Que tipo de receitas são as que reuniu para o novo programa? Reuni as que fui escrevendo ao longo do tempo em vários cadernos e agendas. O conceito de escrever receitas em cadernos é algo familiar a quase toda a gente. Eu própria gostava de ter um único caderno para reunir todas as receitas (risos) mas ando sempre a mil e de um lado para o outro e não consigo, daí surgiu o nome do programa Cadernos da Filipa. Nele tanto vão ver receitas que a minha mãe me deu como algumas mais recentes do tempo dos confinamentos..Teve um grande sucesso, sobretudo nas redes sociais, com os vídeos Pãodemia durante o confinamento. Foi uma forma de lidar com o isolamento? Como tem lidado com a pandemia desde então? Nos confinamentos andei um pouco contra a corrente da maioria das pessoas. Tive a sorte de trabalhar muito durante esses períodos, sobretudo porque consegui continuar a cozinhar no meu estúdio. Foi uma gestão familiar, com o meu namorado, para tomar conta das crianças enquanto se trabalhava. Mas consegui fazer muita coisa desde parcerias com marcas à partilha de receitas e dicas a título pessoal. Senti que as pessoas estavam a precisar de ideias e receitas novas, porque estiveram muito mais ligadas às redes sociais e passaram a cozinhar muito mais. Aliás, uma das coisas boas da pandemia foi o facto de muitas pessoas terem descoberto a cozinha, não só pela necessidade, mas também porque descobriram que tinham talento. Mas, claro, não existiram só coisas boas. Houve muita gente que ficou saturada de cozinhar. Uma coisa é fazê-lo para os amigos ao fim de semana, outra coisa é todos os dias. Porque não é só o prato perfeito e a foto instagramável, depois também há loiça para lavar....Sei que neste programa também vai dar sugestões. Têm a ver só com pequenos truques para usar na cozinha ou vai além disso? São muito variados. Tentei aproximar a linguagem, inclusive visual, que tenho nas redes sociais, que é mais próxima do que a da TV. Por isso tanto pode ser uma dica de como cozer certos alimentos, como dicas de plantas, de sustentabilidade ou de cozinhar com sobras..Essa questão do aproveitamento de sobras e da sustentabilidade é um tema cada vez mais recorrente nos seus programas? Sim, o novo programa é muito o reflexo do meu dia-a-dia. Acho um horror deitarmos comida fora. Os números dizem que um terço da comida que chega a nossa casa vai para o lixo ou porque se estragou ou porque não usamos ou porque sobrou e muita gente tem problemas em comer restos, o que me faz muita confusão. Ok, então se há problema em comer comida requentada embora dar uma volta ao assunto? No meu novo programa vão encontrar soluções para isso..Começou a cozinhar aos 24 anos, felizmente não foi por causa da pandemia, mas qual foi o clique para cozinhar? Basicamente foi por ter saído de casa e ter começado a viver com o meu namorado. Antes, quando vivia com os meus pais havia muita gente a cozinhar lá em casa e eu não tinha essa necessidade. Portanto, só quando tive necessidade de cozinhar é que comecei a fazê-lo. E essa fase coincidiu com o facto de não estar tão feliz com o meu trabalho na altura. Era redatora de publicidade e a cozinha foi o meu escape..A Filipa mudou muito desde o primeiro programa de televisão até agora?Sinto-me bastante igual, o que pode ser uma seca (risos). Não sei, as pessoas é que têm de dizer se sou ou não. Mas quando comecei a cozinhar trouxe alguma coisa da minha vida profissional - a exigência de criar os conteúdos. E por isso sempre fui eu a criar as receitas e cerca de 90% dos guiões dos meus programas..Citaçãocitacao"Uma das coisas boas da pandemia foi o facto de muitas pessoas terem descoberto a cozinha, não só pela necessidade, mas também porque descobriram que tinham talento.".E ter um restaurante seu? Talvez uma das perguntas mais frequentes que lhe fazem... Sim, perguntam-me tanto isso que começo a ponderar que se calhar devia abrir um... (risos). Mas sei porque nunca aconteceu. O Anthony Bourdain dizia uma coisa muito engraçada: ter um restaurante é a melhor forma de se perder muito dinheiro. Num restaurante se a parte da logística e da gestão se não estiver bem estruturada pode criar um buraco enorme. Por outro lado, estar sempre a fazer as mesmas receitas, passar 16 horas numa cozinha que muitas vezes nem janelas tem, não me atrai. Gostava sim se fosse para a criação do conceito, de criar alguns pratos, etc. Mas quem sabe, a vida dá tantas voltas....Também tem tido sucesso com os livros que publica. Este novo programa pode resultar no tal caderno único com receitas? Os meus livros têm corrido muito bem e quero continuar a fazer programas e livros e por isso, mais tarde ou mais cedo, vai acontecer..Tem alimentos que mais gosta de trabalhar do que outros? Depois do pão na pandemia anda concentrada a cozinhar algum ingrediente específico ultimamente? Não tenho tido medo de usar manteiga na cozinha. E tenho ingredientes que não vivo sem: ovos e queijo. Mas a minha cozinha é muito o reflexo da minha alimentação. Tive a sorte de ter uns pais que me deram um background de comida e sempre experimentámos muita coisa e as nossas viagens eram muito à volta de comida. Sempre experimentei muitos ingredientes diferentes. Sou muito eclética nas receitas que faço, tanto faço receitas vegetarianas como faço comida tradicional ou fusão. O meu grande objetivo é levar novas pessoas para a cozinha..Com um passado profissional como o seu, bastante criativo, como é o seu processo de criar, escrever e testar receitas? A cozinha que faço em casa é muito a que vai para os programas de televisão ou para os livros. Mas normalmente começo a criar de uma de duas maneiras. Ou existe uma necessidade específica, um tema, como por exemplo, comida para os miúdos levar na lancheira, e a partir desse problema começo a anotar ideias nos meus cadernos; ou então são coisas que vou provando, quer em restaurantes ou feito por amigos. Também podem ser ingredientes, que de repente me fazem clique na cabeça, ou inverter coisas tradicionais, como umas farófias em salgado. É um pouco montar e desmontar as ideias..Cadernos da Filipa Canal: 24 Kitchen Estreia esta segunda, 20 de setembro Emissões: De segunda a sexta feira, às 15h e às 21h00.filipe.gil@dn.pt