Paulo Núncio, secretário de Estado dos Assuntos Fiscais do governo PSD/CDS, responsabiliza a Autoridade Tributária (AT) pela não divulgação pública entre 2011 e 2015 das estatísticas sobre transferências de dez mil milhões de euros de contas nacionais para paraísos fiscais (vulgo: offshores), divulgação que tinha sido iniciada por ordem do seu antecessor do último governo de José Sócrates, Sérgio Vasques (mas que não era nem é um imperativo legal)..Segundo o DN apurou junto de fonte das Finanças, a AT propôs em 2012 a Paulo Núncio a publicação dos dados das transferências para offshores relativos a 2011. Mas o secretário de Estado escreveu apenas "Visto" no seu despacho..Ora, prossegue a mesma fonte, a AT interpretou nessa altura esse lacónico "visto" como querendo dizer que o titular dos Assuntos Fiscais "não deu instruções de publicação". A AT "interpretou que o governo não queria continuar a publicar" e "como a publicação dependia de um despacho do membro do governo, não mandou mais o pedido: nem para 2012, nem para 2013, nem para 2014"..A publicação da estatística no portal das Finanças só foi retomada em 2016, por ordem do atual secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, o socialista Fernando Rocha Andrade..Confrontado pelo DN com esta visão dos factos, Paulo Núncio deu - por escrito - uma versão oposta dos acontecimentos..Primeiro, forneceu os antecedentes: "O despacho do meu antecessor [Sérgio Vasques] determina que a DGCI (actual AT) divulgue na sua página a informação relativa a transferências financeiras para paraísos fiscais.".Depois prosseguiu que "essa divulgação não estava, assim, dependente de uma aprovação expressa a posteriori do secretário de Estado dos Assuntos Fiscais [no caso, ele próprio, Paulo Núncio]"..Concluindo: "O despacho de visto não é uma oposição à respetiva divulgação, uma vez que a AT já estava obrigada a publicar a estatística com base no despacho do meu antecessor.".O DN fez ainda outras perguntas mas Núncio reservou esclarecimentos para a próxima quarta-feira. Nesse dia, pelas 10.00, estará na comissão parlamentar de Orçamento e Finanças a responder sobre este caso e sobre o facto de, entre 2011 e 2015, no seu "turno" nos Assuntos Fiscais, terem ficado sem escrutínio fiscal dez mil milhões de euros cuja transferência para offshores foram, como era de lei, comunicados pela banca à AT. Para o mesmo dia, na mesma comissão, duas horas depois, prevê-se o início de audiência semelhante com o atual titular da secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais, Rocha Andrade..Ex-diretor-geral defende-se.A versão de Paulo Núncio entra porém em choque com o que já afirmou a dois jornais digitais (o Eco e o Jornal Económico) Azevedo Pereira, que dirigiu a AT de 2007 a 2014. "Acerca das notícias que têm vindo a ser publicadas, relativamente à falta de divulgação pública de elementos relativos a transferências para offshores e à eventual falha, por parte da AT, no tratamento da informação em causa, gostaria de afirmar que, relativamente às operações em questão, a AT efetuou, em devido tempo, quer o tratamento e o acompanhamento inspetivo que lhe competia, quer a preparação dos elementos necessários à efetiva divulgação pública dos elementos em causa.".Dito de outra forma: quanto à publicação estatística dos dados, Azevedo Pereira diz que a AT tinha tudo preparado - subentendendo-se, portanto, que a informação só não foi publicada porque o poder político não quis (no fundo, a tese da fonte das Finanças ouvida pelo DN)..Azevedo Pereira é uma das pessoas que o PSD já anunciou que quer ouvir a dar esclarecimentos na Assembleia da República.