O Ministério Público (MP) esclareceu esta quinta-feira que o presidente da câmara não deve "reencaminhar cópias do aviso prévio" de manifestações ou de transcrever informações "indispensáveis à colaboração dos promotores", cinco meses depois do caso dos ativistas russos em Lisboa..O MP responde assim a um parecer pedido pela ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública, Alexandra Leitão, sobre a atuação de presidentes de câmara "ao receberem avisos prévios de reuniões, comícios, manifestações ou desfiles em lugares públicos ou abertos ao público, da parte dos seus promotores".."Uma vez que o tratamento de dados pessoais deve ser reduzido ao mínimo necessário, o responsável deve abster-se de reencaminhar cópias do aviso prévio ou de transcrever, integralmente, o seu teor, antes divulgando em despacho a proferir com as devidas ordens, instruções e diretrizes os dados indispensáveis à colaboração dos promotores e com os promotores", informou esta quinta-feira o MP, num documento com 123 páginas e 50 alíneas..Publicado em Diário da República, o documento reforça que os presidentes de câmara, após receberem o aviso prévio, devem "recensear criteriosamente os serviços, entidades e agentes municipais".."Além da hora, local e objeto de reunião ou comício, e do trajeto, tratando-se de manifestação, cortejo ou desfile, dará indicação do nome e contacto dos promotores signatários, especificando, em relação a cada transmissão de dados a finalidade ínsita, próprias das competências de cada um", é adiantado..O MP lembra que a identificação dos promotores "conota-os [...] com opções políticas, filiação sindical ou convicções religiosas e metafísicas, motivo por que implicam com dados especialmente sensíveis e sob uma acrescida proteção contra operações ilícitas, desleais ou diáfanas de tratamento de dados"..O documento realça que o aviso representa uma comunicação prévia e que o presidente da câmara não tem de decidir sobre a realização ou não de uma manifestação..O aviso prévio "não obriga o destinatário a proferir uma decisão, nem faz presumir do silêncio deste um ato de anuência ou de deferimento tácito".."O presidente da câmara municipal não pode limitar-se a replicar o aviso prévio de manifestação ou reunião, recebido em conformidade com o n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 406/74, de 29 de agosto", lê-se no parecer..De acordo com o MP, o "expediente não permite conceder ordens e instruções aos serviços municipais sob a sua direção (v.g. polícia municipal) e diretrizes aos demais sob a sua coordenação [...], nomeadamente, o serviço de bombeiros, os departamentos de tráfego, de higiene e limpeza da via pública, de iluminação pública ou o serviço municipal de proteção civil, com vista ao ordenamento do trânsito, ao aprestamento de meios logísticos necessários à organização, ao desafogo dos lugares e à mobilização de meios de evacuação e socorro"..No documento é recordado ainda que é da competência do presidente da câmara municipal passar um comprovativo de receção do aviso prévio para determinar ou não a realização de manifestações ou de outros eventos..No início do mês de junho foi tornado público que o município de Lisboa fez chegar às autoridades russas os nomes, moradas e contactos de três ativistas russos que organizaram em janeiro um protesto, em frente à embaixada russa em Lisboa, pela libertação de Alexei Navalny, opositor do Governo russo..Quando o caso foi noticiado, o então presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Fernando Medina (PS), pediu "desculpas públicas" pela partilha desses dados, assumindo que foi "um erro lamentável que não podia ter acontecido"..A Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) identificou 225 contraordenações nas comunicações feitas pela Câmara de Lisboa no âmbito de manifestações, ficando a autarquia sujeita a coimas, por cada uma, até 10 a 20 milhões de euros, segundo o projeto de deliberação conhecido no início de julho..Até ao momento, a CNPD ainda não divulgou a sua deliberação final.