Porque "gostávamos mesmo de eleições" e porque o governo está "esgotado" e "transformado numa verdadeira direção de campanha do PS", o CDS fará hoje à tarde discutir na Assembleia da República uma moção de censura ao executivo - a segunda que apresenta nesta legislatura (a primeira foi em outubro de 2017)..Já se sabe qual será o resultado da votação: o governo sobreviverá, pela conjugação dos votos contra a moção de PS, BE, PCP e PEV. Só os proponentes e o PSD votarão a favor. A moção será chumbada - e na verdade tem sido quase sempre assim desde que a Assembleia da República começou a funcionar nos termos em que hoje a conhecemos (1976). O DN foi ver a história das moções de censura em Portugal..O que é uma moção de censura?.É uma iniciativa de qualquer grupo parlamentar - ou de um quarto dos deputados (58) - que visa provocar a demissão do governo. Se for aprovada, essa é a consequência obrigatória. O Presidente da República tem então duas alternativas: ou convoca eleições antecipadas ou propõe à AR um outro governo. No Parlamento, um governo pode ainda ser demitido de outra forma: pelo chumbo de uma moção de confiança que apresente..Quantas moções de censura já foram apresentadas?.Trinta. Ou 31, se contarmos com a que hoje será discutida e votada. Mas só 25 foram discutidas (duas não foram discutidas porque o governo se demitiu; duas foram retiradas; uma não foi aceite porque não havia tempo para a discutir). A primeira moção de censura que foi a votos foi do PS, a um governo da AD (Aliança Democrática) liderado por Pinto Balsemão, em 27 de fevereiro de 1982. PSD, CDS e PPM, com maioria no hemiciclo, chumbaram a iniciativa. A favor votaram os proponentes, além de PCP, UEDS, MDP e ASDI..Qual é o partido recordista das moções?.O PCP: já apresentou dez, em praticamente todas as legislaturas, contra governos liderados pelo PSD ou pelo PS. Na atual legislatura os comunistas têm estado sossegados, comprometidos que estão com os acordos da geringonça. O CDS é o segundo partido mais censurador: sete moções, contando com a que hoje será discutida e votada. Os alvos do CDS ao longo da história foram, geralmente, governos do PS mas também, numa vez, contra o PSD (em outubro de 1994, no terceiro e último governo de Cavaco Silva)..E nos outros, como tem sido?.A restante contabilidade parlamentar revela que o PS já apresentou cinco moções de censura, o Bloco de Esquerda outras tantas (contra governos do PS e PSD/CDS), o PEV duas (ambas contra governos PSD/CDS) e o PSD apenas uma (contra António Guterres, em 30 de junho de 2000). O (já extinto) PRD, partido criado em 1985 a partir de Belém por Ramalho Eanes, também só apresentou uma - mas foi de longe a mais consequente (já veremos porquê)..Qual foi o primeiro-ministro que mais moções enfrentou?.O primeiro-ministro mais duradouro da democracia portuguesa foi Aníbal Cavaco Silva (dez anos, de 1985 a 1995). Seria então natural que tivesse sido ele a maior "vítima" de moções de censura. Mas não foi. Enfrentou apenas três - embora uma delas com grandes consequências (já veremos porquê...). Guterres (primeiro-ministro de 1995 a 2002) enfrentou o mesmo número e Durão Barroso (2002-2004) quatro - Mário Soares apenas uma (apresentada pelo CDS, em dezembro de 1984)..Assim, os recordistas como alvos de moções de censura foram José Sócrates (PM de 2005 a 2011) e Pedro Passos Coelho (2011-2015). Cada um teve de enfrentar seis moções de censura. As de Sócrates vieram de BE, PCP e CDS (duas cada um). As que ocorreram no seu primeiro governo (2005-2009) foram facilmente derrotadas porque o PS tinha maioria absoluta. No segundo governo, Sócrates já só tinha maioria relativa. O PCP apresentou-lhe uma moção de censura (maio de 2010) e o BE outra (março de 2011) e a ambas o agora principal arguido da Operação Marquês sobreviveu graças às abstenções do PSD e do CDS..Pedro Passos Coelho foi também ele alvo de seis moções de censura nos seus quatro anos de primeiro-ministro (2011-2015) - três do PCP, uma do PEV, uma do BE e outra do PS. A todas sobreviveu facilmente porque governava assente numa coligação maioritária com o CDS..Alguma vez uma moção derrubou um governo?.Sim, uma única, das 30 (31, com a do CDS, hoje) que já foram apresentadas. Estávamos em abril de 1987. Cavaco Silva liderava o seu primeiro governo, sem maioria absoluta. Quem a apresentou foi o PRD (Partido Renovador Democrático, eanista, já extinto), com um pretexto que hoje, visto à distância, parece irrelevante: uma delegação de deputados visitara a URSS e, a convite dos soviéticos, a Estónia. E o governo nunca havia reconhecido a anexação da Estónia por Moscovo. Gerou-se um conflito entre a AR e o governo, que levou o PRD a apresentar a moção de censura..O problema, porém, foi o PS. Os socialistas, liderados por Vítor Constâncio, estavam convencidos de que o Presidente da República, Mário Soares (eleito há pouco mais de um ano), os convidaria a formar governo na sequência da queda do executivo de Cavaco Silva. Só que Soares - deixando o "seu" PS em estado de choque - não seguiu esse caminho: aprovada a moção de censura (votos a favor da esquerda e contra do PSD e do CDS), Soares, em vez de nomear outro primeiro-ministro (Constâncio), decidiu convocar eleições legislativas. E nessas eleições Cavaco Silva obteve para o PSD a primeira maioria absoluta monopartidária desde o 25 de Abril..Dito de outra forma: Cavaco Silva tornou-se o principal vencedor da moção censura que o derrubara na AR. Governou até 1995 e depois foi Presidente da República de 2006 a 2016. Das seis vezes que foi a votos, Cavaco venceu quatro com maioria absoluta (duas eleições legislativas e duas presidenciais), uma eleição legislativa com maioria relativa, em 1985. Só perdeu nas presidenciais de 1996, para Jorge Sampaio, logo à primeira volta.