Postais de Natal de todo o Iraque trazem alegria à minoria cristã
Não era o Pai Natal num trenó, mas quase: pouco antes do anoitecer da véspera de Natal, um autocarro cheio de voluntários entrou na cidade cristã iraquiana de Qaraqosh para entregar alegria natalícia.
Sob um céu rosado, desembarcaram do autocarro fretado com caixas de cartão cheias de postais de Natal, contendo mensagens manuscritas de todo o Iraque, país de maioria muçulmana.
"Uma saudação especial aos nossos irmãos cristãos", lia-se num postal, assinado no dia anterior em Bassorá, cidade portuária do sul esmagadoramente muçulmana.
A pé, membros da iniciativa Tahawer (Diálogo) do Iraque e outros voluntários entregaram cerca de 1400 postais em toda a cidade do norte, que foi devastada pelo domínio jihadista após o grupo terrorista Estado Islâmico ter avançado para leste através das planícies de Nínive em 2014.
"É uma bela iniciativa", disse Rand Khaled à AFP, depois de receber um postal de Natal à porta da Igreja Católica Siríaca da Imaculada Conceição, em Qaraqosh.
"Precisamos de iniciativas como esta de vez em quando, porque as pessoas que não conhecem estas áreas devem absolutamente conhecê-las", disse Khaled, vestida com a sua melhor roupa de véspera de Natal, com um casaco cor de chocolate chique que a protegia do frio.
Os cristãos iraquianos são hoje cerca de 400 mil, contra cerca de 1,5 milhões antes da invasão liderada pelos EUA, que derrubou o ditador Saddam Hussein em 2003. Uma minoria minúscula num país de 40 milhões de pessoas, a maioria das quais são muçulmanos xiitas.
As cartas vieram de todo o Iraque: da capital Bagdade e da cidade xiita de Najaf, da província árabe maioritariamente sunita de Saladino, a oeste, e da cidade curda de Dohuk, no extremo norte. Foram embalados em dezenas de caixas e transportadas até 950 quilómetros de distância através de postos de controlo militares antes de chegarem a Qaraqosh.
"Não sei como descrever isto", disse Nishwan Mohammad, gestor do programa de Tahawer. "As pessoas ficaram extasiadas - nunca esperaram que alguém as visitasse, muito menos que lhes trouxessem cartas de todo o Iraque", disse à AFP.
Além das mensagens manuscritas, cada carta tinha um símbolo especial desenhado à mão da província de onde foi enviada.
As de Bassorá - assinadas por xeques, estudantes universitários e até peixeiros - apresentavam a nova emblemática ponte da cidade portuária sobre o rio Xatalárabe com o Pai Natal e as suas renas a voar por cima.
Os de Bagdade mostraram parte do muito admirado Monumento Tahrir (Liberdade) da capital. E as cartas de Saladino tinham uma imagem da Grande Mesquita de Samarra, que foi concebida para se parecer com o antigo zigurate mesopotâmico - mas também se assemelha aproximadamente a uma árvore de Natal.
Farmacêuticos, alfaiates, um proprietário de loja de roupas de cama e um vendedor de telemóveis estavam entre os signatários.
Desde que os jihadistas do Estado Islâmico foram expulsos de Qaraqosh em 2016, a cidade começou lentamente a reconstruir-se graças ao financiamento de organizações internacionais e às poupanças dos seus próprios residentes.
No entanto, recebe poucos visitantes, razão pela qual a entrega da véspera de Natal foi tão especial. "Após a guerra que teve lugar nesta província, houve uma espécie de distanciamento entre as diferentes comunidades", disse Imad al-Sayer, um ativista da cidade vizinha de Mossul e que ajudou a distribuir os postais.
"Estamos a tomar a iniciativa. Se Deus quiser, estas cartas serão mensagens construtivas que trarão mudanças positivas para as comunidades desta província".
O Papa Francisco tem agendada uma viagem ao Iraque em março, na qual irá visitar Qaraqosh.