Tem sido um dos maiores êxitos televisivos em Espanha, tanto que o ator Isak Férriz diz que após estas duas temporadas não lhe falta trabalho. Este papel não era para ele, mas depois de fazer o teste com o realizador Enrique Urbizu foi logo contratado para ser um dos protagonistas da série Gigantes..A trama de Gigantes, que estreia esta semana no canal AMC, é sobre a família Guerrero, dona de um imenso negócio de droga em Espanha e Portugal, que o pai organizou e que os três filhos querem dominar. Isak Férriz é o protótipo do mafioso violento que não olha a meios para chefiar a "empresa" numa luta contra o irmão Tomás para permanecerem gigantes entre a máfia da droga..Sob a fachada de uma loja de antiguidades em Madrid, a família disputa o negócio com todos os concorrentes, sem saber que estão a ser vigiados pela polícia, enquanto pelo meio os três irmãos lutam para obter mais poder uns sobre os outros..Com a polícia a tentar desmantelar o negócio, os seus rivais em busca do fim da família Guerrero, as lutas entre irmãos vão ocupar muitos dos episódios destas duas temporadas. A segunda temporada estreia-se em maio e mantém uma espiral de violência que caracteriza muito da série, criando um ambiente de tensão constante ao longo de ambas as temporadas de Gigantes..Isak Férriz deu esta entrevista ao DN preso em casa devido à quarentena do covid-19. E quando se lhe pergunta se toda a violência que existe na série não ficou extremamente diminuída quando se vivem tempos ainda mais violentos, os de coronavírus, Férriz responde: "Tenho um bebé de 10 meses e eu e a minha mulher estamos fechados em casa. Esta quarentena acabou por se tornar um oásis pois posso estar com o meu filho, brincarmos no terraço e vê-lo a começar a andar. Mas o que se passa no mundo e o que estamos a viver é uma distopia inesperada que mostra como as ideologias liberais estão erradas, bem como a falta de investimento na saúde, agora tão necessário.".A violência da sua personagem "preparou-o" para enfrentar estes tempos de vírus? São coisas muito diferentes, é claro, porque o universo de Daniel Guerrero é também diferente daquele que quase todos nós vivemos no dia-a-dia, afinal não usamos a violência como método para conseguir o que queremos. Daniel foi educado para liderar o império da droga, numa imitação das atitudes do próprio pai, e não conheceu outra forma de vida que não a de atingir os seus objetivos. Quando no primeiro episódio é traído e preso por vários anos, só pensa em recuperar a todo o custo o negócio que lhe foi tirado pelo irmão e que considera como seu..Este argumento é ficção mas poderia ser realidade? Sim, completamente. A inspiração tem que ver com alguém que contou a sua história pessoal, tudo o que tinha visto e conhecia sobre este meio. O realizador quis fazer uma biografia de uma sociedade através dos envolvidos; os serviços policiais que usam os narcotraficantes para os seus próprios interesses e quando não lhes fazem faltam abandonam-nos. Esta é, repito, a biografia de como funciona este mundo e explica-nos muito bem como funcionam estes interesses em vários países..Então, tudo o que acontece nesta série poderia ser mesmo verdade? Sim, garanto que sim. Mesmo que agora possamos perceber que os narcotraficantes estão a tentar reinventar o negócio por causa de toda a gente estar confinada e precisarem de mudar o modelo de comércio. Esta é uma das indústrias mais fortes do mundo capitalista e globalizado e, praticamente, rivaliza com os principais pilares da economia, como a indústria farmacêutica e a do armamento. Tudo o que vemos na série, se não tiver acontecido, poderia ter existido..Esta série vai atrair os espectadores portugueses? Com certeza que irá ter também muito sucesso em Portugal, afinal somos vizinhos e o que se passa num país não é muito diferente do outro. Além disso, e sem poder revelar o que vai acontecer na segunda temporada, estivemos a filmar no Porto durante duas semanas, o que trará uma ligação ainda maior. A série trata de uma luta fratricida entre os herdeiros do império construído por Abraham Guerrero, que treinou os três filhos para lutarem pelo poder..O que acontece no Porto