Silva Pereira diz que Parlamento Europeu é hoje o único que representa os britânicos

Parlamento Europeu aprovou - com 544 votos a favor, 126 contra e 38 abstenções - resolução que reafirma o apoio à posição da UE sobre o Brexit, a exatamente um mês do Conselho Europeu agendado para os dias 17 e 18 de outubro, no qual serão decididos os novos passos relativamente ao Brexit.
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Os eurodeputados questionaram esta quarta-feira a "seriedade" de Boris Johnson na reta final de negociações até à data prevista para a saída do Reino Unido da UE. Durante o debate na sessão plenária, em que o novo Parlamento Europeu, eleito em maio, aprovou a primeira resolução sobre o Brexit.

No texto, os eleitos europeus reafirmam total apoio à posição da União Europeia, ou seja, recusam-se a aprovar qualquer acordo de saída, que não inclua o mecanismo de salvaguarda, também designado como backstop para a Irlanda. Esta solução é até agora o braço-de-ferro que impede uma saída negociada.

Mas, até hoje, o novo governo britânico, liderado pelo eurocético Boris Johnson ainda não apresentou uma solução alternativa que seja "legalmente operacional", e capaz de "responder com precisão a cada um dos problemas, para evitar cada um dos riscos que o Brexit cria", como lamentou esta quarta-feira o negociador principal do lado europeu.

Boris Johnson tem insistido que vai retirar o Reino Unido da União Europeia a 31 de outubro, mesmo que isso implique "uma saída sem acordo", como afirmou hoje, o presidente da Comissão, Jean-Claude Juncker, enquanto relatava alguns detalhes do almoço, na segunda-feira, no Luxemburgo. Juncker disse também que o controverso primeiro-ministro também lhe manifestou a intenção de procurar um acordo, embora não apresente "propostas funcionais".

Pedro Silva Pereira, eurodeputado socialista e membro do grupo diretor do Parlamento Europeu sobre o Brexit, considera até que "se o Sr. Johnson estivesse realmente a falar a sério sobre a disposição de chegar a um acordo nos próximos dias, teria feito um gesto muito simples" que era o de "apresentar uma proposta por escrito, com acordos alternativos viáveis e legalmente operacionais, mas falhou nesse aspeto".

"Estamos aqui para discutir o Brexit de forma democrática, livre e aberta, como qualquer parlamento deveria ser capaz de fazer num momento tão crucial", frisou Silva Pereira, deixando subentendida a crítica ao pedido de suspensão dos trabalhos da Câmara dos Comuns. "De facto, este Parlamento Europeu é o único Parlamento plenamente operacional que representa hoje os cidadãos britânicos", acrescentou.

Responsabilidade do Reino Unido

Assim, o Parlamento considerou, na mesma resolução, que uma saída abrupta será da "inteira responsabilidade do governo britânico", já que nem está na disposição de aceitar a extensão do prazo para a saída, embora esta não encontrasse entraves em ser aprovada pelo Parlamento Europeu, desde que "devidamente justificada".

O socialista Silva Pereira sugere que a extensão pudesse ser utilizada para "o Reino Unido encontrar uma solução política e, quando chegar a hora, devolver o controlo às pessoas, para que as pessoas possam ter uma palavra final sobre o Brexit".

De acordo com o texto aprovado, o Parlamento Europeu disponibiliza-se para apoiar uma nova prorrogação do prazo do Brexit, desde que perante a "existência de motivos que o justifiquem", como evitar uma saída sem acordo, realizar uma eleição geral ou um referendo, revogar o Artigo 50.º ou aprovar um acordo de saída".

"Queremos tornar-lhe a vida mais fácil"

O eurodeputado social-democrata Paulo Rangel lamentou a eventualidade de "algum líder, - político europeu ou líder [de um Estado] - poder não ter respeitado, em alguma ocasião, as posições ou instituições britânicas", mas pediu apelou a Boris Johnson que reconsidere, lembrando-lhe que, na resolução hoje aprovada, o Parlamento Europeu está a oferecer a possibilidade de prolongar o Brexit, para dar mais tempo para que haja um acordo.

"Por favor leia os nossos lábios: nós estamos abertos a considerar as suas propostas, se você as apresentar, estamos abertos a uma extensão, se ela for justificada", solicitou Paulo Rangel, informando Boris Johnson que "pode acreditar" nos eurodeputados. "Queremos tornar-lhe a vida mais fácil", atirou Rangel, avisando que espera "reciprocidade".

