Pela primeira vez, Portugal organiza um Campeonato do Mundo de Programação Informática, que vai na sua 43.ª edição, o que permite a estreia nacional com uma equipa de três estudantes portugueses, todos da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. Até sexta-feira, dia 5, cerca de 500 estudantes de todo o mundo vão procurar o título da International Collegiate Programming Contest (ICPC), que decorre na Alfândega do Porto. Por lá passam também representantes das principais empresas mundiais à caça de talentos. Muitos dos anteriores campeões e participantes estão hoje ao serviço da Google, da Amazon, da Microsoft e de muitas outras gigantes com ligação à informática.."Na competição vamos tentar a melhor classificação possível. A nível de futuro emprego isto é excelente para o currículo e para a experiência. Nas entrevistas de emprego da Google ou da Microsoft, o tipo de problemas que vamos ter de resolver na prova é também o que é colocado aos candidatos ao lugar. Se já estás habituado a eles, ficas mais bem preparado para uma entrevista", explicou ao DN Gonçalo Paredes, aluno de 20 anos do 3.º ano de Ciências de Computadores. Os outros dois elementos da equipa portuguesa são Ricardo Pereira, do mesmo curso, e Alberto Pacheco, de Matemática, todos já habituais participantes em concursos do género, onde aliás se conheceram..Como explica Gonçalo, a resolução de problemas é a parte competitiva do evento. "Temos cinco horas para resolver um conjunto de 11 a 13 problemas. Estes abrangem um vasto leque da área da programação informática. Pode ser, por exemplo, arranjar ou inventar um algoritmo que dê resposta ao problema colocado. No fundo, é ver o que conseguimos resolver num tempo rápido, só com um computador. Por norma, um dos elementos fica ao computador e os outros dois estão já a estudar outros problemas colocados", diz o estudante. A equipa nacional é convidada por o evento decorrer em Portugal. Na final regional do sudoeste europeu, em Paris, ficou em 12.º lugar. Só os quatro primeiros tinham apuramento direto. Portugal já organizou cinco finais da região europeia e por duas vezes ficou a um lugar desta final mundial..O desafio é grande. "São sempre problemas difíceis, e normalmente as equipas não conseguem resolvê-los a todos. Os russos são muito fortes nesta área. Têm muitos campeões que depois treinam outros estudantes. Fazem muitos estágios e é muito difícil igualá-los", conta Gonçalo Paredes. Da Rússia chegam dez equipas a esta final. Os norte-americanos têm igualmente forte tradição, com escolas como o MIT ou Harvard a participar..Talentos que determinam o futuro.Fernando Silva, vice-reitor da UP, é o diretor do evento e realça que muitos dos estudantes que vão competir "são talentos na área da programação que irão determinar o nosso futuro: muitos vão estar nas grandes empresas. Muitos dos campeões ou participantes do passado estão hoje no Facebook, na Google, na IBM e outras". Empresas nacionais como a Farfetch e a Euronext estão também associadas ao campeonato, que funciona como uma montra dos melhores estudantes da área..Os algoritmos dominam hoje a programação, seja a nível da ciência de dados, da inteligência artificial ou da cibersegurança. "São áreas determinantes, com grande impacto social que chegam a áreas como a saúde ou a banca", diz o professor Fernando Silva, satisfeito por ter conseguido trazer para o Porto este campeonato que engloba muitas palestras e um programa paralelo criado pela Câmara Municipal do Porto, que apoia o evento. A prova mundial disputa-se no dia 4, às 12.00, com streaming na íntegra. Em paralelo decorrem um torneio de programação para alunos do ensino secundário e o Hack a City, promovido pela Associação Porto Digital da Câmara Municipal do Porto, em que cientistas de dados e estudantes vão explorar os dados disponibilizados pela cidade para melhorar a qualidade de vida..Realizar a prova mundial no Porto é importante para a universidade e para as empresas. "Muitas empresas do setor têm procurado o Porto para se instalarem e queremos atrair mais talentos para que elas possam recrutar mais", refere Fernando Silva, que, a nível de formação, vê a prova e a participação da equipa portuguesa como "uma semente que crie motivação e interesse em mais estudantes", já que é "uma mais-valia de competências profissionais"..Apostar mais nos estágios.Reconhece que é necessário uma preparação mais profissional das equipas, como fazem outros países. Neste ano, os três elementos portugueses foram a Barcelona participar num campo de treino. "Foram duas semanas de estágio com um professor russo de São Petersburgo que já formou sete equipas campeãs. Foi bom, aprendemos muito", realça Gonçalo Paredes. O vice-reitor da UP aponta que esta "é uma prática habitual entre russos, chineses e mesmo brasileiros". Convidam "muitos ex-campeões para darem formação e fazem esses campos pelo menos duas vezes por ano". O que faz toda a diferença no momento da competição..Gonçalo Paredes e os dois colegas pretendem seguir profissionalmente a área da informática. Sem pressas. Os licenciados nos diversos cursos (de Engenharia Informática a Ciências de Computadores, entre outros) têm empregabilidade garantida, com a possibilidade de chegar às grandes empresas a ficar reservada aos melhores. "Ainda estamos na universidade mas claro que é o objetivo. Eu e o Ricardo estamos na área da informática, o Alberto vem da Matemática, e o futuro deve passar pela programação. Mas há muitas opções ainda em aberto, muito por escolher.".O curso de Ciências de Computadores, direcionado para a programação, é um dos vários de ensino superior na área de informática. Se há cursos com médias já muito altas, como o de Engenharia Informática e Computação (Faculdade de Engenharia do Porto), com a média de entrada a ser 18,1, nas Ciências de Computadores do Porto a média foi 14,2. Na Matemática, da Faculdade de Ciências do Porto, a média foi 15,9..Este campeonato no Porto é também para a cidade e a região. Fernando Silva diz que esta organização foi "muito pesada e deu um trabalho muito grande" à universidade. Mas compensa a nível de experiência para os estudantes mas também de projeção da universidade e a nível económico. "O impacto na região será superior a dois milhões de euros, por via da hotelaria, da restauração e do comércio", aponta o responsável..O ICPC é uma fundação sem fins lucrativos que nasceu nos EUA, onde se realizaram as primeiras 20 edições. Nos últimos anos diversificou-se em termos geográficos, com os últimos mundiais a realizarem-se em países como a Rússia, a China ou a Polónia. Agora é a vez de Portugal, onde chegam os melhores dos mais de 50 mil estudantes de informática, de mais de três mil universidades de 111 países que participaram nas 400 eliminatórias. O evento tem como patrocinadores principais a chinesa Huawei e a JetBrains, fundada em Praga por russos. Um sinal dos tempos, pois durante anos a IBM foi a principal patrocinadora.