tem que ver com o comércio da droga na Península Ibérica? O comércio da droga está como cenário de todos os episódios, o que acontece em Portugal relaciona-se com a fuga de personagens que vão para o Porto, antes de fugirem para paraísos fiscais. Não posso dizer mais nada..Que investigação fez para compor a personagem? Não muita porque o realizador explicou muito bem o que queria de mim, das motivações da minha personagem e de como era preciso mostrar isso. Enquanto estávamos a filmar, no entanto, andei por alguns lugares que me mostravam este meio e como seriam as atitudes da família Guerrero. De qualquer modo, li livros sobre este tipo de pessoas e dos seus comportamentos, como os de Roberto Saviano, mesmo que a minha personagem fosse muito direta nos seus objetivos..Gosta de interpretar vilões? São sempre muito divertidos porque permitem expulsar muitos dos fantasmas que convivem dentro de nós e fazer coisas que na vida real é impossível. Além disso, conforme as filmagens avançavam, fui percebendo muito do humor negro que era preciso dar à personagem, para a tornar muito típica e convencer quem vê a série de como é esta realidade. Ele é um psicopata total, o que tornou muito interessante a composição de Daniel..Os verdadeiros traficantes são tão inteligentes como estas personagens? Creio que, infelizmente, são muito mais inteligentes do que deveriam. Estas personagens inspiram-se em traficantes reais como os filmes sobre gangsters faziam, como Tudo Bons Rapazes, de Martin Scorsese. Há sempre um paralelo entre o cinema e a realidade, até porque todos eles têm o mesmo destino: serem combatidos, presos ou mortos. Em poucas palavras, são filhos da puta inteligentes..Esta segunda temporada é a última? Sim, porque esta era uma série pensada apenas para oito episódios. No entanto, o sucesso foi enorme, e como os últimos episódios permitiam ser um ponto de partida para uma segunda temporada, acabou por ter duas partes de uma mesma série. Foi filmado com a certeza de que havia um final e não seria acrescentado..O que mudou entre as duas temporadas? A primeira temporada é mais uma apresentação de personagens que confluem num conjunto de tramas na segunda, resolvendo todas as pontas do argumento..Desde A Casa de Papel que estas séries fazem muito mais sucesso. Mudou a opinião em Espanha sobre o streaming? Bastante, dessa e de outras séries que ultrapassaram o mercado e saltaram para a América do Sul, por exemplo. E aumentou o número de filmagens estrangeiras em Espanha também e a nossa indústria beneficiou muito..Como vê agora o sucesso do streaming sobre as salas de cinema fechadas? Primeiro, diga-se que o streaming mudou muito. Agora temos plataformas que já não têm o monopólio dos grandes estúdios privados, que marginalizavam um certo tipo de cinema mais independente, com o objetivo de juntar toda a família em redor de um mesmo filme, sempre sem palavrões ou situações menos corretas. A nível artístico perdia-se muita criatividade, o que agora foi alterado com estas novas modalidades de streaming, mesmo que ver as salas de cinema fechadas seja triste. Falta esse culto aos filmes de cinema vistos em salas próprias. Neste momento só podemos recorrer às plataformas, mas como têm todos os filmes do universo em exibição, acabo por voltar a gostar de ver contada uma história em 120 minutos em vez da repetição de fórmulas como fazem muitas séries..Gigantes tem muitas cenas violentas. Não é um programa para toda a família assistir. Não aconselho que os mais novos vejam, porque é uma série obscura, própria para um público mais adulto..Esta é uma história de muita violência. Não há demasiada violência na televisão? Depende se se faz uma violência pornográfica, gratuita ou puro espetáculo, sim concordo. Está-se a banalizar a violência, mas em Gigantes o realizador olha para esta situação de uma forma muito honesta e o que existe de violência na série é com intenção de mostrar o mundo cruel em que as personagens se envolvem no que respeita ao negócio da droga para conseguirem atingir os seus objetivos. Neste sentido, a intenção não é mostrar violência crua como a que acontece neste ramo, mas a da luta familiar.