Hulk e Harry Potter

Num tom ironicamente crítico, Paulo Rangel considerou "lamentável" que o primeiro-ministro britânico "tenha decidido virar-se para os super-heróis americanos", referindo-se as observações de Boris Johnson numa entrevista ao jornal Daily Mail, na qual comparou o Reino Unido, à força da figura de banda desenhada e de animação da Marvel, O Incrível Hulk.

"Quanto mais Hulk fica enraivecido, mais forte o Hulk se torna, e acaba sempre por escapar, mesmo que pareça bem amarrado, e é esse o caso deste país, há-de sair a 31 de outubro e nós vamos garantir que isso acontece", disse Johnson.

Num a reação quase imediata, na rede social Twitter, o ator norte-americano, Mark Ruffalo, que chegou a interpretar a personagem de Hulk num dos filmes do gigante verde, lamentou que Boris Johnson se tenha esquecido que "o Hulk só luta pelo bem da comunidade", além de ser "forte e louco e também poder ser burro e destrutivo".

"O Hulk funciona melhor quando está em uníssono com uma equipa, e é um desastre quando está sozinho", ironizou o ator.

Esta manhã, o eurodeputado social-democrata lembrou a Boris Johnson que pode encontrar "melhores fontes de inspiração na literatura britânica".

"Senhor Johnson, você acredita realmente que o que nós precisamos, aqui e agora, é da força de O Incrível Hulk? As competências do "very British", - muito mais inteligente e mágico -, Harry Potter não o serviriam melhor, senhor Johnson?", ironizou Rangel, pedindo ao primeiro-ministro britânico, "por favor, esqueça o Hulk americano".

Novo comissário?

No texto aprovado hoje lê-se ainda que o aval do Parlamento implica que "qualquer prorrogação" não afete negativamente "o trabalho e o funcionamento das instituições europeias", sem precisar se tal pressupõe a nomeação de comissário britânico.

O Parlamento Europeu avisa que, um não acordo, limita a abertura de novas negociações, entre a União Europeia e o Reino Unido, que ficam dependentes do país "respeitar as suas obrigações e os compromissos assumidos em matéria de direitos dos cidadãos, bem como no que diz respeito ao acordo financeiro e ao Acordo de Sexta-Feira Santa".

Cidadãos

O documento que os eurodeputados aprovaram faz sérias críticas à forma como os direitos dos cidadãos estão a ser geridos nesta fase, salientando que é nesta matéria que reside "primeira prioridade do Parlamento".

"O Parlamento Europeu reafirma que a salvaguarda dos direitos e das escolhas de vida dos cidadãos da UE residentes no Reino Unido e dos cidadãos britânicos residentes na UE27, incluindo os seus direitos sociais, continua a ser a sua primeira prioridade", refere a instituição num comunicado divulgado em Bruxelas, considerando que as declarações que põe em causa a vida das pessoas, "têm gerado uma incerteza completamente inútil para os cidadãos da UE residentes no Reino Unido".

Ainda na semana passada, numa nota enviada ao DN, o governo britânico, através do ministério do Interior garantiu que "mais de 1,5 milhões de pessoas já estão inscritas no Sistema de Resolução da UE", e segundo "as estatísticas mais recentes, havia quase 300 mil pedidos de inscrição só no mês de agosto".

Porém, os deputados manifestaram hoje preocupações, com a "aplicação do regime de residência permanente do Reino Unido e com os elevados níveis de requerentes - que, de acordo com os dados oficiais mais recentes, atinge os 42% -, aos quais só é concedido o estatuto de residência temporária".

O Parlamento considera que o regime de residência permanente do Reino Unido pode ser mais eficaz "se o país optar por um procedimento administrativo de caráter declaratório, que imponha o ónus da prova às autoridades britânicas caso a declaração seja contestada".

Maioria

A resolução - aprovada hoje com 544 eurodeputados, a oposição de 126 e com 38 abstenções - reafirma o apoio do novo Parlamento à posição da UE sobre o Brexit, a exatamente um mês do Conselho Europeu, agendada para os dias 17 e 18 de outubro, serão decididos os novos passos relativamente ao Brexit.

Numa cimeira extraordinária realizada em abril, os líderes europeus concordaram com uma primeira extensão da data da saída, até 31 de outubro, a qual foi solicitada pela então primeira-ministra Theresa May, depois de sucessivos fracassos na aprovação do acordo de saída, da qual depende uma retirada ordenada.

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