Numa altura em que os Estados Unidos tentam de alguma forma amenizar a fúria francesa expressa pelo ministro Jean-Yves Le Drian sobre a "unilateral, brutal e imprevisível" decisão de formar um pacto australo-anglo-americano (AUKUS) de segurança para a região do Indo-Pacífico, e o Reino Unido se mantém à ilharga, a Austrália insistiu no argumento de que já tinha avisado Paris..O primeiro-ministro australiano, Scott Morrison, voltou a dizer que o governo francês sabia que Camberra tinha "sérias e profundas reservas" sobre os submarinos franceses antes de o acordo de compra ter sido preterido face ao acordo trilateral que prevê a aquisição de oito submergíveis de propulsão nuclear aos Estados Unidos. Morrison disse ter compreendido a "desilusão" do governo francês, mas acrescentou que tinha levantado os problemas do acordo "há alguns meses", tal como outros ministros do governo australiano..AUKUS, o acordo que irrita Bruxelas, Paris e Pequim."Penso que teriam todas as razões para saber que tínhamos reservas profundas e sérias de que as capacidades do submarino da classe Attack não eram do nosso interesse estratégico e deixámos claro que tomaríamos uma decisão baseada no nosso interesse estratégico nacional", disse numa conferência de imprensa em Sydney..Scott Morrison disse que teria sido "negligente" avançar com o contrato com o Naval Group francês, tendo em conta as opiniões dos serviços secretos e da Defesa da Austrália de que tal aquisição não serviria os interesses estratégicos. Os 12 submarinos franceses, de propulsão diesel e elétrica, não apresentam a mesma capacidade de autonomia e de dissimulação que os nucleares. "Não lamento a decisão de colocar o interesse nacional da Austrália em primeiro lugar. Nunca me arrependerei", concluiu Morrison..França digere ondas de choque do AUKUS.O "contrato do século", de um valor de 30 mil milhões e entretanto corrigido para mais de 50 mil milhões de euros, foi assinado em 2016, era então presidente francês François Hollande e o ministro da Defesa era o atual chefe da diplomacia, Jean-Yves Le Drian, que no sábado voltou a martelar os aliados pelas "mentiras, duplicidade e desprezo" e explicou que deixou os britânicos de fora das críticas por já se saber do seu "permanente oportunismo" e porque são "a quinta roda do carro"..O ministro da Defesa australiano, Peter Dutton, reiterou que o seu governo tinha sido "franco, aberto e honesto" com a França sobre as suas preocupações com o acordo, que estava sobreorçamentado e atrasado. A homóloga francesa, Florence Parly, rejeitou de imediato as "declarações incorretas" de Dutton. Ainda segundo o ministro australiano, Camberra não estava em condições de trocar os submarinos a diesel pelos franceses movidos a energia nuclear devido às operações de manutenção que devem ser realizadas de 10 em 10 anos, que incluem o reabastecimento, o que não será o caso dos submarinos norte-americanos..Por parte de Washington houve mais um sinal de querer colar os cacos: depois de na véspera se saber que os chefes da diplomacia francesa e norte-americana irão reunir-se em Nova Iorque, Joe Biden solicitou uma conversa com Emmanuel Macron. O porta-voz do Executivo francês disse que o presidente irá pedir "explicações" sobre o que "parece ser uma grande quebra de confiança"..cesar.avo@dn.pt