O aeroporto e a "irresponsabilidade política"
Quando a lei não dá jeito, altera-se a lei. Tem sido esta a máxima do Partido Socialista. Resumidamente, é assim que se pode descrever o comportamento do governo ao longo das últimas semanas relativamente à questão do projeto do aeroporto do Montijo. É uma estratégia recorrente e que, por isso, nem é nova nem surpreendente. Já havia sido esta a estratégia na questão das parcerias público-privadas (PPP), assim como na recente discórdia com o Tribunal de Contas. Na questão das PPP, o Parlamento brevemente terá oportunidade de corrigir a situação através da apreciação parlamentar agendada para março. Quanto ao Tribunal de Contas, as alterações que o PS queria introduzir acabaram por ser chumbadas na discussão do Orçamento do Estado para 2020.
Prepara-se agora para ser mais uma vez esse o procedimento na questão do Montijo. Criar leis à medida: se a lei não permite, é porque a lei está mal. E se a lei está mal, deve ser alterada, e quem se recusar a fazê-lo é "politicamente irresponsável." Não é assim que funciona um Estado de direito democrático. Ao contrário do recreio da escola, não basta dizer que "a bola é minha" para alterarmos as regras do jogo.
As responsabilidades desta incompetência, literalmente, são do governo. Durante os últimos cinco anos, tinha a responsabilidade de negociar e construir consensos com os municípios envolvidos. Afinal, a existência deste decreto-lei, que confere aos municípios onde são construídas infraestruturas o poder de veto sobre a sua construção, era conhecido. Assim como o posicionamento dos autarcas da Moita e do Seixal. Ou seja, não houve truques nem surpresas. O governo tinha o dever de se preparar para esta situação e negociar com as autarquias. Mas não o fez. Já não o tinha feito quando decidiu assinar um memorando de entendimento com a concessionária francesa Vinci antes de ser feito o estudo de impacto ambiental do mesmo.
É até desconcertante a forma com que o Partido Socialista afirma que quer alterar a lei. Sem apresentar qualquer argumento minimamente razoável, reitera apenas a importância do aeroporto. Sem qualquer problema, propõe a alteração de uma lei, de forma a retirar competências ao poder local e contornar a lei atual. Numa situação que podia ter sido evitada pelo próprio governo. Julgava que existia um certo pudor em propor mudanças das regras de um jogo que anda a jogar-se há cinco anos e que previa esta situação específica. Pelos vistos, estava enganada.
Na escola primária, quem for o dono da bola e a trouxer para o recreio sente-se todo-poderoso. Ganha o direito de escolher a própria equipa, decidir quantos e quem joga, quem não joga, anunciar o fim do jogo e ainda fazer de árbitro. Felizmente, nunca foi assim no seio das instituições de um Estado de direito.
Presidente da JSD