O legado de Fernando Chui Sai-on.Fernando Chui Sai-on termina em dezembro deste ano um percurso de 20 anos no governo da Região Administrativa Especial de Macau: uma década como secretário para os Assuntos Sociais e Cultura e outra como chefe do executivo. Nascido em Macau há 62 anos, pertence a uma das três principais famílias da elite empresarial de Macau, sendo sobrinho do patriarca Chui Tak Kei, empresário do ramo da construção civil e do ramo da beneficência entre muitas outras atividades..O mandato de Chui Sai-on como líder do governo foi marcado por um estilo discreto e anos de estabilidade social e prosperidade económica à boleia de uma indústria do jogo, cujas receitas permitiram acumular excedentes orçamentais e um aumento de subsídios e de medidas de distribuição da riqueza que, ainda assim, não evitaram um aumento de desigualdades sociais, resultado de um aumento significativo do preço da habitação. Outro calcanhar de Aquiles que suscita críticas é o atraso na construção de infraestruturas-chave, como o metro ligeiro de superfície e o novo hospital das ilhas que não estará pronto antes do final do mandato..As reservas de Macau cifravam-se no final do ano passado em mais de 60 mil milhões de dólares norte-americanos. Tendo em conta o baixo rendimento das reservas, o governo anunciou a criação de um fundo de investimento no valor de cerca de um décimo do total de reservas, num mecanismo do tipo fundo soberano para aumentar a rentabilidade das reservas. No entanto, o plano foi objeto de fortes críticas, que levaram Chui a retirar a proposta no início deste mês. Analistas salientaram que foi suscitado o receio de que - à luz dos acontecimentos de Hong Kong - pudesse surgir um movimento de contestação de larga escala em Macau, semelhante ao que em 2014 levou o mesmo Chui Sai-on a recuar na proposta de lei de garantias de altos titulares de cargos públicos. O sistema político manteve-se estável apenas com uma reforma na composição da Assembleia Legislativa, que passou a contar com mais quatro deputados eleitos - dois escolhidos por sufrágio universal e outros dois por sufrágio indireto, via associações e grupos de interesse setoriais. Macau passou a ter 14 deputados eleitos pelos residentes e 12 escolhidos por associações e grupos de interesses, além de sete nomeados pelo chefe do executivo, uma fatia que se manteve inalterada. Paralelamente, o colégio de eleição do líder do governo subiu de 300 para 400 eleitores, representantes de vários grupos sociais e económicos, na maioria alinhados com o campo político favorável a Pequim..A década sob este líder do governo foi também marcada por um reforço das relações com os países de língua portuguesa, em especial Portugal. No início do mandato, foi reanimada a comissão mista entre as duas partes, passando a existir a subcomissão Língua Portuguesa e Educação. Em resultado, nos anos seguintes foram dados passos na promoção do ensino do português em Macau e no envio de estudantes de Macau para o ensino superior em Portugal, tendo atingido neste ano letivo - 2018-2019 - 370 alunos em regime de mobilidade, mais do dobro do que tinha sido registado seis anos antes..Ho Iat Seng, o senhor que se segue.É um velho conhecido da política e da vida empresarial de Macau. Tem a mesma idade de Chui Sai-on - 62 anos - mas nunca exerceu nenhum cargo executivo. Em todo o caso não falta experiência política ao único candidato a chefe do executivo de Macau, nomeadamente no campo legislativo..Pela quarta vez consecutiva há apenas um candidato. Ho Iat Seng garantiu as subscrições de 379 dos 400 membros do colégio eleitoral, não deixando margem para qualquer opositor, uma vez que cada eleitor apenas pode subscrever um candidato e são precisas 66 assinaturas válidas para avançar para o boletim de voto..A comissão eleitoral inclui membros por inerência por serem deputados ou delegados em órgãos nacionais e membros eleitos por associações representativas de vários setores e grupos de interesses da sociedade local..Ao longo de 18 anos, Ho Iat Seng foi o único representante de Macau no órgão permanente do Parlamento nacional chinês: o Comité Permanente da Assembleia Popular Nacional, tendo sucedido no cargo a Edmund Ho, que tinha sido escolhido em 1999 primeiro chefe do governo após a transferência do exercício de soberania. Pelo meio, Ho Iat Seng foi membro do órgão de consulta de Ho - o influente Conselho Executivo - entre 2004 e 2009 e deputado na Assembleia Legislativa entre 2009 e este ano, sendo presidente do hemiciclo desde 2013..Apesar de ser da elite empresarial, Ho Iat Seng não pertence ao núcleo duro da Associação Comercial de Macau, em que pontificam homens de negócios com origens na vizinha província de Guangdong, como é o caso dos dois primeiros chefes de governo, Edmund Ho e Chui Sai-on. Ho Iat Seng nasceu em Macau, mas o pai veio da província de Zhejiang no leste da China, tendo um percurso ligado ao setor manufatureiro na China continental e em Macau..Ho herdou do pai o lugar cimeiro na Associação Industrial de Macau e foi trilhando um caminho marcado por alguma discrição nos primeiros anos após a transição, ganhando maior visibilidade à medida que os anos foram avançando. Chegou a ser dado como provável sucessor de Edmundo Ho há dez anos, mas a hipótese foi afastada com a candidatura de Chui Sai-on..Ano após ano, a questão voltava. Iria Ho Iat Seng ser o senhor que se segue na cadeira do poder? Em agosto de 2016, num encontro com jornalistas a propósito do balanço do ano legislativo, ia mais longe: "Já oiço esse rumor há dez anos. Há uns anos disse que não ia ser chefe do executivo, não tenho postura nem feitio." Todavia, isso não foi suficiente para que deixasse de ser visto como candidato. Ho mudou completamente de tom no dia 13 de fevereiro deste ano, quando se pôs em campo, revelando que iria considerar "ativa e prudentemente" a possibilidade de concorrer ao cargo. Sem grande surpresa, quatro meses depois anunciava que iria mesmo avançar sob sinergias, mudanças e inovação", com o intuito de assumir "um novo papel, uma nova responsabilidade e uma nova ação". Habitação para a classe média, políticas de juventude e reforma da administração pública pontificam no discurso do candidato único às eleições deste domingo.. *Jornalista da Plataforma Media Macau