Tifo, sífilis e tuberculose. Doenças da Idade Média entre os sem-abrigo da Califórnia
As doenças infecciosas, como o tifo e a tuberculose, têm acompanhado o crescimento da população de sem-abrigo na Califórnia. No final de 2018, eram 553 mil pessoas a viver nas ruas neste estado norte-americano, refere a revista The Atlantic.
"A nossa crise de sem-abrigo está a tornar-se numa crise de saúde pública", alertou o governador da Califórnia, Gavin Newsom, durante o seu discurso sobre o estado do estado em fevereiro. Newsom referia-se à propagação de doenças como a hepatite A, no condado de San Diego, sífilis, no condado de Sonoma, e tifo, no condado de Los Angeles. "Tifo. Uma doença medieval na Califórnia. Em 2019", exclamou, na altura.
Doenças infecciosas que devastaram populações na Idade Média e que se tornaram raras com o avanço da medicina, a vacinação e a mudança nas condições de vida estão agora a ressurgir na população sem-abrigo da Califórnia. Ruas sujas, contaminadas com fezes humanas, sistema imunitário enfraquecido dos sem-abrigo e acesso limitado aos cuidados de saúde estão na origem do reaparecimento destas doenças.
Glenn Lopez, do St. John's Child & Family Center, que trata de doentes sem-abrigo no condado de Los Angeles descreve o cenário como sendo do "Terceiro Mundo", em que "as fezes humanas contaminam os locais onde as pessoas dormem e comem". "A situação de higiene é horrível", reforça. À revista, Lopez deixa um alerta: "Mesmo quem acha que está protegido contra estas infeções, não está".
Segundo os números do Departamento de Saúde Pública da Califórnia, de 1 de janeiro de 2018 a 1 de fevereiro deste ano foram registados 167 casos de tifo, uma infeção bacteriana que pode causar febre alta, dor de estômago, calafrios, em que os surtos surgem sobretudo em áreas sobrelotadas, repletas de lixo que atraem ratos, escreve a The Atlantic.
O surto de tifo neste estado começou no ano passado quando oficiais de saúde detetaram focos da doença transmitida no centro de Los Angeles e em Compton. No passado mês de fevereiro, as autoridades detetaram novos casos de tifo no centro de Los Angeles. Nove pessoas foram infetadas, seis das quais eram sem-abrigo.
"Isto é um desastre de saúde pública", considera Jeffrey Duchin, o delegado de saúde de Seattle e de King County, em Washington, onde viu infeções de pele, disenteria e "febre das trincheiras" (transmitida por piolhos), entre a população sem-abrigo.
Em Nova Iorque, onde os sem-abrigo vivem sobretudo em abrigos e não em ruas, o cenário é melhor, mas ainda assim as doenças infecciosas, como a tuberculose, ocorrem nos albergues.
Nos últimos dois anos, mais de mil pessoas foram diagnosticadas com hepatite A - também transmitida pelo contacto com fezes humanas - no sul da Califórnia. A maioria era sem-abrigo ou dependente de drogas. 21 pessoas morreram em resultado deste surto, que decorreu no período entre 2017 e 2018.
Além do precário acesso aos cuidados de saúde, a falta de casas de banho públicas também contribui para a propagação destas doenças que eram comuns na idade média, período durante o qual as pessoas viviam em condições precárias, sem acesso a água limpa e ao tratamento de esgotos.