"Pedir maioria absoluta foi erro, mas não tem importância porque até o PS sabe que não a terá"

António Costa Pinto afirma que o ritmo e o compasso da campanha tem seguido a sensibilidade que os partidos têm sobre a resposta do eleitorado. O politólogo diz que à esquerda os apelos ao entendimento com o PS revelam o medo de penalização nas urnas. À direita, a incógnita é se a mobilização dos eleitores é suficiente para fazer crescer este espaço político ou se uns partidos apenas vão subir à custa do PSD e do CDS.
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A dinâmica da campanha revela que líder é mais eficaz na mobilização do eleitorado? António Costa ou Rui Rio?
Da parte do PS tem sido evidente uma tentativa de mobilização do eleitorado socialista ameaçando com o espectro da direita e, por outro lado, mantendo as críticas aos partidos que derrubaram o Governo no Parlamento, sobretudo ao Bloco de Esquerda. Mas esta estratégia tem oscilado e o que marcou do ponto de vista do discurso político foi António Costa pedir a maioria absoluta.

E foi um erro pedir essa maioria absoluta?
São erros que não provocam nem descidas nem subidas significativas de votos. Pedir a maioria absoluta até acho que foi um erro, mas não tem importância porque até o PS sabe que não a terá, nem qualquer outro partido. Para alguns segmentos mais restritos de eleitorado de esquerda esse apelo não é mobilizador.

Como tem visto a evolução de Rui Rio nesta campanha?
Temos de reconhecer que, no essencial, se tem mantido muito coerente com o que seria previsível ter na sua campanha eleitoral, ou seja de mobilização sem grande polarização em relação ao PS. É inegável que o esforço de polarização em relação à direita tem sido bem maior por parte do PS do que esse esforço contra a esquerda por parte do PSD.

Mas o líder do PSD tem evoluído de um discurso muito economicista para um mais coloquial e humorista até. Isso aproxima-o mais do eleitorado do centro?
​​​​​​​Rui Rio, apesar de ser político experiente, tem cultivado uma imagem mais economicista. E o que notamos nesta fase de campanha eleitoral, que é caracterizada em Portugal por arruadas e mensagens pensadas para a comunicação social, tem adotado uma postura de mobilização mais popular do que lhe reconhecíamos.

A introdução dos animais de estimação na campanha é um recurso para essa mobilização popular?
É um fait divers. As campanhas eleitorais propriamente ditas, além da passagem de algumas mensagens que remetem sobretudo para a mobilização dos eleitorados de cada partido e também a dinâmicas de relação com a comunicação social. Depois de desencadeado esse recurso a reação em cadeia é habitual. Seja a propósito de animais domésticos, como é o caso agora, seja de outros modelos provocados por algum dos candidatos.

Os partidos mais à esquerda, PCP e BE, de repente começaram a fazer grandes apelos de entendimento com o PS, quando andavam desavindos. Nervosismo perante o crescimento da direita?
​​​​​​​Temos aqui duas interrogações. A primeira remete para a direita e é se a mobilização neste campo político cresce ou canibaliza. Ou seja, cresce no sentido em que é possível todos os partidos crescerem em relação a 2019 ou se ela se mantém globalmente no mesmo nível de votação, sendo que os partidos à direita do PSD crescem à conta de eleitorado do PSD e do CDS. A segunda remete para a esquerda e é notória a dificuldade, sobretudo do BE, em não ser penalizado pelo chumbo do Orçamento do Estado. Os apelos ao regresso aos acordos à esquerda remetem justamente para isso. Sabemos que o eleitorado de esquerda não gostou do fim da geringonça e os partidos que o provocaram têm agora o receio de perdas eleitorais.

Mas António Costa, que tinha rejeitado uma nova geringonça, já se mostra aberto ao diálogo com "todos"...
​​​​​​​Claro, pela mesma razão. Convém não esquecer que o eleitorado dos três partidos, por larga maioria, expressou uma posição favorável a estes acordos nos estudos de opinião.

E os pequenos partidos, como o Livre do Rui Tavares, beneficiaram dos debates televisivos?
No caso do Rui Tavares e do Livre, quando dizemos que os debates não alteram significativamente as atitudes eleitorais - aliás, o inquérito da RTP apontava para que só cerca de 5% poderia mudar de opinião depois dos debates -, tem uma importância muito grande nos pequenos partidos. O indicador de notoriedade e a prestação nos debates com certeza será responsável, mais do que a campanha eleitoral, pelo resultado que tiver. Com um eleitorado urbano de classe média, os debates eleitorais serão responsáveis pelo eventual crescimento do Livre.

Estes últimos dias de campanha eleitoral podem mesmo ser decisivos, tanto mais que PS e PSD estão muito próximos nas sondagens?
A campanha eleitoral é sobretudo decisiva no campo da mobilização do eleitorado e não para mudanças súbitas de atitude. Justamente por isso, à medida que os estudos de opinião apontam para uma aproximação entre o primeiro e o segundo partido os últimos dias da campanha serão obviamente de tentativa de grande mobilização de cada um dos eleitorados. Quanto mais os dois partidos se aproximam maior é a dimensão de imprevisibilidade, porque por dois por cento se ganha por dois por cento se perde. De uma maneira ou de outra, qualquer que seja o resultado eleitoral o que parece absolutamente evidente é que o Parlamento sairá mais fracionado e a estabilidade governativa mais complexa.

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