Perdoem-me aqueles que já visitaram o Grand Canyon, mas aqui no deserto de Tabernas, no sul de Espanha, parece mesmo que estamos no Arizona ou no Texas. E se a comparação com o verdadeiro Faroeste, o dos Estados Unidos, será sempre exagerada, as semelhanças de paisagem são mais do que suficientes para Hollywood ter por aqui passado há umas décadas, realizando filmes como O Bom, o Mau e o Vilão. E desafio quem viu esse clássico no cinema e outros a dizer se na altura percebeu se as personagens que falavam espanhol com os cowboys eram mexicanos ou andaluzes..Avisto ao longe o cartaz a anunciar Texas Hollywood. É um dos três locais no deserto de Tabernas que funciona como parque temático, recriando o ambiente dos filmes de cowboys a partir do que restou dos estúdios, minicidades onde há de tudo, do saloon ao banco, da loja de ferragens ao barbeiro, até igrejas. Os outros dois chamam-se Oasys Mini Hollywood e Western Leone, este último uma verdadeira homenagem ao italiano Sergio Leone, que longe dos míticos estúdios da Califórnia fez fama com os spaghetti westerns, como O Bom, o Mau e o Vilão, que contava com Clint Eastwood, ou Era Uma Vez no Oeste, com Henry Fonda e Charles Bronson..O terreno é mesmo inóspito, e imagino como será no verão. Estas terras amareladas em volta da vila de Tabernas, na província de Almeria, são o único ponto da Europa classificado como deserto. E para se chegar a Texas Hollywood há que sair da estrada e fazer ainda um ou dois quilómetros em terra..À chegada, depois de se pagar entradas que dão para o dia todo (adultos 19,40 euros, adolescentes 15,90, crianças 9,90) e permitem assistir aos vários espetáculos, é o momento da descoberta e do ficar maravilhado. Cavalos a relinchar, dentro de uma cerca, dão som ambiente. E o forte de madeira, a imitar os da cavalaria americana, é cenário obrigatório para as primeiras selfies. Nem é preciso fechar os olhos para imaginar quando por ali se filmava falsos índios, das tribos sioux ou apache, a lançar flechas contra os falsos soldados americanos vestidos de azul que se escondiam atrás da paliçada. A bandeira com as estrelas e as listas continua a ondular no alto de um mastro mesmo no coração do forte..Há uns estranhos destroços nas imediações da cidade do Faroeste (na realidade duas, uma do Oeste Americano, outra mexicana). Talvez de algum dos filmes aqui feitos e que fugiam à temática dos índios e dos cowboys. Um dos Indiana Jones teve aqui filmagens, o terceiro, em que Sean Connery faz de pai de Harrison Ford. Não admira que nas terras em redor corram muitos boatos sobre as estrelas de Hollywood quando passavam temporadas neste recanto espanhol. Dou só um exemplo: um dos andaluzes que fazem de cowboy nos espetáculos para turistas reivindica ser filho de Henry Fonda, um famoso ator americano. E quem vê a foto de José Novo, trajado a preceito, e a compara com Fonda na cena de um filme percebe porque até o El Mundo deu espaço a esta historieta..É no saloon que está a afixada numa parede a última página do jornal com o título "El hijo andaluz de Henry Fonda?". De todos os edifícios da minicidade, este é o mais autêntico, até porque tem mesmo um bar onde se pode beber uma cerveja ou um whisky. E na loja não faltam os chapéus e as pistolas de fulminantes para aqueles que sentem um apelo ao regresso à infância. Para os mais pequenos, claro, há caixas com o conjunto completo de pistola, algemas e estrela de xerife. Nesta era de jogos de computador, de PlayStation e de tablets, é divertido ver algumas crianças descobrirem o barulho dos fulminantes quando disparam a brincar. A proximidade do Carnaval garante umas vendas extra..Até agora, no Texas Hollywood não estão mais do que quatro ou cinco famílias que passeiam a fazer tempo para o primeiro show. Dois atores a cavalo reforçam o ambiente e quem quiser pode dar um passeio de carroça. De repente, as ruas enchem-se: um grupo de italianos sai de um autocarro e em vez de Espanha, ou Hollywood, mais parece estarmos a meio das filmagens de um dos tais spaghetti westerns, como os que a partir de 1966 começaram aqui a ser feitos..Os italianos caminham para o saloon. Alguém lhes disse que está prestes a iniciar-se o espetáculo do meio da manhã. Espalham-se pela sala, também pelas cadeiras no primeiro andar, que permitem ver o que se passa cá em baixo. E tudo começa com música, três bailarinas de cancan a dançar num pequeno palco e depois misturarem-se com o público. Interpretam uma mãe, a dona do saloon, e as duas filhas, mas têm todas idades próximas, pouco mais do que adolescentes..Abrem-se de rompante as portas do saloon. Um cowboy entra com uma sacola às costas e pede uma bebida. Começa um diálogo em espanhol entre o recém-chegado e a mulher atrás do bar. Ele oferece uma rodada a todos. Quem vai pagar?, pergunta ela. Como te chamas?, interroga ele, um cinquentão italiano que se desmancha a rir. Roberto, diz. Então, quem paga é o Roberto, decide o cowboy, gerando o riso geral, sobretudo entre os amigos de Roberto..Segue-se a entrada em cena de dois rufiões, supostamente irmãos, e um deles, o mais pequeno, pele tisnada, oscila entre o duro e o engraçado. Há murros, muitos murros, executados com uma coreografia que não ficaria mal em duplos profissionais. E tiros que até parecem a sério. Há quem se assuste. No final, entra em cena um xerife e no tiroteio que se segue morrem todos os homens. Aplauso para estes cowboys andaluzes. É o momento de tirar fotos com eles e Roberto tem prioridade..É quase hora de almoço. E o saloon serve-os, para grande entusiasmo dos miúdos que imaginam os hambúrgueres como a comida preferida dos cowboys. E ao início da tarde haverá novo show, agora com cavalos à mistura e certamente acrobacias sobre a sela, mas fica para outra oportunidade. A Andaluzia tem muito mais para ver, entre monumentos como o Alhambra em Granada e o Museu Picasso em Málaga, e por hoje chega de coboiadas.