República Popular da China: as lutas que continuam 70 anos depois
Neste dia 1 de outubro os olhos do mundo voltam-se para Pequim, onde decorrem as cerimónias comemorativas do 70.º aniversário do estabelecimento da República Popular da China (RPC). Ao assinalar 70 anos, a RPC ultrapassa os 69 anos de existência da União Soviética enquanto estado e aproxima-se dos 73 anos sobre a Revolução Bolchevique de 1917. No menu das comemorações, o prato forte será um muito aguardada desfile militar, a par das palavras do presidente Xi Jinping e do fogo-de-artifício.
Wang Xiaohui, vice-diretor do departamento de publicidade do Partido Comunista da China (PPC), anunciou que mais de cem mil cidadãos vão participar num desfile comemorativo, ao passo que 30 mil individualidades foram convidadas para testemunhar a parada militar, entre as quais estarão "1500 trabalhadores e funcionários públicos-modelo".
As autoridades prometem uma parada militar sem par, de maior escala do que as que assinalaram o 50.º e o 60.º aniversários da RPC. Responsáveis militares referem que o momento solene dará a conhecer os resultados da China ao nível do fortalecimento das capacidades de defesa nacional e das reformas operadas nas Forças Armadas.
Sob a liderança de Xi Jinping, foram levadas a cabo mudanças que passaram pela redução de sete para cinco comandos militares, pela redução do número de efetivos para dois milhões e por um processo de modernização tecnológica que aproxima o Exército Popular de Libertação (EPL) a uma força pronta para ações de combate.
No desfile militar, antecipam os especialistas, as atenções deverão estar centradas nos 33 esquadrões, nos mísseis nucleares estratégicos, no míssil balístico intercontinental DF-41 ou no míssil hipersónico DF-17. A parada deste 1 de outubro acontece três meses após o novo Livro Branco de Defesa da China sublinhar o objetivo de "manter a segurança estratégica nacional, através do reforço da capacidade de dissuasão de modo a que outros países não utilizem ou ameacem utilizar armas nucleares contra a China".
Segundo a agência noticiosa chinesa Xinhua, as autoridades chinesas salientam que esta demonstração "não tem como alvo qualquer outro país ou situações específicas".
As celebrações coincidem, porém, com um período de tensões e desafios, tanto a nível interno como a nível externo. À "guerra comercial" lançada pela administração Trump no ano passado juntou-se a crise que se alastra pelas ruas de Hong Kong desde junho. No início deste mês, Xi Jinping proferiu um discurso perante jovens quadros da Escola Central do PCC, em que a tónica incidiu sobre as "lutas" que o PCC e o país têm pela frente no processo de "grande rejuvenescimento nacional" até 2049, ano do centenário da RPC.
Uma mensagem-chave dizia respeito à determinação de Pequim em não fazer concessões sobre questões-chave ou alterar o sistema de governação do país, embora o despacho da Xinhua não aluda à disputa comercial internacional ou à rivalidade com países ocidentais. Foi, no entanto, nesse contexto que as palavras do líder foram entendidas.
"Relativamente àqueles riscos e desafios que colocam em causa a liderança do Partido Comunista e o sistema socialista da China; no que diz respeito aos que colocam em perigo soberania, segurança e interesses de desenvolvimento da China, face aos que minam os interesses e princípios-chave da China; e aos que impedem a concretização do grande rejuvenescimento nacional da China, iremos levar a cabo uma luta determinada enquanto eles perdurarem. E temos de vencer a luta", afirmou Xi.
No mesmo tom foi escrito um editorial do jornal em língua inglesa Global Times - do grupo do Diário do Povo -, admitindo que a nação enfrenta testes resultantes da guerra comercial lançada pelos Estados Unidos, que permanece sem solução à vista, e pelos "inesperados tumultos em Hong Kong".
O jornal acrescenta que "não faltam forças estrangeiras que subestimam a determinação da China" e que estão convencidas de que o país enfrenta tempos duros por altura das celebrações do 70.º aniversário do Dia Nacional deste ano. Essas forças, sublinha o editorial, não percebem que incidentes, mesmo sérios, "são problemas menores em comparação com a história da RPC". A mensagem é resumida no final do texto: "Quanto mais difíceis são os desafios, mais forte é a tenacidade da China." Em todo o caso, o espírito que se pretende na festa de 1 de outubro é de "confiança, alegria e racionalidade", titula o jornal.
