Surpreendidos? O que dizem da demissão de João Soares os colunistas ameaçados

O ministro da Cultura pediu a demissão na sequência da ameaça de umas salutares bofetadas" a Augusto M. Seabra e Vasco Pulido Valente.
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Os dois comentadores a quem o ministro da Cultura, João Soares, prometeu "bofetadas" na rede social Facebook, consideraram hoje, em declarações à agência Lusa, que a demissão do governante foi a decisão certa.

João Soares pediu hoje a demissão do Governo ao primeiro-ministro, António Costa, invocando razões de solidariedade com o executivo, decisão que foi aceite, na sequência de ameaças de agressão física aos comentadores Augusto M. Seabra e Vasco Pulido Valente, do jornal "Público".

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Contactado pela agência Lusa, Augusto M. Seabra disse ter recebido a notícia da demissão "com alguma surpresa", mas considerou que foi "a mais saudável" e "a melhor do ponto de vista ético".

Por seu turno, Vasco Pulido Valente disse à Lusa que esta decisão do ministro da Cultura "não foi uma surpresa" porque considera que João Soares "não tinha outra saída".

Para o colunista Vasco Pulido Valente, "nenhum ministro pode ouvir o que João Soares ouviu do primeiro-ministro e conservar a autoridade e respeito dos seus colegas e subordinados", disse, sobre o aviso feito aos membros do Governo de que deveriam ser contidos na forma de exprimir as suas emoções.

"Ele não tinha outra saída. Não é para mim uma surpresa", disse à Lusa Pulido Valente.

Já Augusto M. Seabra confessou ter ficado algo surpreendido. "Senti alguma surpresa, porque o Governo está em funções há pouco tempo e com alguma dificuldade em gerir a maioria de esquerda. Mas [a demissão] é uma solução saudável. Boa para o Governo do ponto de vista ético, e a ética é importante", avaliou à Lusa.

O sociólogo, colunista e programador cultural considera que João Soares "não tinha qualificações para ministro da Cultura, e demonstrou que não se sabia comportar enquanto ministro". "Ele não tinha a noção do cargo que ocupa".

Soares pediu a demissão depois do caso do post no Facebook em que prometeu umas "salutares bofetadas" aos dois colunistas do jornal Público. "Em 1999 prometi-lhe publicamente um par de bofetadas. Foi uma promessa que ainda não pude cumprir. Não me cuzei [sic] com a personagem, Augusto M. Seabra, ao longo de todos estes anos. Mas continuo a esperar ter essa sorte. Lá chegará o dia. Ele tinha, então, bolçado sobre mim umas aleivosias e calunias. Agora volta a bolçar, no "Publico" [sic]. É estória de "tempo velho" na cultura."

Citando "uma amiga" não nomeável, Soares partiu para o insulto: "Vale o que vale, isto é: nada vale, pois o combustível que o faz escrever é o azedume, o álcool e a consequente degradação cerebral. Eis o verdadeiro vampiro, pois alimenta-se do trabalho (para ele sempre mau) dos outros."

A rematar, João Soares escreve: "Estou a ver que tenho de o procurar, a ele e já agora ao Vasco Pulido Valente, para as salutares bofetadas. Só lhes podem fazer bem. A mim também".

Ontem, os visados reagiram. Contactado pela Lusa, Vasco Pulido Valente disse apenas uma frase: "Cá fico à espera das bofetadas". Já Augusto M. Seabra considerou "inqualificável" a "ameaça de agressão física do ministro da Cultura João Soares". Para este colunista, a reação de João Soares "atenta contra a liberdade de expressão e os direitos constitucionais dos cidadãos".

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Já durante a noite de ontem, o primeiro-ministro, António Costa, deu uma violenta reprimenda ao ministro da Cultura: "Já recordei aos membros do Governo que, enquanto membros do Governo, nem à mesa do café podem deixar de se lembrar que são membros do Governo".

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Quase de seguida, o ministro fazia chegar um comunicado à agência Lusa, onde se retratava pela mensagem que colocou no Facebook. "A minha intenção não foi ofender. Se ofendi alguém peço desculpa". Na mesma nota, João Soares dizia que reagiu a um "ataque pessoal insultuoso, com uma figura de estilo de tradições queirosianas".

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Hoje, menos de cinco meses depois da tomada de posse, o governante demitiu-se do cargo, por solidariedade para com o governo e António Costa, mas também por razões que têm a ver com o respeito que lhe merecem os valores da liberdade. "Não aceito prescindir do direito à expressão da opinião e palavra", disse.

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