Morte no Alfa Pendular em acidente injustificável

Máquina de reparações na linha. O comboio da Linha do Norte choca com equipa de reparações e mata dois funcionários. Entre os 200 passageiros, só feridos.
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Uma máquina de trabalhos da Infraestruturas de Portugal terá sido a causa do descarrilamento de um comboio Alfa Pendular na Linha do Norte que provocou dois mortos, seis feridos em estado grave e 19 menos graves. A confirmação desta causa, a primeira apontada, conhecer-se-á quando o inquérito oficial for concluído. Para já fica a certeza de que o condutor do Alfa Pendular não conseguiu interromper a marcha a alta velocidade do comboio e colidiu com o vagão de reparações que estava à frente. Não evitando assim o primeiro acidente desta gravidade com um comboio na rede ferroviária portuguesa desde 2018. Isto num país onde os acidentes graves com comboios são raros sendo o que aconteceu em Alcafache, a 11 de setembro de 1985, o mais grave: 150 mortos.

Ontem, segundo um dos passageiros, tudo começou com "um grande estrondo". A partir desse instante, foi uma sucessão de acontecimentos em poucos segundos. Após o barulho provocado pelo choque, houve quem avisasse para os passageiros se deitarem no chão e se protegerem, enquanto o barulho do comboio a travar, a descarrilar e a empurrar a pequena composição de reparações se misturava com a poeira que as carruagens do Alfa levantavam no ar. Tentar sair a todo o custo foi o que fez quem pôde logo que o comboio se imobilizou, sendo que o espaço entre o comboio e a vedação era apertado e dificultava a fuga do local do acidente.

De acordo com o responsável do INEM, as duas vítimas mortais eram os únicos ocupantes da máquina de reparações. Dos 212 passageiros do Alfa Pendular, nenhum dos seis feridos graves corria ontem risco de vida. O Alfa Pendular seguia no sentido sul-norte, tendo saído de Santa Apolónia, em Lisboa, às 14.00, e tinha como destino final Braga.

As duas centenas de passageiros do comboio Alfa Pendular foram acolhidos no pavilhão multiusos de Soure, onde estiveram a ser acompanhados pelo INEM e por mais de duas dezenas de voluntários médicos e enfermeiros. Segundo fonte do gabinete da presidência da Câmara de Soure, os médicos e enfermeiros, que se deslocaram voluntariamente para o local, "estavam a receber as pessoas, a maioria sem ferimentos, mas também alguns feridos muito ligeiros". Os passageiros que estavam no pavilhão multiusos seriam ainda ontem transportados de autocarro para a estação ferroviária de Alfarelos, localizada a cerca de 15 quilómetros de Soure, para seguirem viagem, de comboio, para os seus destinos.

Acidente "inexplicável e criminoso"

O Presidente da República lamentou o acidente pouco depois de se saber do acontecido em Soure. Marcelo Rebelo de Sousa enviou "o pesar e a solidariedade aos familiares das vítimas mortais, depois a solidariedade aos feridos graves - aos feridos todos eles, mas aos graves -, felizmente em pequeno número, para o número de passageiros que estava a circular no Alfa".

O Chefe de Estado estava no Algarve reunido com empresários e foi informado pelo ministro da tutela, Pedro Nuno Santos. O Presidente referiu que o ministro "se deslocou ao sítio do acidente e empenhou-se no apuramento rápido das causas do sucedido". Agradeceu ao autarca de Soure pelo apoio e anunciou que hoje pretende "visitar ou, pelo menos, inteirar-me do estado de saúde dos feridos mais graves que foram hospitalizados, depois do funeral do bombeiro em Cuba".

Sobre as causas do acidente, Marcelo Rebelo de Sousa não se pronunciou: "Não queria estar obviamente a comentar aquilo que deve ser objeto de um inquérito, de uma indagação, que embora rápida, seja conclusiva e permita determinar a causa deste acidente grave."

O especialista em Transportes e Vias de Comunicação Luís Cabral da Silva, em declarações à agência Lusa, considerou que o acidente com o comboio foi "criminosamente grave" e "inexplicável". Para este especialista, "não se percebe como é que um comboio Alfa Pendular vá bater numa dresina [máquina] que está a fazer a manutenção da linha onde o comboio vai passar. Isto é um exemplo da irresponsabilidade completa".

No entender de Luís Cabral da Silva existem "várias questões técnicas que falharam e que motivaram este acidente. Em rigor, o comboio não deveria lá chegar por causa do controlo de velocidade. Pelos vistos chegou e bateu. Não se programa a viagem de um comboio pendular por uma linha que está em trabalhos de manutenção". Questionou ainda o facto de o sinal da linha não estar fechado e de não ter existido "qualquer comunicação" sobre a presença da máquina.

Para o ministro Pedro Nuno Santos, "a ferrovia é um dos meios de transporte mais seguros, mas infelizmente acontecem acidentes". Acrescentou: "Temos de aprender com o que aconteceu para diminuir mais os riscos de acidentes na ferrovia". O governo quer perceber "o que aconteceu de errado, o que poderia ter sido feito, para serem tiradas todas as ilações".

Com Lusa

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