A Revolta no Tibete em 1959, a repressão sobre estudantes na Praça de Tiananmen ou a transferência de Macau das mãos dos portugueses para os chineses, passando pelo encontro entre os líderes da China e de Taiwan e a onda de protestos em Hong Kong.
1 de outubro de 1949
Mao Tsé-tung proclama o estabelecimento da República Popular da China (RPC) sob a liderança do Partido Comunista da China (PCC).
1958
É lançado o Grande Salto para Frente, plano de coletivização da agricultura e industrialização, resultando em fome e morte de milhões de pessoas.
1959
Revolta no Tibete contra as autoridades chinesas é suprimida pelo Exército Popular de Libertação.
1966-1976
Período da Revolução Cultural. Mao Tsé-tung lança campanha que resulta em grande instabilidade social e económica.
1972
Presidente norte-americano Richard Nixon encontra-se com Mao Tsé-tung em Pequim num movimento que altera o xadrez geopolítico internacional.
1976
Mao Tsé-tung morre e o gangue dos quatro, liderado pela esposa de Mao, Jiang Qing, é preso e julgado por crimes contra o Estado.
1978
Deng Xiaoping toma as rédeas do PCC e lança o processo de reformas e abertura que alavancaria o ritmo acelerado de crescimento económico e transformação tecnológica da China.
1984
China e Reino Unido assinam a Declaração Conjunta sobre a Questão de Hong Kong.
1987
China e Portugal assinam a Declaração Conjunta sobre a Questão de Macau.
Junho de 1989
Repressão sobre estudantes na Praça de Tiananmen leva à morte de centenas ou milhares de pessoas. Jiang Zemin substitui Zhan Zhiyang como secretário-geral do PCC.
1 de julho de 1997
Transferência da soberania de Hong Kong, que se torna a primeira região administrativa especial da China, após cerca de 150 anos de domínio britânico.
20 de dezembro de 1999
Transferência de Macau ao fim de mais de quatro séculos de presença portuguesa.
2001
China adere à Organização Mundial do Comércio.
2002
Hu Jintao ascende à liderança do PCC, passando também a ocupar o cargo de presidente da RPC no ano seguinte.
2003
Surto de pneumonia atípica abala a China continental e Hong Kong na primeira metade do ano.
Julho de 2003
Centenas de milhares de pessoas protestam contra legislação do artigo 23 - antissubversão - da Lei Básica em Hong Kong. Autoridades retiram proposta de lei.
Outubro de 2003
Yang Liwei torna-se o primeiro chinês no espaço.
Maio de 2008
Forte abalo sísmico atinge a província de Sichuan, provocando a morte a dezenas de milhares de pessoas.
Agosto de 2008
Pequim acolhe Jogos Olímpicos
Julho de 2009
Revolta violenta de uígures em Xinjiang resulta na morte de cerca de 200 pessoas.
2011
China torna-se a segunda maior economia do mundo, atrás dos Estados Unidos.
Novembro de 2012
Vice-presidente Xi Jinping assume cargo de secretário-geral do PCC. Cinco meses depois torna-se presidente da RPC.
2014
Movimento Occupy protesta em Hong Kong contra proposta limitada de sufrágio universal apresentada por Pequim. Ocupação dura 79 dias.
2015
PCC anuncia fim da política de filho único em vigor há mais de três décadas.
Novembro de 2015
Presidente Xi Jinping encontra-se com a presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen, no primeiro encontro entre líderes dos dois lados do estreito desde 1949.
Março de 2018
Assembleia Popular Nacional aprova remoção de limite de mandatos para o cargo de presidente da RPC.
Abril de 2018
Estados Unidos anunciam tarifas sobre cerca de 1300 produtos chineses, iniciando a chamada "guerra comercial" com a China.
2019
Protestos em massa contra a lei de extradição assolam Hong Kong. Confrontos entre polícia e manifestantes generalizam-se.