Preparado para "pequena guerra". Quem é o "Rambo belga" que está há 15 dias em fuga?
Jürgen Conings foi apelidado pelos media de "Rambo belga", mas as semelhanças com a personagem interpretada por Sylvester Stallone ficam-se pelo facto de ser um militar, bem treinado na arte de sobrevivência, e de ser alvo de uma caça ao homem. De resto os seus alvos não são polícias corruptos ou cartéis de droga como no cinema, mas o principal virologista da Bélgica, responsável pela resposta da saúde pública contra a covid-19, que já está sob proteção policial junto com a família. Há 15 dias que o antigo atirador furtivo escapa às autoridades.
Conings tem 46 anos e é de Dilsen-Stokkem, próximo da fronteira com os Países Baixos. Estava destacado na caserna de Leopoldsburg onde dava formação, tendo antes passado pela base de Peutie e sido um sniper com missões na ex-Jugoslávia, Bósnia, Kosovo, Líbano, Iraque e Afeganistão. A caça ao homem começou a 18 de maio, depois de ter alegadamente assaltado um paiol. Na sua posse terá um lança-rockets, uma metralhadora e uma pistola, além de munições para uma "pequena guerra".
O seu carro foi encontrado logo no dia 18 perto do Parque Nacional de Hoge Kempen, de 62 quilómetros quadrados, em Limburg, que foi fechado e uma grande área passada a pente fino. No dia 21 terá sido encontrado o local onde terá acampado, mas há também teorias de que pode ter-se tratado de uma armadilha. Buscas foram feitas em várias habitações. As autoridades alemãs, neerlandesas e luxemburguesas estão atentas, caso tente cruzar a fronteira, tendo um alerta vermelho já sido enviado pela Interpol, com a acusação de que "ameaça com um atentado terrorista contra pessoas e regimes".
Conings estava na lista de "extremistas potencialmente violentos", expressão que designa alguém com pontos de vista extremistas que tem a intenção de usar a violência, mas ainda não empreendeu passos concretos nesse sentido. Já teria sido disciplinado pelo Ministério da Defesa por causa das suas posições radicais. Ouvem-se vozes críticas que questionam como é que alguém com este perfil podia ter acesso a um paiol - incluindo do próprio primeiro-ministro, Alexander De Croo, que considerou tal "inaceitável". Desde então, outros onze soldados que estão a ser vigiados pelas posições de extrema-direita deixaram de ter acesso a armas ou informação sensível.
Antes de desaparecer, Conings deixou duas cartas. Uma à namorada a dizer que planeava "juntar-se à resistência" e que "podia não sobreviver". Outra, destinada à polícia, onde ameaçava o virologista Marc Van Ranst, responsável pela implementação de várias das medidas de confinamento para lutar contra a covid-19, entretanto colocado sob proteção policial junto com a família. "Não consigo viver com as mentiras das pessoas que decidem como devemos viver", escreveu. "A chamada elite política e agora também os virologistas decidem como eu e tu devemos viver. Eles semeiam o ódio e a frustração, pior do que já era. E ninguém se revolta contra isso. Se dizes algo, serás punido", acrescentou.
"Pessoas radicalizadas de movimentos extremistas, estejam ou não equipados com lança-rockets, não vão determinar a minha vida", disse Van Ranst, que acusou o partido de extrema-direita flamengo Vlaams Belang de "criar ativamente uma atmosfera contra os virologistas". O trabalho do especialista tem sido contestado por pessoas que negam a necessidade de distanciamento físico e recusam utilizar equipamentos de proteção individual, como as máscaras.
Segundo os media, Van Ranst não será contudo o único a ter tido direito a um reforço da segurança. Na lista está também por exemplo, a ministra da Defesa, Ludivine Dedonder. Proteção extra foi também colocada em torno de várias mesquitas na região, tendo algumas decidido fechas as portas como medida de precaução depois de Conings ter desaparecido.
Uma página de apoio a Conings no Facebook chegou a ater mais de 50 mil membros, antes de ser fechada, tendo havido manifestações de apoio com pouco mais de cem pessoas e apelos para que ele fosse auxiliado na fuga. "Apoiar este homem é apoiar um homem que ameaça ferir e matar pessoas inocentes. É lamentável que alguns soldados ou ex-militares tenham demonstrado o seu apoio. Eles prejudicam a reputação e a honra dos 25 mil homens e mulheres que fazem parte da Defesa", afirmou a ministra Dedonder.
Os "fãs", que veem Conings como um "combatentes da resistência" ou um "herói", questionam a disparidade de meios usados nesta busca - envolve mais de 350 polícias e militares - em comparação com os responsáveis dos atentados terroristas de Paris e Bruxelas em 2015 e 2016. Apesar dos meios usados, Conings continua sem aparecer, tendo alegadamente levantado três mil euros antes de desaparecer. As autoridades defendem que o objetivo é apanhá-lo com vida, tendo feito apelos para que contacte alguém, mas alertam que atuarão de forma apropriada e, se necessário, em autodefesa.