra América os advogados da sua organização tentam dissuadir a justiça de avançar com uma acusação, a Câmara dos Representantes vai avançar com uma comissão para investigar a invasão ao Capitólio, e a publicação de livros confirma os tiques autoritários de Trump.

"Penso que as vacinas são o verdadeiro vírus que está a matar pessoas", disse Frank Tondo antes do comício de Trump. "Tondo e o seu amigo Joe Stasiak vestiam ambos t-shirts QAnon. Ambos acreditam que Trump é o presidente legítimo e que em breve estará de volta ao poder. Tondo disse: 'Neste momento, temos dois presidentes. Sim, Biden é o presidente das empresas falidas' ", confiou à reportagem do Washington Post.

O evento Save America foi realizado no estacionamento de um parque de diversões para apoiar a candidatura nas primárias republicanas de um antigo assessor da Casa Branca, Max Miller. Este vai tentar concorrer à Câmara dos Representantes e desta forma desalojar o atual representante, Anthony Gonzalez, que foi um dos 10 membros do Partido Republicano que votou para destituir Trump pelo seu papel de incitamento à insurreição no Capitólio, em 6 de janeiro.

Destaquedestaque"As eleições de 2020 foram fraudulentas", repete Trump. Barr, o seu procurador, disse agora que as investigações que então ordenou "eram uma treta".

Como esperado, Trump teceu elogios ao "patriota incrível" e o "grande homem" que é Miller, mas também sem surpresas passou grande parte do comício a falar sobre as eleições de 2020, ou a repetir as alegações sobre os democratas, as "elites liberais" e as ameaças que estes representam, seja por abrirem as portas à imigração, seja por não combaterem o crime ou retirarem o direito às armas. "Este foi o golpe do século e este foi o crime do século. As eleições presidenciais de 2020 foram fraudulentas", voltou a dizer à multidão que antes, na intervenção da representante Marjorie Taylor Greene, o tinha aclamado como presidente, quando a adepta de teorias da conspiração perguntou quem era o chefe de Estado.

Como que para dar substrato às alegações infundadas de Trump, antes da sua aparição um indivíduo mostra gráficos e afirma que um algoritmo foi usado para manipular as eleições. Um revés para Trump: no livro Betrayal, do jornalista Jonathan Karl, da ABC, o procurador William Barr, que até um mês depois das eleições foi fidelíssimo a Trump, inclusive em disseminar teorias de que o voto por correspondência era caminho aberto para a fraude, conta o momento da divergência com o presidente e como as investigações a fraude eleitoral que ordenou "eram uma treta", lê-se no excerto publicado na The Atlantic.

O show de Trump marca o início de uma nova fase, cinco meses depois de ter saído da Casa Branca. Trump está a planear mais aparições públicas nas próximas semanas e terá outro comício na Florida no fim de semana, este sem qualquer ligação a um candidato. Mas a sua agenda é ensombrada pela perspetiva de enfrentar acusações criminais decorrentes de uma investigação sobre os seus negócios. Na quinta-feira, o New York Times relatou que podem ser apresentadas acusações contra a Trump Organization dentro de dias. Na segunda-feira, os advogados da empresa estavam a fazer um último esforço para impedir a acusação à holding proprietária de clubes de golfe, hotéis e propriedades de luxo.

O caso foi aberto há mais de dois anos pelo procurador distrital de Manhattan Cyrus Vance e por dois membros democratas do Congresso, e centrado em alegada fraude financeira, resultado da investigação de oito anos das declarações fiscais do ex-presidente obtidas após uma longa batalha legal, e também pelo testemunho do seu ex-advogado pessoal Michael Cohen, condenado a três anos de prisão e que está a cooperar com os investigadores. Cohen disse que a empresa sobrevalorizava ou subavaliava regularmente os bens, o que constitui uma possível evasão fiscal ou fraude.

Uma frente da investigação centra-se na possível acusação ao diretor financeiro da empresa, Allen Weisselberg, de ter recebido benefícios não declarados ao fisco, como forma de pressionar este a cooperar, mas segundo o Washington Post este não se mostrou recetivo. Pelo contrário, a sua ex-cunhada disse à CNN estar pronta para testemunhar. Jennifer Weisselberg reconhece que durante anos viveu em apartamentos sem pagar um cêntimo, entre tantas outras despesas pagas quando o seu marido trabalhava para a empresa de Trump.

A ex-vice-presidente da Trump Organization Barbara Res foi cristalina: "Ele merece ir para a prisão durante muito tempo", disse à CNN. Res escreveu um livro sobre os seus anos na Trump Tower, Tower of Lies (Torre de Mentiras). Outros novos livros como Landslide, do autor de Fogo e Fúria Michael Wolff, ou Frankly, We Did Win This Election, do jornalista do Wall Street Journal Michael Bender, detalham respetivamente sobre como Trump e a sua família ignoraram os apelos dos assessores para repudiar a violência no Capitólio, ou como quis enviar tropas para as cidades em que houve protestos violentos na sequência do homicídio de George Floyd.

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